Sociedade e cultura na obra Mãe Preta (1912), de Lucílio de Albuquerque

Sarah Dume

DUME, Sarah. Sociedade e cultura na obra Mãe Preta (1912), de Lucílio de Albuquerque. 19&20, Rio de Janeiro, v. XIII, n. 2, jul.-dez. 2018. https://doi.org/10.52913/19e20.xiii2.07

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1.      Considerando o crescimento do uso da imagem como documento e evidência para a pesquisa histórica, analisamos neste trabalho a obra Mãe Preta (1912) [Figura 1], de Lucílio de Albuquerque, exibida pela primeira vez no Salão de Belas Artes de 1912 no Rio de Janeiro. Desenvolvemos, assim, uma pesquisa voltada ao uso da imagem não somente a partir de seu aspecto estético, mas, também como “evidência histórica,”[1] demonstrando como o campo imagético atrela-se e contribui cada vez mais com os estudos históricos. O objetivo desde estudo é construir uma análise a partir das evidências cedidas pelo objeto que levam ao cenário de produção da obra e possíveis motivações das representações ali contidas, tais como foram concebidas e apresentadas pelo autor. Foram privilegiados os aspectos socioculturais captados no estudo da imagem, através dos dados iconográficos e iconológicos identificados no quadro.

2.      Pautado nos conceitos de iconografia e iconologia definidos por Erwin Panofsky, foi possível conjecturar sobre as evidências e indícios manifestados nos temas secundários e convencionais da obra.[2]  A partir dos motivos reconhecidos na análise iconográfica de Mãe Preta foi iniciado um estudo iconológico, na busca de um aprofundamento acerca dos significados sociais e culturais da obra.[3]

3.      Foram efetuadas análises de críticas e percepções da sociedade da época sobre a obra, resultando em indagações que procuraram ser discutidas através do diálogo entre os diversos autores que compõem a bibliografia de apoio e referência. Essas indagações resultaram na observação de diversas marcas da sociedade e da cultura da época nos traços e características da imagem construída por Albuquerque, viabilizando um diálogo com outras produções do período, que trazem como protagonista o negro.

4.      Essa análise permitiu observar a singularidade do quadro Mãe Preta em comparação aos outros trabalhos do autor até 1912, os quais em sua maioria tinham inspiração impressionista[4] e simbolista,[5] movimentos com os quais os artistas estudantes brasileiros interagiam nas academias parisienses - incluindo Lucílio, que fez parte deste círculo.

5.      No que concerne ao contexto histórico em que o autor e sua obra estavam incorporados, foi possível entender melhor a visão da sociedade brasileira sobre o negro e a situação racial no Brasil naquele momento. Destacou-se nesse contexto, o período de transição do século XIX para o XX - período de produção da obra -, quando diversas mudanças na sociedade brasileira emergiam em meio às primeiras décadas após a abolição da escravidão no Brasil, em especial na região Sudeste do país. É um momento em que o contingente total de negros escravizados se tornara livre, exigindo para si um novo lugar de representação social e cultural no Brasil.

6.      Portanto, a partir da pintura, pode-se inferir caminhos percorridos pela mentalidade da sociedade brasileira no que se refere aos discursos raciais, demonstrando ser uma preocupação em vários âmbitos da sociedade - sobretudo entre os chamados homens de ciência -, a fim de definir qual lugar deveriam ocupar os negros naquele momento. As teorias raciais lançavam uma perspectiva acerca dessa população marginalizada, mostrando que a sociedade brasileira não conseguira conciliar a liberdade do negro com seus ideais de progresso, o qual, segundo estas teorias, só seria alcançado por meio de uma hegemonia racial pré-definida pelas elites.

7.      A cena visível no quadro de Lucílio de Albuquerque coloca, porém, dúvidas em relação à ação ali efetuada: representaria uma escrava durante os anos da escravidão ou uma mulher livre no pós-abolição, vivendo ainda à margem da sociedade e exercendo a função de ama de leite?

A imagem artística como evidência histórica

8.      Sendo a imagem a principal ferramenta utilizada nos meios comunicativos do século XXI, como Martine Joly expressa em seu livro Introdução à análise da imagem, podemos dizer que, num mundo capitalizado, este é o principal meio de comunicação para o acelerado sistema de vida atual, o que nos torna “consumidores de imagem.”[6] A grande ocorrência das imagens no cotidiano leva a uma necessidade de maior intimidade com estas, de forma que a sociedade e o indivíduo saibam se relacionar com o objeto imagético que tem à sua frente. Joly destaca as observações de Ernest Gombrich, historiador e teórico da arte, sobre a imagem:

9.                                    [a imagem] pode ser também um instrumento de conhecimento porque serve para ver o próprio mundo e interpretá-lo. Para Gombrich, uma imagem (seja um mapa geográfico ou um quadro) não é uma reprodução da realidade, mas sim o resultado de um longo processo, no decurso do qual foram sucessivamente utilizadas representações esquemáticas e correções. Quem quer que alguma vez tenha fabricado uma imagem sabe-o bem, mesmo quando o que está em causa é tirar a mais vulgar das fotografias. Fazer uma imagem é antes de mais olhar, escolher, aprender. Não se trata da reprodução de uma experiência visual, mas da reconstrução de uma estrutura modelo, a qual tomará a forma de representação melhor adaptada aos objetivos que tivermos fixado (mapa geográfico, diagrama ou pintura realista, impressionista, etc.).[7]

10.    Joly considera a imagem uma “mensagem visual,” cujo processo de análise deve levar em consideração as diferentes possibilidades de mensagens, expectativas e contextos presentes. Dessa forma, a análise passa a exercer propriamente sua função de estabelecer o contexto a qual essa imagem está estabelecida, podendo diferenciar os diversos componentes desse objeto, expressando e comunicando as observações analíticas resultantes dessa ação.[8]

11.    Se faz necessário e natural, no meio acadêmico, desenvolver uma perspectiva teórica que incite à análise das imagens, onde estas corroborem para uma melhor compreensão da história, ultrapassando a camada de informação considerada “natural” pelo observador, aprofundando-se no que esta fonte imagética pode conceder.

12.    Artur Freitas argumenta a favor da análise de uma obra a partir dos vários aspectos que correspondem ao seu resultado final. O autor assim denomina esses aspectos: o formal, o semântico e o social. Nessa perspectiva, essas três diferentes áreas, apesar de enfatizadas diferenciadamente a cada interpretação de uma obra específica, não podem ser analisadas separadamente, pois, mantém uma relação de interdependência. A abordagem formal consiste na compreensão material de um objeto que foi construído no tempo, enquanto a abordagem social prolonga este teto ao descrever os caminhos que esse objeto percorreu até o presente. Freitas esclarece a ligação entre tais abordagens, demonstrando que, apesar de contribuírem de formas diferentes para a análise de uma obra, juntas corroboram para uma interpretação que vai além dos aspectos semântico e social, os quais são comumente isolados e utilizados nas interpretações sobre as obras de arte.[9]

13.    Cada processo de análise de uma imagem artística é singular e possui uma situação determinada: o olhar de um observador pode ser composto de diferentes cargas socioculturais, que corroboram para diferentes conclusões. Sendo assim, em um processo de análise, uma dimensão pode ser mais determinante que a outra, como ocorre no presente estudo da obra Mãe Preta, onde os aspectos sociais e culturais da produção destacam-se na representação da ama de leite negra com seu “filho negro” e seu “filho branco,” em detrimento dos aspectos formais.

14.    Artur Freitas enfatiza a importância do circuito de relações formados na “vida social” de uma obra: o meio artístico no qual ela estivera inserida, as instituições às quais pertencera, as avaliações que foram realizadas sobre ela, quem as efetuou etc., são pontos altos do processo de análise de uma imagem, principalmente no tocante às questões sociais. Esse aspecto é destacado no presente estudo, pois ele é imprescindível para uma melhor compreensão do meio artístico no qual Lucílio de Albuquerque expôs Mãe Preta.

15.    A construção deste processo de análise é carregada de uma complexidade que o historiador deve encarar como desafio diante de uma determinada fonte imagética. Por seu turno, tal ação é realizada muitas vezes com o intuito de esclarecer a perspectiva do autor e delinear o caminho que possa tê-lo levado até o resultado de seu trabalho. Ao mesmo tempo, essa tentativa reincidente pode comumente levar o espectador a uma interpretação errônea da imagem, uma vez que a obra pode ser carregada de intenções, perpassando por vários sentidos - romântico, satírico, entre outros - da cena representada na obra. Para Michael Baxandall,[10],  o processo de análise imagética exige cautela pois nos deparamos com a impossibilidade de realizar a reconstrução do estado de espírito do autor no momento de sua produção. O autor atribui essa dificuldade aos limites da linguagem escrita/falada diante do discurso imagético. Por isso, deve-se atentar para a relação do objeto analisado com a conjuntura na qual este foi efetuado e não somente se ater às intenções do artista quando o produzia. Segundo Baxandall, é necessário levar em consideração a existência de uma distância suscitada por inúmeras situações, entre a obra de arte e o estudioso, que pode ser insuperável por conta da variedade de perspectivas acerca da análise de uma produção imagética. O artista, antes de produtor da obra, é um ser social que possui uma base sociocultural pela qual seus métodos produtivos podem estar influenciados, corroborando para que cada objeto seu - suas obras - seja cercado de ideologias, sentimentos e crenças advindos do meio em que estava inserido. Dessa forma, a pesquisa voltada para o aspecto sociocultural de uma obra significa que esta será avaliada a partir do contexto no qual esse objeto foi construído.

