Panorama do ensino de desenho, expressão e representação gráfica no ensino superior de Arquitetura e Urbanismo

Ana Paula Ribeiro de Araujo

ARAUJO, Ana Paula Ribeiro de. Panorama do ensino de desenho, expressão e representação gráfica no ensino superior de Arquitetura e Urbanismo. 19&20, Rio de Janeiro, v. XIV, n. 1, jan.-jun. 2019. https://www.doi.org/10.52913/19e20.XIV1.02   

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Nunca se cogitou de dar aos próprios alunos a noção da utilidade dos estudos feitos; de chamar sua atenção para a finalidade de cada matéria;

de ensinar a pensar e, por consequência, a discernir.

Adolfo Morales de los Rios Filho (1955, p. 13)

              1.        Este artigo apresenta um panorama histórico do processo de ensino de desenho, expressão e representação gráfica da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro - FAU-UFRJ. Identifica as principais referências que influenciaram o ensino e as mudanças na prática de desenho, expressão e representação ocorridas nos currículos e nas disciplinas.

              2.        A perspectiva histórica tem o papel de auxiliar no posicionamento crítico, uma vez que a educação é “uma prática fundamentada na existência histórico-cultural dos homens” (SEVERINO apud GADOTTI, 2007, p. 12). A compreensão das mudanças ocorridas não é uma mera apresentação de fatos, mas fruto da reflexão construída através do resgate da unidade entre história e sujeito para auxílio à crítica sobre os problemas educacionais que enfrentamos atualmente, como, por exemplo, a questão da avaliação.

              3.        O capítulo foi estruturado partindo da implantação do ensino de belas-artes no Brasil seguindo cronologicamente as mudanças que impactaram na formação do arquiteto-urbanista. Foram observadas as mudanças curriculares, já que o currículo é uma construção em processo a partir da coexistência de diversas racionalidades (SANTOS, 2003, p. 121). A leitura das mudanças curriculares foi acompanhada pela compreensão das ideias pedagógicas que predominavam no cenário do ensino em geral e, que, provavelmente influenciaram no ensino e no Curso de Arquitetura e Urbanismo da FAU-UFRJ.

              4.        O panorama histórico de ensino do desenho, expressão e representação gráfica foi estruturado em três momentos: o primeiro, quando lecionado no âmbito do ensino militar e de engenharia; o segundo, quando foi instaurado o ensino artístico; e o terceiro, quando a arquitetura passou a ser autônoma em relação aos cursos de belas-artes e de engenharia.

              5.        A primeira seção, 1500-1822, caracteriza o perfil da sociedade brasileira e a formação de profissionais da construção e artífices que deveriam servir para construções militares e civis. A segunda, 1800-1822, apresenta as bases que fundamentaram o ensino de Arquitetura no Brasil no âmbito do regime imperial. A terceira, 1824-1945, focaliza a formação de arquitetos na Escola de Belas-Artes que tinha, no ensino de desenho (incluindo a expressão e representação gráfica), as bases para a formação artístico-estilística. Esse período é marcado pelo embate entre formação artística e técnica.

              6.        Na quarta seção, com a dissociação do ensino de arquitetura do de belas-artes, a formação de arquitetos-urbanistas passou a ter um enfoque mais tecnicista. A partir de 1945, as mudanças no currículo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro - FAU-UFRJ significaram a redução do ensino de desenho, expressão e representação gráfica na formação do arquiteto.

              7.        A última seção apresenta o histórico do ensino de arquitetura e urbanismo até os dias atuais. As sucessivas reformas evidenciaram a redução significativa do ensino de desenho, ficando ainda mais destacado do ensino de projeto. A implementação do sistema de créditos e da estrutura organizacional pela reforma de 1968 contribuiu para a compartimentação do conhecimento. O reforço no ensino de desenho técnico e do detalhamento significaram, dentre as demais mudanças, um caminho para defender a autonomia profissional.

              8.        O ensino de geometria descritiva, perspectiva e desenho de arquitetura (técnico) foi mantido na formação e passou a ser acompanhado de novas disciplinas que introduziram o treinamento de ferramentas gráficas digitais. As reformas (1996 e 2006) que se sucederam a partir das Diretrizes Curriculares de 1994 significaram a transição entre o sistema de desenho tradicional (técnicas e instrumentos manuais) e a elaboração de projetos com ferramentas digitais (concepção, desenvolvimento, representação e a comunicação do arquiteto).

              9.        Especificamente, a última reforma curricular implementou mudanças com o intuito de integrar o desenho-representação-expressão com as disciplinas de projeto, e destacou a importância da expressão e representação gráfica na apresentação dos projetos (comunicação).

            10.        Experiências relatadas de outros cursos de arquitetura e urbanismo no Estado do Rio de Janeiro demonstraram que o ensino de desenho-expressão-representação continua relevante na formação do arquiteto contemporâneo.

            11.        Foram utilizadas diferentes fontes: decretos, atas de Conselho Escolar, documentos internos dos Cursos de Arquitetura e Urbanismo (ENBA, FNA, FAU-UFRJ) como fontes diretas da realidade. Também colaboraram para a pesquisa, bibliografias específicas sobre o ensino de desenho escritas por Adolfo Morales de los Rios Filho (1955), Lúcio Costa (1940) e outros arquitetos.

            12.        Compreendemos que a escassez de bibliografias, de relatos de procedimentos didáticos e de críticas sobre a expressão gráfica do projeto reforçou a ideia de que os atributos do objeto de estudo somente poderão ser explicitados por meio do estabelecimento de um método analítico que considere o conteúdo (informações sobre o projeto) e a forma (características dos elementos gráficos e de sua organização). Desenvolvemos nossa reflexão em nossa tese de doutorado: no capítulo 3, apresentamos o método de análise para, nos capítulos 4, 5 e 6, apresentar os resultados das análises da expressão gráfica de Trabalhos Finais de Graduação. No último capítulo da tese, apresentamos o perfil que caracteriza a expressão gráfica das amostras para a sugestão de critérios de avaliação.  

O ensino na Academia Imperial de Belas-Artes (AIBA)

            13.        Antes da instalação de um curso de arquitetura no Brasil, os profissionais da construção eram submetidos aos ensinamentos das aulas de fortificações (decretadas em 1696) de caráter militar e, na sociedade civil, pelas corporações de ofícios. Como colônia, o ensino fora transplantado da metrópole tomando como referência a Aula de Fortificação e Arquitetura Militar (1647) de Lisboa.

            14.        No âmbito militar, o ensino de desenho e geometria era voltado para a formação de engenheiros[8] responsáveis pela construção de fortificações e edifícios administrativos. As escolas, concentradas no Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco, eram frequentadas por civis interessados em aprender o ofício da construção. A estrutura deste ensino se manteve inalterada e, somente em 1874, esta passa a ter uma administração civil com o nome de Escola Politécnica, assumindo os moldes franceses.[9]

            15.        Somente com a oficialização do ensino artístico, a partir da fundação da Real Escola de Ciências, Artes e Ofícios em 1816 no Rio de Janeiro, o governo passou a buscar meios de formar burocratas que atendessem tanto à demanda do clero e da nobreza, como da emergente burguesia de comerciantes. Como o ensino artístico-acadêmico era recente em Portugal (surgiu no início do século XIX), não havia o interesse em adotá-lo como referência para a implantação do ensino de arquitetura no Brasil. Nesta época, o modelo de ensino francês era referência para vários países europeus e para os Estados Unidos da América e, portanto, o ensino artístico instaurado no Brasil em 1824 busca referência no modelo francês de ensino da École des Beaux-Arts da era napoleônica.[10]

            16.        A École des Beaux-Arts (1806), como instituição oficial, tinha o papel de afirmar o status e o poder através de um academicismo conservador que poderia ser observado nos monumentos comemorativos. O ensino na École tinha o papel de manter a “ordem” e disseminar o “bom gosto”[11] para que a formação tivesse um espírito nacionalista. Sendo assim, este modelo interessava ao governo imperial brasileiro, recém-independente, por seu forte apelo político.

            17.        Este tipo de formação baseava-se na disseminação de um tipo de conhecimento estabelecido como universal que seria capaz de doutrinar os alunos a projetar segundo o modelo estilístico clássico desejado pelo poder político. O desenho era utilizado como ferramenta de doutrinação ao estilo clássico e se realizava através da cópia de desenhos de edifícios clássicos renascentistas.

            18.        Existindo dois tipos de formação, a de arquitetos-engenheiros[12] e a de arquitetos-artistas, torna-se necessário compreender com mais profundidade as divergências (GRAEFF, 1995) e similitudes.[13] Isto porque o século XIX foi palco das discussões sobre arte e técnica no âmbito acadêmico.

            19.        A separação entre arte e técnica no ensino oficial é evidenciada pela diferenciação entre os conteúdos ensinados na formação dos arquitetos-artistas e arquitetos-engenheiros. A arquitetura, no âmbito do ensino artístico, tinha o papel de legitimar a ascensão social da burguesia e, para tal, a formação na Academia[14] contrapunha-se à produção dos artesãos.

            20.        Os embates entre ensino artístico e técnico ainda perduraram, mas somente após 1859 são abertos centros de formação de engenheiros e arquitetos, tanto na Europa como no Brasil. Isto representou uma tentativa de reunir o ensino científico e técnico ao artístico. Como afirma Monedero (2003), o modelo Beaux-Arts era utilizado como principal referência para o ensino de arquitetura, apesar de ser considerado decadente pelos politécnicos na França naquela época, pois os engenheiros consideravam este ensino conservador frente ao avanço das ciências. 

O ensino artístico no Brasil: de Debret à Escola Nacional de Belas-Artes

            21.        A história do ensino de arquitetura no Brasil começa em 1816 como uma única cadeira da Escola Real das Ciências, Artes e Ofícios. Pelo Decreto de 23 de novembro de 1820, estabelece-se a Real Academia de Desenho, Pintura, Esculptura e Architectura Civil e iniciam-se as aulas de architectura.

            22.        Em 1824, uma equipe liderada pelo pintor Jean-Baptiste Debret, membro da chamada Missão Artística Francesa, estruturou o ensino da Academia de Bellas-Artes[15]  que, em 1826, passou a ser liderada pelo arquiteto Grandjean de Montigny.[16] Na proposta de Debret,[17] os conteúdos do curso de Architectura deveriam abordar o desenho e sua aplicação prática e a teoria geral. A Real Escola não entrou em funcionamento, mas em 1826, os membros da Missão Francesa assumem as cátedras da recém instaurada Academia Imperial de Belas-Artes.