16.    Enfim, baseando-se nas perspectivas de Burke (2004), Baxandall (2006) e Joly (2006), buscou-se investigar os diferentes conteúdos e significados de Mãe Preta. A influência da formação de Lucílio de Albuquerque sobre a produção do quadro, as ideias e críticas da época sobre o autor e sua obra e a recepção ao tema retratado pelo pintor são aspectos que dirigiram nossas análises da imagem, permitindo construir um caminho interpretativo para construir uma análise a respeito dessa fonte imagética. 

O conceito de representação 

17.    Como demonstrando por Dominique Vieira dos Santos em seu estudo Acerca do conceito de representação (2011), o conceito de representação é comumente referenciado no campo historiográfico. Há um amplo leque de trabalhos acadêmicos que trazem em seus títulos e capítulos a palavra “representação,” porém sem uma explanação que realmente defina o uso desse conceito e o que realmente ele possa significar. Por conta do carácter polissêmico, segundo Santos, é ainda mais complexo entender o que realmente vem a significar o conceito de representação.[11]

18.    Para Marina Helena Capelato e Eliana Regina de Freitas Dutra, a historiografia brasileira sofreu uma mudança a partir da introdução do conceito de representação no campo dos estudos historiográficos entre os 1980 e 1990.[12] Inicialmente, o conceito foi alvo de críticas por seu carácter “idealista,” o qual, segundo uma linha de estudiosos, poderia ignorar muitos outros âmbitos da história e poderia ser objeto de manipulação e ilusão.

19.    Assim, partindo de uma reflexão sobre o papel desse conceito na história, pode-se perceber que a representação comumente está relacionada à história cultural e sua expansão. Segundo Roger Chartier,[13] o conceito de representação é um apoio para visualizar e articular a noção de mentalidade e as relações do mundo social que nos são dadas através de evidências históricas. Portanto, o conceito de representação não se distancia do real e nem do social, como argumentado por linhas de estudos que não viam uma concepção realista da história nas representações.[14]

20.    Dessa forma, entender o tempo da história é necessário e só se faz possível através da análise dos signos que constituem as representações. Essa temporalidade histórica é constituída de mentalidades e relações sociais de diferentes significados e, através da escrita da história, transformados em representações pelo historiador que manuseia o fato histórico. Nesse sentido, esse trabalho pretende demonstrar, através do estudo da representação de Mãe Preta de Lucilio de Albuquerque, as relações intrínsecas entre autor, obra e contexto. 

Lucílio de Albuquerque e a singularidade da obra Mãe Preta 

21.    Lucílio de Albuquerque [Figura 2] nasceu em Barras, no Piauí, em 1877. Mudou-se para São Paulo para iniciar seus estudos em Direito, porém, os deixou no primeiro ano e ingressou na Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro (ENBA) em 1896. Albuquerque iniciou o curso na Escola como aluno livre, matriculando-se em 1901. Em seus primeiros anos na instituição, foi vencedor de medalhas de prata e ouro em 1903 e 1904, respectivamente.

22.    Seu percurso artístico dentro da Escola seguiu marcado por vitórias nos concursos da instituição. O artista foi premiado em 1906, por sua obra Anchieta Escrevendo o Poema à Virgem [Figura 3], com o Prêmio de Viagem concedido pela Escola de Belas Artes. Como forma de aprimoramento de conhecimento, os alunos eram enviados para a uma temporada de estudos nas principais instituições de arte europeias.[15]

23.    Segundo Ana Paula Simioni, a busca pelo aprendizado sobre os padrões europeus de arte mesclava-se com a necessidade de “construir uma nova arte que atendesse, ao mesmo tempo, às demandas locais e a um desejado universalismo.”[16] Em uma perspectiva da época sobre o Prêmio de Viagem, segundo um artigo de Victor Viana publicado na revista Renascença,[17] os prêmios de viagem eram imprescindíveis para a formação dos artistas do período:

24.                             os premios de viagem são uma instituição necessaria e salutar. A viagem de instrucção é hoje um complemento natural de toda educação. E tanto ou mais do que outro qualquer profissional, o artista precisa ver paizagens novas, viajar para estudar nos museos, contemplar as obras primordiaes da arte, instruir-se, familiarisando-se com os primeiros circulos artísticos do mundo.[18]

 

25.    O período de aprendizado em escolas parisienses, como a École Nationale Supérieure des Beaux-Arts e a Académie Julian, trouxe o reconhecimento da elite artística brasileira sobre o trabalho de Lucílio no território europeu, como demonstra Piedade Epstein Grimberg:

26.                                  O ano de 1911 foi um dos mais frutíferos para a carreira do artista: expõe no mesmo Salon o quadro Sono [Figura 4] , belo desenho [sic] de nu, no qual é possível constatar a especial estrutura da matéria; participa do Salão Internacional de Bruxelas com o quadro Despertar de Ícaro [Figura 5], uma de suas pinturas mais conhecidas, de forte influência simbolista, remotamente sugerida pelo vôo pioneiro de Santos Dumont e executa vitrais para o Pavilhão do Brasil na Exposição Internacional de Turim, na Itália, representando A República Brasileira guiada pela Ordem e Progresso, desenvolve seu comércio e sua indústria, alegoria do Cruzeiro do Sul simbolizado por figuras femininas.[19]

27.    Com a volta de Lucílio ao Brasil, em 1911, o pintor trouxe na bagagem inúmeras obras que dão origem à sua primeira exposição [Figura 6, Figura 7 e Figura 8], junto da esposa Georgina de Albuquerque, que também apresentou obras no mesmo evento. O período que marca a volta de Lucílio a seu país de origem e a realização de sua primeira exposição é também o período no qual foi produzida Mãe Preta, pintura apresentada inicialmente na Exposição Geral de Belas Artes de 1912, promovida pela Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro.

28.    Mãe Preta representa uma ama de leite negra, sentada ao chão, amamentando uma criança branca, enquanto ao seu lado é representada uma criança negra, aparentemente nos primeiros meses de vida. O local no qual tais personagens estão representados não recebe destaque na cena, dirigindo o foco do espectador para as figuras que ali se apresentam. Mais especificamente, o foco dirige-se ao olhar da ama de leite sobre a criança negra, criando no espectador a impressão de que um forte sentimento liga a mulher ao bebê que se encontra ao chão. A mãe preta apresenta uma visão de melancolia e apatia, enquanto amamenta o filho do branco, inserida em um ambiente paupérrimo, que remete a uma situação socialmente desfavorável.

29.    No que diz respeito à representação da mulher negra na imagem, pode-se pontuar algumas questões que travam um embate direto com os moldes artísticos esperados pela ENBA de seus alunos naquele momento. As questões da “desacademicização”[20] permeavam os corredores da instituição. Porém, tais mudanças no Brasil se diferenciavam do processo de desvencilhamento das ideias acadêmicas que acontecia na Europa. Ivan Coelho de Sá  explica tal dificuldade no Brasil através do perfil de ex-colônia do país.[21] O processo de “desacademicização” no Brasil levava a ENBA ao encontro do nacional brasileiro, que era omitido e renegado na maioria dos trabalhos ali concebidos, por conta de sua incompatibilidade com o modelo que, segundo o pensamento da elite, permitiria o progresso do país. Encontravam-se aqui negros, pardos e miscigenados, misturas de um passado colonial que se desejava omitir da história pelos republicanos e solucionar através das discussões raciais que emergiam nas falas dos homens de ciência daquele momento e em segmentos da elite que compunham a sociedade brasileira.

30.    A partir da análise da pintura em questão, percebeu-se a sua singularidade em relação com as outras produções de Lucílio de Albuquerque, suscitando a busca de possíveis motivações do autor para a produção de Mãe Preta. Essa singularidade consiste na ênfase de Lucílio sobre um contexto histórico-social específico, diferentemente de suas produções anteriores a 1912, carregadas de influências e técnicas do “art nouveau” e outras tendências modernas, apreendidas pelos pintores brasileiros na Europa. 