            23.        No Plano de Debret, podemos observar a separação entre a formação de artistas e técnicos: o ensino artístico, comum nos cursos de Desenho, Pintura, Esculptura e Architectura Civil; o ensino técnico direcionado ao aprimoramento dos ofícios no curso de Mechanica para a formação de gravadores, abridores de metais, ourives, marceneiros, pedreiros etc. (DEBRET, 1827 p. 19).

            24.        Em termos de desenho[18] de arquitetura, a planta era a origem de um bom projeto. A implantação num terreno era uma das “chaves fundamentais para avaliar a qualidade de uma ideia arquitetônica” (SAINZ, 2005, p. 125). Para Debret, a planta deveria satisfazer os requisitos do programa, a elevação expressaria a estética clássica e o detalhe do ornato, a riqueza:

            25.                                 1º do plano, que distingue-se por huma distribuição geral symetrica, que deve preencher todas as condições requisitadas pelo Programma; 2º da Elevação, cujo caracter he tirado das proporções; e 3º finalmente do Ornato, não só exterior, como também interior, que he, por assim dizer, tudo o que pode embellecer por meio da sculptura, tanto em gosto, como em riqueza. (DEBRET, 1827, p. 18)

            26.        Um exemplo do desenho acadêmico nessa linha pode ser observado na Figura 1, Figura 2, Figura 3 e Figura 4, a representação gráfica do projeto de uma estação de ferro elaborado por Adolfo Morales de los Rios (pai) para o Concurso de Arquitetura da 2ª série referente à disciplina “Composição de architectura” em dezembro de 1912.

            27.        Mais antigos são os desenhos de arquitetura feitos por Charles de Wailly[19] para o projeto do Teatro Odéon de Paris[20] [Figura 5, Figura 6, Figura 7, Figura 8 e Figura 9], o quais é possível constatar que tanto as vistas ortográficas como a perspectiva eram utilizadas para a representação gráfica de projetos de arquitetura. Nos desenhos de Wailly, a planta da distribuição interna e a implantação apresentam um desenho simples, mas preciso devido ao uso do desenho geométrico e dos métodos das projeções ortogonais. A fachada [Figura 7], a seção [Figura 8], a seção perspectivada [Figura 9], além de representarem os ornamentos e os elementos estruturais com riqueza de detalhes, utilizam as sombras para realçar a leitura dos volumes. Destacamos também neste conjunto de desenhos a presença da figura humana em movimento, o que valoriza a representação do projeto. Além disso, isso possibilita a compreensão da escala e o uso da edificação.

            28.        Na segunda metade do século XIX, como consequência da filosofia de Augusto Comte, havia uma tendência nas artes plásticas de se retratar fielmente a realidade, sem idealizações e distorções. No entanto, como observado na Figura 7, Figura 8 e Figura 9, a representação de luzes e sombras é um contraponto aos demais elementos arquitetônicos representados, pois não retrata uma situação real devido ao fato da iluminação estar sendo representada no interior da edificação.

            29.        As técnicas de desenho e pintura, utilizadas tanto por pintores, escultores como arquitetos da época, imprimiam ao desenho de arquitetura características peculiares do desenhista [Figura 9]. Combinada a estas técnicas, a escolha do ponto de vista para a elaboração das perspectivas era feita, em alguns casos, com o intuito de reforçar a forma da arquitetura projetada dando maior importância, por exemplo, à fachada principal [Figura 7].

            30.        Quanto ao que deveria ser representado, o programa do Curso de Architectura, exigia que os alunos demonstrassem em seus desenhos de projeto todos os detalhes possíveis: “detalhes de construção geral, corte de madeiras, e o de pedras, ou a arte de aparelhar estes objetos, bem como os diferentes sistemas de construção de alicerces, etc.” (DEBRET, 1827, p. 18)

            31.        A importância do desenho na formação do arquiteto pode ser evidenciada na estrutura curricular formalizada a partir do Decreto de 1831. Nesta época, era obrigatória a frequência em aulas de geometria elementar, na Academia Militar,[21] e aprovação nas aulas de desenho linear, de desenho de figuras e de geometria descritiva para ser admitido na Escola.

            32.        Mesmo conhecendo as exigências de representação dos projetos acadêmicos, é importante destacar que não foi possível verificar, nos documentos pesquisados, as categorias e os critérios de julgamento utilizados pelos professores. Isto porque, as avaliações ocorriam em sessão pública, mas o julgamento era realizado através de voto secreto.

            33.        A reforma curricular do Curso de Architectura em 1855[22] buscava adaptar a instituição aos progressos técnicos de meados do século XIX. Esta reforma reforçou o ensino de desenho com o aumento do número de disciplinas para três. O ensino de matemática (Mathematicas aplicadas) embasava os trabalhos práticos em geometria, desenho, estereotomia e perspectiva. Os problemas formais eram resolvidos cientificamente, isto é, com o auxílio da geometria descritiva.[23]

            34.        Desta maneira, o ensino da geometria descritiva conferia aos projetos maior rigor na representação das dimensões dos elementos construtivos. Com uma representação tecnicamente mais exata, pretendiam que os projetos facilitassem o processo construtivo, e atendessem às inovações nas técnicas de construção.[24]

O ensino na Escola Nacional de Belas-Artes (ENBA) e suas reformas (1890, 1901, 1911, 1915, 1925 e 1931)

            35.        Desde o período colonial e até depois da Independência do Brasil, a educação teve importância secundária (TEIXEIRA, 2005). A nação, ainda colônia, estava acostumada a reproduzir as referências externas. Se na Europa a universidade moderna (dedicada à ciência, inclusive a filosofia) já era realidade, no Brasil a discussão da educação como problema fundamental para a formação de uma cultura nacional aparece apenas nos Pareceres de Rui Barbosa, em 1882.