Arthur Timótheo da Costa: compartilhador do ambiente artístico de Lucílio de Albuquerque

31.    Durante o processo de estudo sobre o ambiente artístico do qual Lucílio de Albuquerque fez parte, encontrou-se na atuação de Arthur Timótheo da Costa (1882-1922) [Figura 9] pontos de encontro com a carreira com Lucílio, que são evidências importantes para a construção artística na produção dos dois pintores.[22]

32.    Arthur Timótheo foi um artista brasileiro ativo entre as duas primeiras décadas do século XX. Ele crescera simultaneamente a Lucílio de Albuquerque no ambiente artístico da ENBA e também fora dela. Como demonstra Arthur Valle,[23]  

33.                                               [....] em 1907, com a movimentada tela Antes do Aleluia, hoje pertencente ao acervo do Museu de Belas Artes do Rio de Janeiro, Arthur Timótheo ganhou o prêmio de Viagem à Europa na Exposição Geral de Belas Artes, então o mais importante certame artístico brasileiro. Ele fixou-se em Paris para estudar e aperfeiçoar-se, não deixando de percorrer outros países europeus como a Itália e a Espanha. Em 1911, realizou junto com seu irmão João e outros artistas de sua geração a decoração do Pavilhão Brasileiro da Feira Internacional de Turim. De volta ao Brasil e durante toda a década de 1910, Arthur Timótheo desenvolveu intensa atividade artística, expondo frequentemente nas Exposições Gerais, participando de entidades artísticas independentes como a Juventas (depois Sociedade Brasileira de Belas Artes) e estabelecendo-se como renomado pintor e decorador.

34.    Em meio às produções artísticas de Arthur Timótheo da Costa, o quadro No atelier de Lucílio (1910) [Figura 10] mostra a relação que se formara no compartilhamento de experiências entre ambos os pintores. A obra fora realizada durante a convivência entre os artistas na Europa, viabilizada pela ENBA através do Prêmio de Viagem ganho por ambos. 

35.     Arthur Timótheo dedicava-se em muitas de suas produções à representação do negro e de sua inserção na sociedade [Figura 11, Figura 12, Figura 13 e Figura 14], refletindo a sua própria condição. Negro, foi um dos poucos de sua etnia que se evidenciaram no espaço da ENBA naquele período, o que pode ser um fato preponderante para o resultado final de muitas de suas obras

36.    Tais fatores possibilitam uma identificação e similaridade entre as produções artísticas de Arthur Timótheo da Costa e a obra Mãe Preta. Assim como Arthur, Lucílio de Albuquerque, apesar de sua situação privilegiada como indivíduo branco - num momento em que a discussão racial acerca dos negros estava emergente - estava inserido em uma sociedade herdeira das mazelas sociais da escravidão. Independentemente da posição política e social do pintor, pode-se imaginar que o olhar de Lucílio possivelmente cruzou com diversas “mães pretas,” atribuindo a uma delas o protagonismo na obra de 1912. 

A representação do negro na transição dos séculos XIX e XX: o local de se posicionar a mulher negra na arte do período 

37.    Segundo Sidney Chalhoub, “em todo o período do tráfico negreiro para o Brasil, desde meados do século XVI até os anos 1850, chegaram ao país mais de 4,8 milhões de africanos escravizados.”[24] O negro estava inserido em diversos âmbitos da sociedade brasileira durante o final do século XIX e início do XX. Fosse nos grandes centros urbanos ou nas áreas rurais, principalmente na região Sudeste,[25] a mão de obra era predominantemente caracterizada por mãos negras, fossem livres ou escravizadas. Nos serviços braçais, como nas lavouras de café, no transporte de cargas, na construção civil ou nos serviços domésticos, a presença dessa mão de obra era maciça. Dessas funções, os serviços domésticos eram geralmente exercidos por mulheres.[26]

38.    No que diz respeito ao período pós-escravidão, entre o final do século XIX e início do XX, pode-se observar que o cenário das atividades exercidas pelos negros no Brasil pouco mudou em comparação às atividades exercidas durante a vigência da instituição escravista. Com o advento da República e a abolição da escravidão, agora era necessário pensar-se de que forma inserir esses indivíduos na sociedade brasileira - ou não.

39.    Dada a abolição da escravidão, os negros, agora libertos em sua totalidade, em sua maioria não possuíam conhecimento sobre outros serviços diferentes dos que exerciam quando escravizados. Esse fato os tornava dependentes dessas antigas funções, porém, em diferentes condições, criando agora um “vínculo empregatício.” O trabalho era feito em troca de pequenas porções de terras para cultivo de alimento ou renda financeira. Ou seja, o negro se “dispunha” a continuar em sua função por conta da necessidade de sobrevivência, pois a vida de liberto era cercada de estigmas criados pela sociedade acerca de sua etnia e cor. Segundo as historiadoras Hebe Mattos e Ana Maria Rios, nas áreas rurais a decisão de “deixar ou não as fazendas era uma decisão estratégica,”[27] pois os libertos corriam o risco de não obterem chances de trabalho fora daquelas que lhes eram oferecidas no momento em que deixavam a fazenda na qual trabalharam como escravos.

40.    Restavam também para os libertos os trabalhos braçais e domésticos das grandes cidades: “nos anos finais do século XIX e início do XX mais de 70% da população economicamente ativa ex-escrava, estava inserida no trabalho doméstico.”[28] Nos centros urbanos, os negros livres possuíam maiores possibilidades de trabalho, considerando a demanda local por ocupações braçais. No caso do trabalho para as mulheres, não era diferente. Em meio as atividades domésticas, as mulheres se encontram em sua maior parte realizando tarefas ligadas ao ambiente do lar ou se estabelecendo como empregadas por contratos de locação de serviços nos locais dos quais antes faziam parte da mão de obra escravizada.

41.    Estreitando os caminhos dessa pesquisa, buscou-se focar o olhar em uma das atividades exercidas pelas mulheres negras: a função como ama de leite. Essa, comumente observada na sociedade brasileira antes e depois do fim da escravidão, é a ação principal representada no quadro Mãe Preta de Lucílio de Albuquerque.

42.    No artigo Perigosas amas de leite: aleitamento materno, ciência e escravidão em A Mãi de Família, Karoline Carula aborda os discursos relacionados à atividade das amas de leite entre os séculos XIX e XX.[29] As teorias raciais estavam no centro dos debates científicos, sendo aplicadas na sociedade brasileira a partir do último quartel do século XIX, segundo Lilia Schwarcz.[30] Mas as primeiras discussões que envolviam as diferenças dos povos avistados no Novo Mundo em comparação ao modelo eurocêntrico eram datadas do século XVIII. Tais discursos tinham o propósito de “justificar as diferenças essenciais entre os homens.”[31]

43.    Na introdução de seu trabalho Estrangeiro em sua própria terra,[32] Márcia Naxara mostra que o uso do termo “nacional” nos documentos do século XIX e início do XX era direcionado para a população pobre brasileira, geralmente mestiços escravizados ou já libertos. A autora ainda define esse período como de tentativa de entendimento da cultura humana, pautado num ideal evolucionista que encarava o progresso do país através de uma visão unilateral: “O povo brasileiro, visto por suas elites, aproximava-se do atraso e da barbárie, enquanto que o que se tinha em vista era alcançar o progresso e a civilização. Tal questionamento acabou levando a uma identificação do brasileiro pela ausência do que se esperava ele pudesse ser, ou seja, por aquilo que lhe faltava.”[33] 

44.    Como demonstrado por Naxara, a visão da maior parte dos homens de ciência brasileiros estava pautada pelos moldes socioculturais europeus, julgados primordiais para o progresso da civilização no entendimento da elite brasileira.[34] Porém, o que se via no país era a heterogeneidade étnica e social da população, o que comprometia as expectativas das elites no que dizia respeito ao progresso que esperavam:

45.                                  Nos jornais, nos censos, os dados quantitativos reafirmavam as apreensões teóricas. Enquanto o número de cativos reduzia-se drasticamente - em 1798, a população escrava representava 48,7% ao passo que em 1872 passava a 15,2%. Nessa mesma ótica, os dados de 1890 tornavam-se ainda mais aterradores. Ou seja, se na Região Sudeste (devido, sobretudo, ao movimento imigratório europeu) a população branca predominava - 61% -, já no resto do país a situação se invertia, chegando os mestiços a totalizar 46% da população local. (SCHWARCZ, 1993, p. 13) 

46.    A partir destes valores, relativos ao período entre o fim do Império e início da Primeira República, o antagonismo de classes posto durante o Império entre senhores e escravos agora era representado entre brancos e negros, demonstrando que qualquer ideal de igualdade entre raças não aconteceria tão cedo. As diferenças entre brancos e negros persistiram e a dificuldade da elite em lidar com a presença de indivíduos livres e miscigenados era demonstrada nas máximas de que o branqueamento poderia ser uma das chaves para um futuro de progresso do país.

47.    Segundo Túlio Henrique Pereira, a elite via a emergência de um problema no que dizia respeito a etnia e a miscigenação da população. Os esforços e estratégias do Estado refletiam-se nas obras artísticas, profundamente marcadas pelas ideias hegemônicas vigentes. Dessa forma, segundo Pereira, pode-se dizer que a arte era, em grande medida, uma reprodutora da impressão que a sociedade possuía do indivíduo negro, geralmente associado ao trabalho e a condição de pobreza e degenerescência.[35]

48.    A associação entre negro e trabalho não se restringia, naturalmente, à Mãe Preta de Albuquerque. A relação da mulher negra e sua ligação com o trabalho e a pobreza também estavam presentes em outras representações apresentadas nos salões de arte nas últimas décadas do século XIX e início do XX. Existe entre Albuquerque e outros pintores da época uma semelhança que se tornou um ponto importante para a compreensão do campo artístico de então e sobre como os artistas representavam o negro em seus quadros. Como apontado por Maraliz de Castro Vieira Christo,[36] número significativo dessas obras estiveram no ambiente dos “Salões” de Belas Artes da ENBA e foram adquiridos pelo governo. A autora também pontua um fato a que se deve atentar a respeito do significado dessas obras na trajetória de seus autores: todas as obras que representavam a mulher negra em seu espaço de trabalho foram momentos episódicos na carreira de pintores como Antonio Ferrigno [Figura 15], Armando Vianna [Figura 16], Gustavo Dall’Ara [Figura 17] e Modesto Brocos [Figura 18]

49.    Portanto, observar as informações fornecidas pela imagem e atentar para o seu período de produção são fatores importantes para tentar entender parte da perspectiva de Lucílio de Albuquerque para a produção de Mãe Preta. Ao perceber o ambiente artístico no qual o artista estava inserido, também percebemos a pontualidade de pinturas com essa temática, produzidas em um momento em que a sociedade brasileira ia no movimento contrário ao dessas representações, graças à tentativa de omissão do passado escravagista brasileiro por parte do Estado através, principalmente, da inserção de imigrantes europeus nos antigos lugares de trabalho ocupados pelos negros.  

As faces do discurso crítico sobre a obra Mãe Preta

50.    A crítica do jornalista Bueno Amador sobre Mãe Preta exemplifica um dos pontos de vista da elite artística daquele momento sobre o quadro. Vê-se neste discurso que as obras em que são aplicadas as técnicas tradicionais apreendidas por Lucílio na França são aclamadas por Amador, que vê nelas traços do talento do pintor. Porém, na representação de Mãe Preta, o crítico sugere que o pintor não atendeu às expectativas:

51.                                  De Lucilio de Albuquerque temos a apreciar o Despertar de Ícaro, a que já nos referimos quando o artista apresentou em público os seus trabalhos, ao voltar da Europa. “Coquettere” é outro trabalho gracioso e leve, onde o pintor apresentou a sua técnica reveladamente segura; os demais trabalhos que exibe casam-se bem como feitura e somente há um pequeno reparo quanto a tela Mãe Preta.

52.                                  Aí o assunto prestava-se para uma composição vigorosa, mas o artista alcançaria o seu fim se não apresentasse um ambiente fraco.

53.                                  Os modelos de que se utilizou e a disposição do trabalho não traduzem a beleza que o assunto poderia inspirar se fosse tratado com mais vigor. Lucilio de Albuquerque verá nestas linhas a franqueza aberta de quem deseja sempre o ver na vanguarda a produzir otimamente, pois que de tanto ele é capaz.[37] 

54.    Outra crítica, publicada no jornal A Noite de 18 de julho de 1912 analisa a obra Mãe Preta a partir da cena representada pelo artista, e não pela técnica empregada: 

55.                                  Lucilio de Albuquerque concorrerá com um seu novo trabalho, que se acha quase terminado. "A mãe preta” é o título deste quadro. É um hino de gratidão à raça, que tantos serviços nos prestou, servindo-nos com carinho, criando com verdadeiro amor maternal os filhos daqueles que por uma desumanidade inaudita a colocaram sempre fora da lei, contra os próprios princípios da natureza.[38]

56.    Essa crítica é de rico valor histórico no que diz respeito ao pensamento de parte da crítica no momento de apresentação dessa obra no “Salão” de Belas Artes de 1912. Ela exemplifica uma concepção que destaca o aspecto histórico da obra, e não somente uma preocupação estética. Constitui uma fala que se diferencia das falas recorrentes no cenário político e social daquele momento, dado o discurso de segregação no Brasil e em diversas outras localidades do mundo.[39] A fala presente no jornal caracteriza uma preocupação que reconhece a ama de leite negra como indivíduo participante da sociedade, ainda que lhe fosse negado todo e qualquer tipo de direito - até mesmo o de criar seus próprios filhos. Dentro desse contexto, chama atenção a fala do crítico anônimo, que acaba por exaltar as amas de leite do período escravista.

57.    Além da obra em si, é possível entender tais críticas como fontes necessárias para uma aproximação ao ambiente artístico e social no qual a imagem estava inserida. Para além dos traços formais, compreendemos que o quadro teria o objetivo de refletir ou traduzir aspectos sociais da época, quando a imagem do indivíduo negro se colocava como desvalorizada e prejudicial aos costumes e hábitos dados como necessários para o progresso da sociedade da “Belle Époque” carioca.

58.    A partir da crítica apresentada no periódico A Noite identifica-se a exaltação do vínculo entre a ama de leite negra e o filho do senhor branco, vínculo esse que matizava a face cruel da instituição escravista e de suas relações sociais. Tais relações eram estabelecidas no âmbito de um mundo concebido na fórmula “escravo ‘versus’ senhor branco,” não tecido a partir da vontade e livre arbítrio do negro, mas sim sobre a identidade deste na condição de escravizado. Percebe-se, assim, no teor da crítica veiculada no periódico A Noite, que as chagas deixadas pela herança negativa da escravidão sobre as amas de leite foram relativizadas em comparação à função exercida por outros escravizados.

59.    Essa visão pode ser analisada a partir do estudo do ensaísta Gilberto Freyre, o qual em Casa Grande & Senzala (1933) demonstra a perspectiva “docificada” sobre o papel das amas de leite no Brasil colonial: 

60.                                  Quanto às mães pretas, referem as tradições o lugar verdadeiramente de honra que ficavam ocupando no seio das famílias patriarcais. Alforriadas, arredondavam-se quase sempre em pretalhonas enormes. Negras a quem se faziam todas as vontades: meninos tomavam-lhe a benção; os escravos tratavam-nas de senhoras; os boleeiros andavam com elas de carro. E dia de festa, quem as visse anchas e enganjentas entre os brancos da casa, havia de supô-las senhoras bem-nascidas; nunca ex-escravas vindas da senzala. É natural que essa promoção de indivíduos à Casa-Grande, para o serviço doméstico mais fino, se fizesse atendendo a qualidades físicas e morais; e não é à toa e desleixadamente. A negra ou mulata para dar de mamar a nhonhô, para niná-lo, preparar-lhe a comida e o banho morno, cuidar-lhe a roupa, contar-lhe histórias, às vezes substituir-lhe a própria mãe - é natural que fosse escolhida dentre as melhores escravas da senzala. Dentre mais limpas, bonitas, mais fortes.[40] 

61.    Segundo Rafaela Deiab,[41] a docilidade enfatizada no jornal A Noite e por Freyre  foi questionada somente a partir da década de 1940, quando autores como Florestan Fernandes criticaram muitas das falas de Gilberto Freyre quanto ao aspecto supostamente benigno da escravidão no Brasil.[42] Pôde-se, através do estudo de Sonia Maria Giacomini, perceber que o papel da mulher negra na sociedade escravagista exposto por Freyre omitia a exploração sofrida por esta na situação de escravizada: 

62.                                   É interessante notar que esta mitologia não se limita a produzir uma imagem deformada da relação senhor-escravo. Isto porque na sua lógica a mulher escrava ocupa um papel central: ‘ponte entre duas raças’, embaixadora da senzala na casa grande e vice-versa, e outras coisas do gênero. Em outras palavras, as relações senhor-escrava, senhora-escrava, filhos brancos-escrava jogam um papel estratégico na estruturação de teorias sobre o patriarcalismo da escravidão brasileira.[43]

63.    Foi também analisado o periódico A Mãi de Família (1879-1888), o qual foi estudado no já referido partido de Karoline Carula.[44] Esse periódico apresenta alguns aspectos da mentalidade da época acerca das amas de leite através do ponto de vista do higienista e também redator do jornal Carlos Costa. Este argumentava em favor do fim da amamentação por via da ama de leite escravizada, acreditando na influência negativa desta sobre o leite oferecido à criança. Costa visualizava na obrigatoriedade da amamentação do filho do senhor e na retirada do filho da cativa, em função do trabalho de ama de leite, motivações para um sentimento de revolta que poderia se refletir no leite da ama.