            36.        Mesmo com a proclamação da República (1889), o sistema de ensino resiste às mudanças. A reprodução de modelos europeus de ensino pode ser caracterizada pela adoção de apostilas que resumiam o conhecimento contido em livros importados e pelo preenchimento das vagas dos professores por alunos escolhidos dentre os pensionistas que retornavam da Europa. Teixeira (2005) assinala que a importação de conhecimentos era reflexo de um sentimento de incapacidade de se implantar uma cultura própria.

            37.        A Reforma Benjamin Constant, em 1890,[25] veio reforçar o ensino de desenho, pela criação de “novas” disciplinas, fruto do desmembramento das existentes. A nova organização curricular foi justificada[26] para satisfazer a necessidade de incluir diferentes conteúdos do desenho, considerado imprescindível para o ensino de todas as artes.

            38.        Na principal cátedra do Curso de Arquitetura, a cadeira de Desenho de architectura, trabalhos práticos. Plantas e projectos,[27] exigia-se que os alunos apresentassem seus projetos incluindo informações sobre o orçamento e memória justificativa em conjunto com os desenhos da situação, da planta, da perspectiva e do corte do edifício principal considerando as dimensões mínimas exigidas.[28]

            39.        Com o Decreto de 1901,[29] o currículo sofreu pequenas alterações, principalmente quanto ao ensino de desenho, mas manteve praticamente inalterado seu programa.

            40.        Em termos de exigências quanto à representação do projeto, há apenas um registro[30] que estabelece os conteúdos dos projetos: os desenhos das plantas, cortes e fachadas deveriam estar acompanhados da representação de detalhes de construção. Além do orçamento e do memorial justificativo, deveria ser apresentada uma descrição do modo de construção do projeto obedecendo-se os programas preestabelecidos pelo professor no início das aulas.

            41.        A Reforma Rivadávia Correa (1911)[31] também não imprimiu mudanças significativas no ensino de desenho e representação para o Curso de Arquitetura. No entanto, nota-se, comparando os dois Regulamentos (1891 a 1911 e 1911 a 1914), um aumento significativo da carga horária de geometria descritiva e de composições.[32]

            42.        Com o Decreto no. 14.343 de 07/09/1920,[33] foi criada a Universidade do Rio de Janeiro, composta pelas Escola Polytechnica, Faculdade de Medicina e Faculdade de Direito do Rio de Janeiro, executando o que estava disposto no Decreto 11.530 de 18 de março de 1915.

            43.        A Reforma de 1925, última antes da Revolução de 1930, instituiu que parte dos conhecimentos de desenho ficasse a cargo do ensino secundário. No quinto ano do ensino secundário, o desenho era especialmente dedicado aos alunos que desejassem seguir os cursos superiores, como no caso das belas-artes e de engenharias.

            44.        Do período de 1916 a 1930, a organização do Curso sofreu pequenas alterações. Entretanto, o fato de a partir de 1916 a Congregação não mais transcrever os programas das aulas e provas nas Atas da Congregação impossibilitou comparar os programas das disciplinas.

            45.        Quando o arquiteto Lúcio Costa assume a direção da Escola de Belas-Artes, entre 1930 e 1931, tenta implementar uma reforma curricular com o intuito de introduzir o repertório do movimento moderno no ensino da escola. Isto significava legitimar a posição do arquiteto através da articulação entre conhecimento técnico e científico, assim como ocorria na escola Bauhaus. Esta mudança curricular veio a se concretizar em meados dos anos 1940, quando a arquitetura moderna brasileira já tinha conquistado espaço na produção arquitetônica nacional. Este currículo foi importante pelo fato de ter se tornado modelo para a implantação de novos cursos de arquitetura naquela década.

            46.        Na Reforma Francisco Campos (Decreto 19.852 de 11/04/1931) o curso de Arquitetura se torna autônomo do de pintura e escultura. Inicia um processo de busca por autonomia que viria a se efetivar em 1945 com a criação da Faculdade Nacional de Arquitetura. Esta reforma foi a primeira a colocar a universidade como modelo para o desenvolvimento do ensino superior.[34]

            47.        Para ingressar no Curso de Arquitetura, continuou a ser exigido que o candidato prestasse exames com conhecimentos de desenho geométrico e de desenho figurado. A cadeira de Desenho (dividida em duas partes) continuou a ser oferecida para os alunos de arquitetura, de Pintura e Escultura, mas com orientações diferenciadas. Permaneceram os concursos para a cadeira de composição e para o concurso final.[35]

            48.        Nesse momento, houve uma inversão de sentido. Enquanto as reformas anteriores ampliaram o número e a carga horária das disciplinas de desenho, a reforma de 1931 (que perdurou até 1968), diminuiu de nove para cinco o número de cadeiras de desenho. Isto significou o agrupamento dos conteúdos de perspectiva, sombras e estereotomia em uma única disciplina.