64.    Como ilustração desta percepção, o periódico apresentava, em sua edição de 15 de novembro de 1888, o conto literário Mãi Preta,[45] que relata a vida de uma ama de leite escravizada: 

65.                                  Os nossos antepassados, - tendo descoberto esta terra, que se denominou Brazil, em virtude da grande abundancia de madeira, cuja côr é semelhante à da braza, - e reconhecendo que o territorio era immensamente grande, e assim difficil não só de povoal-o como tambem de fazer culticer o seu fecundo solo, - tiveram a triste como imperdoavel idéa de mander á Costa da Africa buscar, a troco de dinheiro, de bugigangas, uma infinidade de nossos semelhantes, cuja côr infelizmente era preta; e despejal-os em nossas plagas amarrados e semi-nús, e reduzindo-os assim á mais abjecta escravidão.

66.                                  Esses entes, roubados ás suas patriás e familias, sem bastante desenvolvimento intellectual, eram reduzidos ainda mais á completa brutalidade, e convertidos em machinas e, por destituidos de vontade, elles não tinham o direito de pensar nem de amar, não tinham laços de familia, não tinham crenças, nem lhes era permitido sonhar uma outra existencia mais comoda e vantajosa; foram por muito tempo objecto de um commercio nefando, mas que fez muitas fortunas e gravou muitos brazões.

67.                                  Enumerar os horrorosos espectaculos da escravidão, fazer lembrar os gemidos e as lagrimas do escravo cortado pelo vergalho do feitor de fazenda, esa dores pungentes sentidas no escuro da sanzala, seria para mim nimiamente penoso, pois compartilho da magoa d'aquelles que reconhecem que a patria só será grande no dia em que poder remir o ultimo captivo.

68.                                  Identificadas porém a vida da escravidão, algumas dessas pobres creaturas chegaram mesmo a idolatrar seus algozes; algumas d'ellas foram dedicadas em extremo, e, sem poderem erguer francamente os olhos, bemdiziam aqueles que lhes davam o pão para alimento e o duro trabalho para amenidade de suas vidas.

69.                                  Mãi-Preta foi uma dessas creaturas; sua vida porém não devem ficar no olvido, pois que symbolisa a existencia de um'alma dotada de sentimentos extraordinariamente nobres.

70.                                  Isto teve lugar na época do maior fervor.

71.                                  O Dr. N... depois de sua formatura em medicina, casou-se com a filha de um negociante portuguez, e foi residir no largo do Valongo, hoje da Imperatriz. Mezes depois, estando sua mulher prestes a dar á luz, foi ter com o sogro e encommendou-lhe uma preta, de bôa figura, sadia e mãi de pouco tempo, para ama de seu filho ou filha, que estava para nascer. O dedicado sogro, ébro de contentamento pela boa nova, e querendo ser agradável á filha, presenteou-a com uma preta de vinte annos, e mãi a poucos mezes. Antes, porém, de leval-a á casa da filha o tal negociante chamou a preta, e revistou-a grosseiramente, e como notasse nella medo, repugnancia, ou timidez, mandou dar-lhe uma grande sóva, que, sem forças a atirou no leite. Foi esta a paga que de ante mão recebeu a preta com seu leite ia dar vida ao filho do branco.

72.                                  Tendo nascido a almejada criança, foi a filha da preta levada para a Róda, e, como a pobre mãi chorasse por essa separação brusca, foi de novo barbaramente castigada; mas, como o seu coração era accessível ao carinho, o vagido da recém-nascida lhe tocou n'alma, e assim tambem o soffrimento de sua senhora: esquecendo-se do mal que lhe faziam pelo bem que ia prestar, tomou a criancinha, chegou-a ao seio a amamentou-a devotamente.

73.                                  De então, a preta era toda dedicação e affagos pela innocentinha, que agradecida estendia-lhe os seus mimosos bracinhos.

74.                                  Não sendo facil reter-se em lembrança o nome da preta africana, e como seu mister era servir de mãi dessa criança, acostumaram-se a todos a chamal-a de Mãi Preta, ficando assim, ella de então conhecida.

75.                                  O Dr. N..., considerando a ama de sua filha como sua legitima propriedade, não trepidava em castigal-a constantemente por qualquer insignificante motivo, por qualquer choro da criança, etc. Mãi-Preta era victimada sem razão, pois que, não se póde imaginar maior desvello, pois nem mãi mais carinhosa trataria melhor sua filha.

76.                             De prompto novas qualidades caracterisaram bem o que era a Mãi-Preta: era muito obediente, prestativa, ligeira, queria sempre ver seus senhores alegres; se elles tinham alguma contrariedade, ella chorava; beijava sua filhinha de criação, não queria vel-a achorar, não por medo do castigo, mas sim porque lhe queria bem; e a medidade que a foi vendo crescer, mais e mais a estimava. Se por ventura lhe davam alguns cobres, gastava-os todos em brinquedos para a criança. Enfim, tudo n'ella era bom e por isso todos a queriam bem.

77.                                   (Continua) (COSTA, 1888, p.166-167) 

78.    O discurso de Carlos Costa reforça a brutalidade dos brancos e a subserviência da mulher negra na sociedade brasileira do início do século XX - no caso, a retirada do filho biológico em prol da amamentação do filho do branco. Quando o filho da ama de leite era retirado de seus braços em detrimento da amamentação do “filho branco” percebe-se de que forma a escravidão tocava nos direitos desses indivíduos

79.    A atividade de ama de leite era uma das funções possíveis para a negra escravizada ou livre. Segundo Bárbara C. R. Martins, em sua tese Reconstruindo a memória de um ofício: as amas de leite no mercado de trabalho urbano do Rio de Janeiro (1820-1880),[46] essa função era disseminada e naturalizada na sociedade carioca do século XIX. Para a autora, a imagem de ama de leite pode ser vista como significado da desapropriação dos direitos da mulher cativa causada pela instituição escravista. Essa desapropriação pode ser exemplificada através do ato de se retirar o filho dos braços das mães escravizadas, com o intuito destas servirem exclusivamente como mães de leite de filhos de senhores brancos. Nesse mesmo sentido, segundo Deiab, “para ter condições de aleitar um filho branco, era necessário que a escrava tivesse engravidado tendo, portanto, também filho natural. Este último muitas vezes morria, era vendido, dado a criar mediante aluguel, ou levado para a roda.”[47]

80.    A partir do último quartel do século XIX, ao mesmo tempo em que cresciam as ideias abolicionistas, ganhavam força também as teorias raciais, calcadas nos discursos científicos em voga na Europa naquele momento. Tais argumentos alcançaram a função da ama de leite.

81.    O referido periódico A Mãi de Família demonstra esse fato. Segundo Carula,[48] esse periódico tinha o intuito de educar as mulheres no que dizia respeito aos costumes tidos como corretos na função maternal. Carlos Costa, o redator do jornal, considerava-se responsável na sua posição pelos hábitos de higiene das mulheres. Apoiava-se no argumento de que as mães brasileiras estavam desprovidas do conhecimento correto de como exercer a maternidade, e a função dos “homens da ciência” eram reverter essa situação fazendo-as desempenhar sua posição de acordo com o que era acreditado pelos higienistas.

82.    Uma das preocupações mais enfáticas de A Mãi de Família dizia respeito ao aleitamento materno. Para Costa, o leite era transmissor de características para a criança amamentada. Por isso, disciplinar as mães e investir na ideia do aleitamento materno era essencial. Costa não via só o perigo da inferioridade racial no leite da ama negra, mas também em seus hábitos, que considerava imorais e anti-higiênicos. Para ele, a instituição escravista influenciaria negativamente nos hábitos familiares da “mãi de família” brasileira. A ama de leite escravizada estaria propensa à degeneração e à violência sobre a criança que cuidava, pois, tendo seus filhos retirados dos braços, a escravizada poderia reverter tal ação em um comportamento negativo no trato da criança branca a qual amamentava, além isso de poder comprometer a qualidade do leite produzido pela mesma. Assim, percebe-se que, para o redator do jornal, a escravidão era um mal para a formação das famílias brancas brasileiras.

83.    A edição do jornal publicada logo após a abolição da escravidão deixa essa posição clara: 

84.                                  Bem sabeis, minhas senhoras, quantas lutas, quantos sofrimentos experimentaram as senhoras brasileiras, durante o longo e desgraçado período da escravidão no Brasil, quando eram obrigadas a recorrer às pobres mães escravas para servirem de amas! Sabeis que estas mulheres iam muitas vezes, como verdadeiras vítimas para o sacrifício, sendo forçadas por bárbaros senhores a enjeitarem seus filhos… Pois bem, agora, graças a gloriosa lei de 13 de Maio, não há mais mães escravas; todas as mulheres são iguais; de sorte que não haverá mais distinção entre as amas de leite livres e escravas. Elas poderão atualmente servirem como amas, por sua livre vontade e é natural supor-se que farão a amamentação de bom coração, podendo levar consigo seus filhos. (COSTA, 30 jul. 1888, p.89) 

85.    Segundo Carula, Carlos Costa não deixava passar em branco as críticas referentes às amas de leite negras, as quais ainda carregavam características e comportamentos que deveriam ser monitorados pelas famílias das crianças brancas. Via a necessidade das mães que utilizassem dos serviços das amas de leite no pós-abolição atentarem para os hábitos e costumes destas, como supostos vícios e falta de inteligência.[49] Ainda de acordo com Carula, o comportamento proveniente dos hábitos das amas de leite, ex-escravizadas, poderia ser transmitido para as crianças amamentadas, enfatizando a importância da educação dessas mulheres. Carula demonstra que apartar a função da ama de leite naquele momento era, para Costa, afastar os resquícios da instituição escravista da sociedade brasileira planejada pelos higienistas, onde habituar a família ao ato da amamentação materna era se apartar do modelo de sociedade anterior, construído em meio a convivência com negros escravizados.[50]

86.    A análise iconográfica da obra Mãe Preta nos permitiu identificar esses debates, abrindo algumas possibilidades de interpretação. Considerando o contexto acima explorado, podemos sugerir que a cena retratada representaria um momento após 1888, quando as ex-cativas que ainda se ocupavam como amas de leite não eram mais obrigadas a se separarem dos filhos em função do seu trabalho. Plausível também é supor a possibilidade do contato do artista com essa prática, que era recorrente na sociedade carioca desde os tempos coloniais. 

O laço familiar entre mãe e filho negros: a comprovação da formação de famílias escravizadas na região sudeste no Brasil 

87.    Outros estudos afirmam, porém, possibilidades distintas de interpretação das realidades escravistas no Brasil, contrapondo-se ao discurso da corrente historiográfica em voga até a década de 1970 na historiografia brasileira, que via na senzala um ambiente degenerado e atrasado.[51]  Calcados no imaginário europeu e aplicados sobre culturas denominadas como diferentes, esse discurso que enfatizava as diferenças entre brancos e negros, pode ser observados, por exemplo, nos relatos de viajantes estrangeiros que desembarcaram no Brasil desde o século XIX.

88.    A partir da utilização de fontes que não privilegiavam a dinâmica sociocultural africana no Brasil, essa corrente historiográfica destacava o ponto de vista europeu sobre a diversidade da população brasileira. Essas fontes justificaram a quase nulidade da temática que dizia respeito a formação familiar no ambiente das senzalas. Segundo Amanda Rodrigues de Miranda, em seu artigo Família Escrava no Brasil: um debate historiográfico (2012), essa corrente era embasada principalmente em relatos de viajantes pautados na visão europeizada da estrutura familiar e na certeza de que os africanos e afro-brasileiros escravizados eram inferiorizados culturalmente, observando uma improbabilidade na existência da família cativa. Essa conclusão, segundo Miranda, pode-se ser explicada através das diferentes temáticas tratadas nas fontes analisadas por historiadores como Manolo Florentino[52] e Suely Robles Reis de Queiroz.[53] As fontes utilizadas por esses autores, como os relatos de viajantes, possuíam preocupações diversas em seu discurso - como com a paisagem, a sociedade e a cultura brasileira numa perspectiva mais geral - e não somente sobre questão da escravidão no Brasil e as estruturas sociais advindas dessa instituição.

89.    Entretanto, outros autores embarcaram em busca de fontes diferenciadas que refletiram um resultado singular sobre a formação de famílias nas senzalas brasileiras, se comparado aos obtidos até aquele momento. Segundo Miranda, autores como Robert Slenes e Hebe Mattos dedicaram trabalhos a essa temática e utilizaram-se de fontes de cunho demográfico de diferentes áreas, comprovando a existência de núcleos familiares de escravizados em diferentes períodos e em várias regiões do Brasil. De acordo com Miranda (2012, p.157), sobre a obra de Mattos “é possível perceber em seu postulado que o levantamento de inventários ‘post-mortem’ em algumas regiões, como Campos, Capivari e Recôncavo da Guanabara, na Baixada Fluminense, traz evidências da formação familiar cativa,” enquanto Slenes, em seus estudos sobre família escrava em Campinas, aborda, entre outros aspectos,  a visão do senhor em relação ao casamento escravo: “os senhores médios e grandes de Campinas não só olhavam com favor, mas incentivavam o casamento religioso de seus escravos” (SLENES apud MIRANDA, 2012, p. 157).

90.    A partir da década de 1970, portanto, os estudos historiográficos que envolviam as relações familiares observadas no ambiente das senzalas demonstraram, através de análises de cunho demográfico e quantitativo, que havia a existência de laços familiares naqueles espaços e também um grande número de matrimônios entre os escravizados. Segundo o próprio Slenes (1998, p.2)

91.                                  Os estudos subsequentes, contudo, mudaram drasticamente o quadro empírico referente à família escrava. Os trabalhos demográficos têm focalizado especialmente o Oeste paulista no século XIX - exatamente a região das plantations o “hinterland” da cidade de São Paulo) que era o ponto de referência de Florestan Fernandes. Esses estudos mostram uma altíssima razão de masculinidade entre os escravos ao longo do século, junto com altas taxas de casamento formal, feito na Igreja, entre homens e mulheres, em propriedades com 10 ou mais cativos (nas quais estava a maioria dos escravos). Indicam também, para essas propriedades, uma estabilidade impressionante (no contexto da historiografia sobre o assunto) nas famílias conjugais constituídas (isto é, entre cônjuges e na convivência entre pais e filhos menores de 10 anos). Em suma, nas propriedades maiores, a experiência de viver numa família conjugal estável era a norma para a grande maioria de mulheres e crianças escravas. Além disso, em propriedades “maduras”, com muitos anos de funcionamento, essa estabilidade se traduzia na existência de muitas famílias extensas, contando com a presença de três gerações e a convivência entre irmãos adultos e seus respectivos filhos. Se o tráfico africano e interno despejava sempre mais “estrangeiros” (principalmente homens) nas fazendas da região, não é verdade que a maioria dos cativos - muito menos a maioria das mulheres e das crianças - estivessem “perdidos uns para os outros”, vivendo condições de anomia. Portanto, as conclusões de Fernandes e Bastide a respeito do processo de aculturação dos escravos, de sua incapacidade “política”, e das causas de sua falta de mobilidade social após a abolição são improcedentes. 

92.    Utilizando-se dos dados demográficos da região de Campinas - centro de produção de café no século XIX - pode-se perceber a existência de um grande contingente familiar entre os escravos, sendo que “67% das mulheres acima de 15 anos eram casadas ou viúvas e 80% dos filhos menores de 10 anos conviviam com os dois pais ou com um pai ou mãe viúvo.”[54] Fica clara a existência de uma estrutura social que desqualifica os vários discursos que buscavam afirmar a falta de sentimentos e laços entre os escravizados africanos, discursos esses que nos primeiros anos do século XX eram associados à identidade negra pelas elites.

93.    A mentalidade da elite brasileira desse século e dos historiadores que se pautaram em fontes oficiais dos Oitocentos influenciaram fortemente a construção da ideia acerca da não existência de laços familiares dentro das senzalas brasileiras. Os resultados obtidos nas pesquisas de Slenes[55] e Mattos[56] são exemplos de uma historiografia que observa a intimidade de comunidades negras no Brasil escravista e colaboram para estudos como o nosso. Há nesses dados a comprovação de que mesmo que os senhores de escravizados possuíssem um controle maior sobre os costumes dos negros - dada a obrigatoriedade dos cativos servirem a religião oficial do Império e ao matrimônio em moldes católicos - também havia a necessidade e o empenho em criar laços, os quais se tornavam uma forma de esperança e tentativa de um futuro mais estável dentro das casas-grandes através do ato de formar uma família.

94.    Miranda enfatiza a formação familiar entre escravos não somente como um mecanismo de dominação dos senhores sobre os escravos, mas também como uma posição de resistência dos escravizados. A formação de gerações poderia propiciar uma continuidade capaz de disseminar e perpetuar costumes e hábitos culturais dos africanos e afro-brasileiros, tão apontados como inferiores aos olhos da aristocracia branca no Brasil.

 Considerações finais

95.    Utilizar-se de uma fonte imagética como evidência histórica permite que o pesquisador passe a observar o mundo ao seu redor com uma lente que ultrapassa a superfície do visível. As conexões realizadas pelo espectador ao longo da análise de uma fonte imagética têm um papel importante para a construção do saber histórico. A partir de uma obra carregada de interrogações como Mãe Preta, essa análise - seja com foco no aspecto formal, semiótico ou cultural (FREITAS, 2011) - é o ponto de partida de um longo trabalho de pesquisa, necessário para construir um pensamento interpretativo e embasá-lo através das possibilidades dadas ao historiador por uma imagem. Através de referenciais teóricos, das evidências e conclusões obtidas, pode-se percorrer um caminho que leva a eventos, situações e contextos que podem aproximar o “leitor” da imagem do âmbito de sua produção e da mentalidades e discursos que a permearam.