            49.        A gestão do arquiteto Lúcio Costa na direção da escola teve um papel importante na história do curso e do ensino de arquitetura. Sua proposta de reforma curricular significou a separação em definitivo do Curso de Arquitetura dos cursos de Belas-Artes (Decreto 7.918 de 31/08/1945). Estas mudanças representaram, para o ensino de desenho, a supressão do desenho figurado e a criação da disciplina de detalhamento. Ou seja, o ensino artístico foi reduzido em sua importância para que fosse reforçado o ensino técnico, que significava uma estratégia de defesa da profissão[36].

            50.        No final da primeira Presidência da República de Getúlio Vargas, em 1945, o sistema de ensino superior dava sinais da expansão que ocorreria com mais vigor a partir de 1968. Até o final do chamado Estado Novo, em 1945 (1937-1945), surgem alguns cursos de Arquitetura e Urbanismo no país, muitos deles reformulações de cursos de arquitetura já existentes: Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Minas Gerais (1930)[37] e Faculdade Nacional de Arquitetura (1945). Em seguida, são criados os cursos de Arquitetura do Instituto Mackenzie (1948)[38] e da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (1948).[39] 

A Faculdade Nacional de Arquitetura (FNA)

            51.        Criada pela Lei 452 de 5/07/1937 em 1945 (Decreto 7918 de 31/08/1945), a Escola Nacional de Arquitetura passa a ser chamada de Faculdade Nacional de Arquitetura em 1945. Mesmo tornando-se faculdade, e dissociando-se em definitivo da Escola de Belas-Artes, a grade curricular permaneceu, basicamente, com a mesma organização de 1931 até 1968.

            52.        O professor William Bittar resume as mudanças neste período e observa que o ensino passa a ter um enfoque mais tecnicista a partir de 1945:

            53.                                 Há 60 anos atrás, o curso de arquitetura era da Escola de Belas Artes, com grande enfoque na orientação artística da profissão. As reformas curriculares ocorridas em 1945 mudaram esse quadro, visando à formação de profissionais ligados a todas as etapas da construção, e culminaram na implementação de um ensino tecnicista defendido pela Lei de Diretrizes e Bases de 1968. (FERREIRA, 2005).

            54.        Para aprofundar a questão dos conhecimentos e práticas do ensino de desenho no Curso de Arquitetura da FAU-UFRJ, entre 1945 e 1968, foi necessário ir além das observações realizadas com base nas grades curriculares, ementas e programas das disciplinas de desenho. Assim, face à escassez de relatos e críticas, realizado pelo corpo docente e discente daquela época, são apresentadas a seguir as contribuições disponíveis de um ex-aluno (Edgar Saldanha da Gama e Silva)[40] e de dois ex-professores (Lúcio Costa e Adolfo Morales de los Rios Filho) que são específicas para o ensino de desenho.  

            55.        Edgar Saldanha da Gama e Silva defendia a importância do desenho artístico para o arquiteto alegando que “quanto mais expressiva for esta linguagem [gráfica], maior força, maior vida dará à ideia que expressa.” Para ser expressiva, Silva (1949) considerava que a linguagem gráfica devia ser correta, harmoniosa e precisa para que a linguagem gráfica tivesse maior poder de sedução e demonstrasse capricho.

            56.        Para Silva (1949, p. 23), a expressão gráfica arquitetônica deveria ser a “imagem real daquilo que representa.” Isto é, a expressão não necessariamente dizia respeito às emoções do autor, nem tinha o sentido da originalidade. Os desenhos de arquitetura (perspectivas de edifícios, interiores, detalhes artísticos, cenas de arquitetura paisagística etc.) seguiam as proporções reais e deveriam apresentar uma “valorização dos planos na representação dos objetos; efeitos devidos à orientação, às cores e à distância do observador ao objeto”.

            57.        Isso significa que a reprodução dos claros e escuros e das sombras provenientes da incidência dos raios solares (a 45°) e a representação das diferentes distâncias do observador aos objetos representados (primeiro, segundo planos), eram recursos gráficos necessários para a valorização da expressão gráfica, mas não representavam componentes que interagem na qualidade arquitetônica.

            58.        Silva (1949) fez críticas ao ensino de desenho porque entendia que este deveria incluir estudos sob o ponto de vista dinâmico. Justifica que o arquiteto deveria representar flagrantes de cenas da vida, não apenas com figuras humanas em posições estáticas ou não representativas das atividades que ocorreriam no espaço. O estudo da figura humana era - e continua sendo[41] - importante para o desenho do projeto. Sua representação “empresta a característica de vida ao ambiente” (GAMA E SILVA, 1949, p. 16), mas também possibilita visualizar a proporção entre homem e espaço.

            59.        Apesar de afirmar a necessidade de se representar o projeto o mais próximo possível da realidade, Silva (1949) admite que a figura humana poderia ser representada através de um desenho mais simplificado. A simplificação poderia até mesmo ser estilizada,[42] contanto que houvesse expressão de detalhes indispensáveis para a manifestação das atividades do espaço.

            60.        A crítica ao ensino do desenho figurado (que constou no currículo do curso até a Reforma de 1931) parece ter sido implementada nas mudanças curriculares ocorridas em 1945. O Desenho Figurado na reforma de 1931 foi extinto, passando a se chamar apenas Desenho. A reprodução da figura humana a partir de modelos artificiais (estátuas, bustos) foi reduzida.