96.    A imagem, produzida no início do século XX, insere-se em um contexto histórico rico em mudanças - como a adaptação do Brasil ao sistema republicano, a abolição da escravidão, a inserção do negro na sociedade brasileira. Tais fatores permearam o espaço de vivência de Lucilio de Albuquerque, formador de sua personalidade pessoal e artística. De certa forma, podemos dizer que estes fatores mobilizaram o pintor na direção do quadro, tal qual ele foi concebido e composto. Assim, analisar esse contexto histórico é importante para uma apreensão das intenções e significados da imagem.

97.    Com as afirmativas de Robert Slenes e Hebe Mattos, analisadas no estudo de Miranda (2012), pôde-se perceber que a formação da família escravizada, principalmente na região Sudeste do Brasil, opõe-se ao conjunto de ideias que se estruturam até a década de 1970. Grande parte da população escravizada, a partir da segunda metade do século XIX, aderiu aos costumes católicos do Estado brasileiro através da formação familiar a partir do matrimônio, firmando laços que visavam uma estabilidade e a disseminação de suas heranças culturais, num embate com a ideia de desestrutura familiar colocada a respeito dos negros dentro das senzalas. A partir da segunda metade do século XIX e com o fim definitivo do fluxo de africanos novos advindos do outro lado do Atlântico em 1850, por conta da lei Eusébio de Queiroz, o sincretismo cultural entre a cultura africana e brasileira viabilizou aos negros escravizados uma relativa adaptação às relações familiares habituais no Brasil.

98.    Mãe Preta traz evidências que colaboraram para analisar o ambiente sociocultural no qual as amas de leite estavam inseridas. Como já afirmado anteriormente, a partir da exploração da história das amas de leite no Brasil, concluiu-se que a imagem representada por Lucilio de Albuquerque - com a intenção explícita ou não do autor - apresenta a ama de leite numa condição que pode ser definida como após a abolição da escravidão, por conta da mulher negra estar acompanhada de seu filho na imagem. Os discursos aqui explorados, como aqueles presentes no periódico A Mãi de Família, permitiram conhecer melhor as mudanças operadas na condição de vida e no direito das amas de leite negras após 1888. Não mais escravizadas, estas passaram a exercer a atividade sem terem de abrir mão de seus filhos biológicos, o que era exigido para as mulheres negras cativas que se encontravam nessa posição.

99.    Enfim, Mãe Preta reflete a integração do ex-escravizado na sociedade do início do século XX. Por outro lado, teorias raciais pautadas nas ideias de branqueamento e miscigenação, as quais tinham como objetivo final a omissão da etnia negra no Brasil e a busca de um determinado progresso, resultaram na marginalização de grande parte da população brasileira, sem o devido reconhecimento e possibilidades de crescimento como cidadão, situação que se perpetuaria na história do Brasil.

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VIANNA, VICTOR. Escola de Bellas Artes - Os Premios de Viagem. Revista Renascença, p. 177-179, 1906.

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[1]  BURKE, Peter. Testemunha ocular: história e imagem. Bauru: Edusc, 2004, p. 17. Neste trabalho o autor define de forma clara o papel da evidência histórica, expandindo a visão do historiador sobre o uso da imagem como uma parte importante da pesquisa histórica: “A proposta essencial que esse livro tenta defender e ilustrar é de que as imagens, assim como textos e testemunhas orais, constituem-se numa forma importante de evidência histórica. Elas registram atos de testemunha ocular”.

[2] PANOFSKY, E. Iconografia e Iconologia: Uma introdução ao estudo da arte da Renascença". In: _____. Significado nas Artes Visuais. - 2 ed. - São Paulo: Perspectiva, 1986, p. 51. Panofsky define iconografia como o ato de identificar em uma imagem um “mundo de assuntos específicos ou conceitos manifestados” nestas, enquanto, os temas secundários e convencionais podem ser definidos como as motivações de uma obra e a combinação dos motivos artísticos que levaram a esta. Tais motivos são “reconhecidos como portadores de um significado”.

[3] Ibidem, p.53. O aspecto iconológico de uma obra pode ser explicado como “um sintoma de algo mais que se expressa numa variedade incontável de outros sintomas e interpretamos suas características composicionais iconográficas como evidência mais particularizada desse ‘algo a mais’ (Ibidem, p. 53). Portanto, conjecturar, discutir e interpretar esse “algo a mais” pode ser definido como a iconologia, princípio norteador do estudo aqui apresentado.

[4] DANTAS, Ana Paula A. Do impressionismo a expressionismo - a pintura europeia de encontro a modernidade. Universidade Federal Fluminense, s/d, p. 1. O impressionismo “queria romper com o passado, expressando o que era eminentemente moderno, através de uma pesquisa artística moderna. Esse movimento pressupunha o enfrentamento da realidade sem o suporte do ‘clássico’ e do ‘romântico.’ Tratava-se de libertar a sensação visual do artista e de suas experiências, posturas e entendimentos da sociedade que pudessem, por sua vez, prejudicar a imediaticidade do real.”

[5] NEUNDORF, Alexandro. O estudo do simbolismo no Brasil: como uma história possível para os lugares de interações culturais. Anais do IV Congresso Internacional de História, 2009, p.1. Neundorf introduz seu trabalho buscando esclarecer as origens do movimento simbolista e o objetivo deste naquele momento: “[O Simbolismo] Surgiu na França como um movimento de oposição ao Realismo e ao Naturalismo, e como o ponto para onde confluíram as influências da mística oriental (religião, artes), da crítica às correntes materialistas e cientificistas de uma sociedade industrial que se desenvolvia com vigor nos inícios do século XX”. 

[6] JOLY, Martine. Introdução à análise da imagem. Campinas: Papirus editora, 2012, p. 9.

[7] Ibidem, p. 68.

[8] Ibidem, p.77.

[9] FREITAS, Artur. História e imagem artística: por uma abordagem tríplice. Revista Estudos Históricos, v. 2, n. 34, 2004, p. 13-18.

[10] BAXANDALL, Michael. Padrões de intenção: a explicação histórica dos quadros. Editora Companhia das Letras, 2006, p. 81.

[11] DOS SANTOS, Dominique Vieira Coelho. Acerca do conceito de representação. Revista de Teoria da História, v. 6, n. 2, 2011, p.48. Interessante é seu modo de exemplificar a complexidade que marca o conceito: “É como um tabuleiro de xadrez, muda-se a posição das peças e temos novos sentidos, novas ordens, outras cosmologias. Dependendo do contexto, um peão pode se converter em pedra angular”.

[12] CAPELATO, Maria Helena Rolim; DUTRA, Eliana Regina de Freitas. Representação Política. O reconhecimento de um conceito na historiografia brasileira. In: Representações - Contribuição a um debate transdisciplinar. Campinas: Papirus, 2000, p. 251.    

[13] CHARTIER, Roger. Defesa e ilustração da noção de representação. FRONTEIRAS: Revista de História, v. 13, n. 24, 2012, p. 25.

[14] Ibidem, p. 25. Chartier enfatiza a importância de considerar o discurso histórico como representação e também “uma explicação adequada da realidade que aconteceu” (2011, p. 25), dando um caráter emancipador à História em relação a memória, pois, a História aplica suas técnicas pertinentes para transformar a memória em uma representação palatável e entendível a quem a lê e a estuda.

[15] GRINBERG, Piedade Epstein. Lucílio de Albuquerque na arte brasileira. 19&20, Rio de Janeiro, v. III, n. 3, jul. 2008. Disponível em: http://www.dezenovevinte.net/artistas/la_peg.htm

[16] SIMIONI, Ana Paula Cavalcanti. A viagem a Paris de artistas brasileiros no final do século XIX. Tempo Social, revista de sociologia da USP, v. 17, n. 1, 2005, p. 354.

[17] A Revista Renascença - revista mensal de letra, sciencias e artes foi publicada entre os anos de 1904 e 1908 no Rio de Janeiro, com a direção de Rodrigo Octavio e Henrique Bernardelli.

[18] VIANNA, VICTOR. Escola de Bellas Artes - Os Premios de Viagem. Revista Renascença, p. 177-179, 1906.

[19] GRINBERG, op. cit..

[20] SÁ, Ivan Coelho de. O Processo de “Desacademização” através dos Estudos de Modelo Vivo na Academia/Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro. 19&20, Rio de Janeiro, v. IV, n. 3, jul. 2009. Disponível em: http://www.dezenovevinte.net/ensino_artistico/ea_ivan.htm O autor diferencia o caso do Brasil se comparado a Europa no que diz respeito a predominância da estética clássico acadêmica, onde, para o mesmo, o processo de “desademicização” da arte brasileira passaria pela necessidade de um desvencilhamento dos modelos europeus intrínsecos que perpassa por questões de um reconhecimento da existência de uma identidade brasileira. O ideal de academicismo brasileiro reproduzido pelos artistas estava ligado aos moldes artísticos europeus, relacionava-se a admiração sobre o Velho Mundo e aos padrões presentes no Classicismo, além dos ideais eurocêntricos de perfectibilidade. Dessa forma, essa negação da história sociocultural brasileira convergia em um reflexo do classicismo grego sobre as obras da história da ENBA, não levando em conta a sociedade e cultura presentes no Brasil. Portanto, como visto por Sá, a academização no campo das Artes no Brasil se dera calcada na ideia de perfeccionismo europeu, excluindo, na maioria dos casos, a verdadeira face do Brasil miscigenado que emergia naquele momento. O autor ainda destaca que a efetivação das ideias ligadas a “desacademicização” - trazendo em suas produções a identidade brasileira, sua sociedade e cultura - foram propriamente estabelecidas na arte brasileira a partir da década de 1920, com os movimentos modernistas.