            61.        Mesmo ampliando-se o repertório das técnicas de desenho e pintura, a cadeira de Desenho Artístico (1968) - sucessora do Desenho (1931) - sofreu cortes em sua carga horária. A redução foi justificada pelo fato de que o aluno deveria ingressar no curso com um bom nível de desenho e o curso deveria apenas aperfeiçoar as técnicas.

            62.        No entanto, a entrada de novos alunos com um bom embasamento em desenho parecia não ocorrer. Em 1952, Lúcio Costa publica um artigo em periódico nacional com críticas ao ensino do desenho no ensino secundário. Aponta para a dificuldade decorrente da falta ou inadequada preparação dos professores para o ensino de desenho e para a dificuldade dos professores em lidar com a contradição existente nos objetivos do ensino de desenho.

            63.        Segundo Lúcio Costa (1940), existem três objetivos distintos no ensino de desenho, que resultam em modalidades diferentes de ensino. Se o objetivo fosse o de desenvolver o hábito da observação, o espírito de análise e o gosto pela precisão deveria ser ensinado o desenho de observação. Se o objetivo fosse o de estimular a inteligência na concepção do que se pretendesse construir, deveria ser ensinado o desenho técnico. Se o objetivo fosse o de estimular o sentimento, a imaginação, deveria ser ensinado o desenho de criação.

            64.        Os três objetivos didáticos deveriam ser trabalhados no ensino fundamental a fim de que os alunos construíssem consciência sobre o que vinha a ser uma obra de arte além de “reavivar” as qualidades dos mais dotados (COSTA, 1940). Com a supressão de alguns conteúdos, como, por exemplo, o de desenho geométrico no ensino de Arquitetura e Urbanismo, Lúcio Costa declarou que o repertório dos arquitetos parecia ter empobrecido.

            65.        O ensino de desenho técnico não fazia parte dos conhecimentos do ensino secundário, mas foi oficialmente introduzido na grade curricular do Curso de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ, em 1931, com a disciplina de Sistemas e Detalhes de Construção. No entanto, é possível dizer que desde 1890 a antiga disciplina de Desenho Topográfico já incluía, em seu programa, noções de desenho técnico como: sistema de escala, sinais e convenções.[43]

            66.        Complementando as questões sobre o ensino do desenho de observação, desenho artístico e desenho técnico, Adolfo Morales de los Rios Filho[44] (1955) trouxe grande contribuição ao sistematizar teoricamente a arquitetura. Teve o papel de estabelecer, principalmente, as informações necessárias para os projetos arquitetônico-urbanísticos.

            67.        Relacionando desenho e projeto, Morales de los Rios Filho apresentou em sua teoria uma separação do projeto em três graus (ou classes) de acordo com o grau de definição ou detalhamento: o esboço, o anteprojeto e o projeto. O esboço (rascunho, esquício, estudo, croqui) consistia no trabalho gráfico preliminar, quase sempre à mão livre, na escala 1/200 por metro. Resultava da representação gráfica de uma combinação de elementos planimétricos, espaciais, estruturais e artísticos feitos a lápis por meio de projeções ortogonais. Os elementos estruturais deveriam ser representados desde o esboço. A disposição interna seria a denominação do esquema dos espaços internos representados pela planta.

            68.        Depois de representada a fachada, o aluno deveria elaborar uma perspectiva do tipo paralela, rápida e convencional, para que se pudesse ter noção do conjunto. Nesta perspectiva, eram desenhadas as linhas principais da massa construída, as linhas secundárias dos corpos salientes e reentrantes e a cobertura. No término da perspectiva, davam-lhe relevo, isto é, desenhavam as sombras próprias e projetadas (seguindo o posicionamento de Silva (1949)).

            69.        Este tipo de perspectiva tinha o objetivo de evitar dificuldades de leitura e compreensão dos aspectos do projeto por parte do cliente. A perspectiva representa quase tudo, mesmo com abstração dos detalhes, constitui “a ordenação gráfica do pensamento, a representação mecânica da concepção, uma síntese. Dos três desenhos preliminares - a planta, a elevação e a perspectiva (ligadas entre si pela unidade de espírito do arquiteto e pela unidade da composição) -, resultará a imagem integral da obra.” (MORALES DE LOS RIOS FILHO, 1955, p. 394)

            70.        O anteprojeto consistia num estudo mais pormenorizado da obra arquitetônica. A representação gráfica compunha-se de plantas, seções e fachadas necessárias à melhor compreensão da obra, executadas com o auxílio de instrumentos, em escala de 1/100 por metro. Por vezes, este conjunto de desenhos podia ser acompanhado de uma pequena perspectiva aquarelada. Eram considerados desenhos de luxo, ou de apresentação. As perspectivas aquareladas não faziam parte do projeto entregue ao cliente, a não ser quando combinado, como ressaltou Morales de los Rios Filho.

            71.        Ainda segundo Morales de los Rios Filho (1955), o plano ou projeto (considerados os desenhos exigidos pela Prefeitura para aprovação) deveria ser realizado após o anteprojeto e constituído da representação gráfica definitiva das projeções horizontais e verticais a ser apresentada no papel. As projeções ou elementos geométricos, chamados de peças gráficas, eram desenhados em escala reduzida. Subdividiam-se em seções teóricas e superfícies aparentes. As seções teóricas abrangiam as plantas (dos pavimentos,[45] de situação,[46] de distribuição,[47] estruturais[48] e especiais), as seções,[49] e as fachadas[50] ou elevações.

            72.        Morales de los Rios Filho ainda se refere aos desenhos feitos durante a execução como sendo de três classes: estudo, originais e definitivos. O estudo geralmente era feito em papel vegetal. Os originais eram feitos em papel Canson ou vegetal encorpado. Os definitivos eram desenhos calcados dos originais, cópias feitas a nanquim em papel-tela e eram entregues para aprovação de construção.

            73.        Os memoriais descritivo e justificativo deviam fazer parte do planejamento arquitetônico, mas deviam estar escritos em peças à parte. Eram divididos nas seguintes etapas: (1) descrição da obra;[51] (2) justificativa das soluções adotadas;[52] (3) avaliação das áreas projetadas;[53] (4) discriminação dos preceitos legais.[54] Como parte das peças escritas, deveria haver um caderno de encargos ou obrigações, que teria que conter as especificações técnicas dos materiais empregados, descrição dos serviços e orçamento para avaliação do custo da obra. 

A Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (FAU-UFRJ)

            74.        Desde 1961 instalada na Ilha do Fundão,[55] a Faculdade Nacional de Arquitetura passou a se chamar Faculdade de Arquitetura e Urbanismo[56] em 1965. Três anos mais tarde, em 1968,[57] o currículo do curso passou por uma reforma que impactou a organização do ensino. Esta reforma decorreu da Lei de Diretrizes e Bases de 1968, que estabelece, por meio de atos legislativos, o modelo de universidade da UNB idealizado por Anísio Teixeira,[58] e institui o sistema de créditos - que substitui o curso seriado e transformando sua estrutura anual em semestral.

            75.        Em decorrência da reforma de 1968 ocorrida numa estrutura universitária fragmentada, Anísio Teixeira apontou duas necessidades que deveriam ser atendidas. A primeira dizia respeito à mudança dos conteúdos ensinados, considerando a necessidade de se estar atualizado culturalmente. Ou seja, o conhecimento passou a não ser mais entendido como “universal.” A segunda necessidade dizia respeito à necessidade de mudança nos métodos de ensino que deveria romper com a tradição de se pensar no ensino como “enciclopédico” e, por conseguinte, não poderia ser “exposto por completo” ao aluno.

            76.        Para entender mais profundamente a reforma no ensino superior é necessário esclarecer as bases ideológicas que sustentaram a reforma. O aspecto doutrinário do projeto da LDB de 1968 foi idealizado pelo Grupo de Trabalho (GT) nomeado para o projeto de reforma. Como nos explica Saviani (2008), o GT assumiu como princípios gerais para a elaboração da LDB de 1968 a eficiência, a racionalidade e a produtividade.

            77.        Este projeto de reforma deveria atender às demandas do poder público - cujo governo militar se estabeleceu em 1964. A estes interessava que o ensino superior estivesse fortemente vinculado aos mecanismos do mercado e ao projeto de modernização que se alinhava com os termos do capitalismo internacional.

            78.        A aprendizagem parcelada em disciplinas é similar a uma linha de montagem fabril e pretendia “produzir” um profissional - ou produto - resultante do modo como o processo foi organizado. Consequentemente, não deveria haver espaço para subjetividades nem críticas para mudanças na ordem estabelecida.

            79.        A padronização do sistema de ensino compreendia o professor e o aluno como meros executores do processo, pois o processo deveria ser predeterminado por especialistas.[59] Esse tipo de concepção nos remete ao que, dez anos mais tarde, em 1974, se constituiu na Comissão de Especialistas do Ensino de Arquitetura e Urbanismo (CEAU),[60] atualmente extinta.

            80.        Comparando a grade curricular e os programas oficiais das disciplinas que vigoraram de 1968 a 1986, na FAU, com o currículo anterior parece que estes últimos sofreram poucas alterações. Isto porque o conhecimento continuou sendo oferecido por disciplinas cujos programas mantiveram a maioria dos conteúdos anteriormente ensinados.

            81.        A partir de 1968, havia seis disciplinas relacionadas ao ensino de desenho que continuaram distribuídas nos três primeiros semestres do curso de cinco anos. As principais mudanças no ensino de desenho foram: a separação do ensino de perspectiva e estereotomia da disciplina de geometria descritiva, a ampliação do ensino de técnicas de desenho e pintura no ensino de desenho arquitetônico.

            82.        Com a inclusão da disciplina Desenho Arquitetônico - técnicas de representação, foi aumentada a quantidade de técnicas de desenho que poderiam ser utilizadas. Além da técnica de aguada, o desenho a fusain para treinamento da observação, o desenho a lápis, desenho a nanquim, grafos e pincel, o bico de pena, o nanquim, a aquarela e o guache passaram a ser as técnicas aprendidas para a representação e expressão da arquitetura. Pela primeira vez, os programas se referiram à técnica de colagem como técnica para representação.

            83.        No entanto, a carga horária total para o ensino de desenho foi mantida, dando-se maior ênfase a determinados conteúdos. A carga horária para o ensino de geometria descritiva, sombras, perspectiva e estereotomia e arquitetura analítica foi dobrada enquanto a carga horária para o ensino de desenho artístico e arquitetônico foi reduzida pela metade.