[21] Idem.

[22] AMANCIO, Kleber Antonio de Oliveira. Reflexões sobre a pintura de Arthur Timotheo da Costa. 2016. Tese (Doutorado em História Social) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2016, p. 33-38.

[23] VALLE, Arthur. Artur Timótheo da Costa, Jornal Rio Informa, Rio de Janeiro, 1 fev. 2004, p. 8

[24] CHALHOUB, Sidney. Visões da liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2011, p. 35.

[25] JOLY, op. cit., p. 35. “É relevante observar que a maioria esmagadora das entradas de escravizados no último período, 1826-50, mais o número residual da década de 1850, destinou-se à região do atual Sudeste e ocorreu quando tratados internacionais e legislação nacional haviam tornado ilegal o tráfico negreiro”.

[26] PEREIRA, Bergman de Paula. De escravas a empregadas domésticas - A dimensão social e o “lugar” das mulheres negras no pós-abolição. XXVI Simpósio Nacional de História ANPUH, v. 50, 2011, p. 2. No que concerne ao papel das mulheres no ambiente doméstico, segundo Pereira, “os afazeres domésticos e o cuidar dos filhos das sinhás, foi um forte condicionante privado de estruturação patriarcal e hierárquica, durante o período de escravidão, a regulação das relações entre senhoras e escravas, pautava-se no modelo de dominação de classes, definido por padrões de superioridade e inferioridade, a negra escrava mesmo sendo considerada inferior, foi quem amamentou os filhos de suas senhoras” (Ibidem, p.2).

[27] RIOS, Ana Maria; MATTOS, Hebe Maria. O pós-abolição como problema histórico: balanços e perspectivas. Topoi (Rio de Janeiro), v. 5, n. 8, 2004, p. 179.

[28] PEREIRA, op. cit., p. 3.

[29] CARULA, Karoline. Perigosas amas de leite: aleitamento materno, ciência e escravidão em A Mãi de Família. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, v. 19, 2012.

[30] SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1993, p. 43.

[31] Idem.

[32] NAXARA, Márcia. Estrangeiro em sua própria terra: representações do trabalhador nacional, 1870-1920. Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Campinas, SP, 1991, p. 2-15.

[33] Ibidem, p. 8. 

[34] Ibidem, p. 45. 

[35] PEREIRA, Túlio Henrique. Culturas e hibridismo na imagem de brasileiros: Valores epidérmicos, identidades e hierarquias nas artes da Primeira República. 19&20, Rio de Janeiro, v. VIII, n. 1, jan./jun. 2013. Disponível em: http://www.dezenovevinte.net/criticas/thp.htm

[36] CHRISTO, Maraliz de Castro Vieira. Algo além do moderno: a mulher negra na pintura brasileira no início do século XX. 19&20, Rio de Janeiro, v. IV, n. 2, abr. 2009. Disponível em: http://www.dezenovevinte.net/obras/obras_maraliz.htm 

[37] AMADOR, Bueno. BELAS-ARTES. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 22 set. 1912, p. 5.  

[38] BELLAS ARTES. O "Salon" de Setembro. A Noite, Rio de Janeiro, 18 jul. 1912, p. 2.

[39]  SOUZA, Vanderlei Sebastião de; SANTOS, Ricardo Ventura. O Congresso Universal de Raças, Londres, 1911: contextos, temas e debates. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, v. 7, n. 3, p. 745-760, set.-dez. 2012. Exemplo da dimensão e importância desses discursos no mundo podem ser analisados através deste artigo de Souza e Santos, que traz um estudo rico em informações a visão mundial acerca da miscigenação e suas consequências na concepção da época. Essas preocupações deram origem ao Congresso Universal de Raças que aconteceu em Londres, em 1911. O Congresso apresentava os interesses em voga dos países imperialistas no que dizia respeito a miscigenação, os aspectos físicos diferenciados entre as etnias e de que forma tais características influenciavam no comportamento dos indivíduos. Dentre os homens da ciência que participaram do evento, encontravam-se dois brasileiros: Roquette Pinto (1884-1954) e João Baptista de Lacerda (1846-1915) que trouxeram às discussões a miscigenação acentuada no Brasil, advinda desde a chegada dos portugueses e seu contato com os indígenas até aquele momento. 

[40] FREYRE, Gilberto. Casa-grande & senzala: formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal / apresentação de Fernando Henrique Cardoso - 46º ed. rev. - São Paulo: Global, 2003 - (Introdução à história da sociedade patriarcal no Brasil; 1), p. 435-436.

[41] DEIAB, Rafaela de Andrade. A mãe-preta na literatura brasileira: a ambigüidade como construção social (1880-1950). 2006. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006.

[42]  FERNANDES, Florestan. A integração do negro na sociedade de classes (1º vol.). São Paulo: Globo, 2008.

[43] GIACOMINI, Sonia Maria. Mulher e escrava: uma introdução histórica ao estudo da mulher negra no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1988, p. 19.

[44] CARULA, op. cit.

[45] COSTA, Carlos. Mãi Preta. A Mãi de Familia, Rio de Janeiro, ano 10, n. 21, nov. 1888, p. 166-167

[46] MARTINS, Bárbara Canedo Ruiz. Amas-de-leite e mercado de trabalho feminino: descortinando práticas e sujeitos (Rio de Janeiro, 1830-1890). 2006. Tese de Doutorado. Dissertação (Mestrado em História) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2006, p.143.

[47] DEIAB, op. cit., p.7.

[48] CARULA, op. cit., p.198.

[49] Ibidem, p. 201.

[50] Ibidem, p. 212.

[51]  SLENES, Robert W.; FARIA, Sheila de Castro. Família escrava e trabalho. Revista Tempo, v. 3, n. 6, p. 1-7, 1998. No artigo, Slenes e Faria fazem um panorama da historiografia anterior a década de 1970 no que diz respeito à fala dos historiadores sobre a formação da família escravizada no Brasil. “Nas décadas de 1950 e 1960, tanto a historiografia brasileira quanto a norte-americana formulavam em primeiro plano, nas discussões, a questão relativa ao caráter e às consequências da escravidão. No Brasil, Florestan Fernandes e Roger Bastide expressaram o consenso sobre o assunto de forma mais clara. Por razões demográficas (o excesso de homens sobre mulheres no tráfico africano) e como resultado de uma política senhorial de (nas palavras de Fernandes) ‘tolher e solapar’ todas as formas de solidariedade entre os cativos, a ‘família’ escrava - não apenas a ‘linhagem’, mas também a família conjugal/nuclear, com o pai ‘presente’ na vida dos filhos - praticamente inexistiu. ‘Perdidos uns para os outros’, sem laços sociais para recriar sua cultura e identidade, os escravos eram reduzidos a ‘condições anômicas de existência’. Como resultado (segundo Bastide), eles internalizavam as normas brancas, chegando subconscientemente a identificar seu senhor como ‘pai’; mais sério ainda (Fernandes), eles não tinham condições de participar do processo da ‘Revolução Burguesa’ no Brasil como agentes sociais de relevo, como fizeram os imigrantes e uma fração dos fazendeiros do oeste paulista. Finalmente (Fernandes), eles não puderam enfrentar com sucesso a concorrência dos imigrantes, depois da abolição, por não desfrutarem das instituições de ajuda mútua e dos valores favoráveis à mobilidade que a família propiciava” (SLENES, FARIA, 1998, p. 1).

[52] FLORENTINO, M. e GÓES, J.R. A Paz das senzalas: famílias escravas e tráfico atlântico, Rio de Janeiro, 1790-1850. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1997.

[53] QUEIROZ, Suely Robles Reis de. Escravidão Negra em São Paulo. Rio de Janeiro: Jose Olympio, 1977. e ______. Escravidão negra em debate. In: FREITAS, Marcos Cezar de. (org). Historiografia Brasileira em Perspectiva. São Paulo: Contexto, 1998, p.114.

[54] SLENES, Robert W. Na senzala, uma flor: esperanças e recordações na formação da família escrava: Brasil Sudeste, século XIX. Editora Nova Fronteira, 1999, p.41.

[55] Idem.

[56] MATTOS, Hebe Maria. Das cores do silêncio. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1998.