            84.        Qualitativamente, como a disciplina de Desenho artístico incluía nos exercícios o desenho de edificações construídas, parece que a antiga prática de observação e reprodução de bustos de gesso, estatuetas, estátuas, para sensibilização quanto às proporções foi mantida apenas para os alunos das belas-artes. A adoção do objeto arquitetônico como referência para os exercícios de desenho indica que a nova disciplina se aproximou mais do conteúdo arquitetônico e que as críticas e sugestões apresentadas pelo ex-aluno Edgar Saldanha da Gama e Silva (1949) foram “ouvidas.”

            85.        A exemplo da disciplina precedente - Sistema e detalhes de construção -, a disciplina Desenho arquitetônico - técnicas de representação deu continuidade ao ensino das normas e convenções de desenho técnico. Cabe destacar que é neste período que o desenho técnico passou a ser uma das atividades profissionais do arquiteto.[61] Além disso, como dito anteriormente, desde 1947 já havia uma normatização oficial.

            86.        A ampliação do ensino de perspectiva, incluindo conteúdos novos como a associação da perspectiva com a fotografia, foi pontual nos programas oficiais de ensino de desenho, expressão e representação do curso. A introdução de noções de perspectiva cenográfica permaneceu nos programas oficiais até a mudança curricular ocorrida em 1998. Neste período, o ensino de Desenho geométrico, obrigatório no ensino fundamental desde 1931, passou a ser facultativo com a LDB de 1971. Também na década de 1970, as provas do vestibular para ingresso no Curso de Arquitetura deixaram de incluir questões sobre estes conhecimentos (ZUIN, 2002).

            87.        Antes mesmo das discussões acerca da qualidade do ensino, os professores e estudantes da Escola de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense (EAU-UFF) mobilizaram-se para discutir sobre a avaliação dos meios de expressão do projeto. Nesse momento, a escola, encontrando dificuldades de julgar trabalhos acadêmicos para participar do IX Congresso Brasileiro de Arquitetos e da Exposição de Estudantes em 1976, estabeleceu três questões-chave que evidenciam a relação entre projeto e expressão: quantidade e qualidade de informação; uso de meios de expressão; e sofisticação gráfica e estética.[62]

            88.        Somente em 1989, a Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura e Urbanismo (ABEA), fundada em 1973, inicia um processo de discussão para a implantação de uma política nacional para o estabelecimento de perfis e padrões para o ensino nacional. A busca da uma melhoria na qualificação do profissional arquiteto e urbanista foi justificada, uma vez que era necessário garantir uma formação “mínima.” Isto porque o ensino de arquitetura e urbanismo estava se expandido, principalmente com a criação de novos cursos por escolas particulares.

            89.        Colaborando significativamente com o Ministério da Educação (MEC), em específico com a Comissão de Especialistas de Ensino de Arquitetura e Urbanismo – (CEAU/SESu/MEC),[63] a ABEA participou da elaboração das Diretrizes Curriculares para os Cursos de Arquitetura Brasileiros.

            90.        Historicamente, o núcleo de conhecimentos de fundamentação de Desenho e meios de representação e expressão, denominação atual adotada nas Diretrizes Curriculares Nacionais de 2006,[64] nem sempre recebeu essa denominação. Era chamado de Desenho e plástica pelo currículo mínimo de 1962.[65] No Parecer no 384 de 1969, o desenho foi desmembrado da plástica passando a se denominar Desenho e outros meios de expressão, continuando a pertencer ao conjunto de matérias básicas. O estudo de desenho, como descrito no Parecer de 1969, abrangia o desenho artístico e outros meios de expressão, considerando todas as “modalidades cabíveis e úteis,” inclusive o desenho de arquitetura, a modelagem, o cálculo, a estética e a geometria descritiva.

            91.        Desde 1962, o governo busca orientar as instituições para que o ensino determine uma identidade única para a profissão através do estabelecimento do currículo mínimo.[66] Mas, os conteúdos e práticas não significaram uma uniformidade no ensino dos diferentes cursos.[67] Com a obrigatoriedade de estudos de desenho e plástica, as escolas tinham a liberdade de definir particularidades e preferências quanto aos conteúdos, ferramentas e técnicas nas práticas do desenho. Deste modo, os cursos poderiam dar mais ênfase ao desenho artístico, ao desenho técnico e/ou ao desenho de criação (conforme a concepção de Lúcio Costa).

            92.        Reconhecendo a autonomia das escolas em torno dos conteúdos e práticas pedagógicas, e buscando elaborar um currículo mínimo para as escolas de arquitetura, a ABEA, em 1977, não conseguiu formalizar recomendações para o ensino de desenho.[68]

            93.        Quanto à capacidade de se expressar ou comunicar, naquele momento, as recomendações da ABEA indicaram a necessidade de estimular o estudante para a elaboração do projeto como linguagem. Para tal, era necessária a valorização da comunicação visual dentro das propostas arquitetônicas. Além destas, a ABEA recomendou que as escolas adotassem em suas metodologias de ensino o princípio da interdisciplinaridade entre os conhecimentos, a instrumentação do aluno a nível teórico e prático e orientação conceitual vinculada à realidade brasileira.

            94.        No Curso de Arquitetura da UFRJ uma disciplina correlata, Metodologia visual, surgiu apenas na reforma curricular ocorrida em 1982, permanecendo no grupo de disciplinas ofertadas até 1998. Esta dedicava-se ao estudo da percepção visual com base nas teorias da Gestalt. Esta reaparece na grade curricular de 2006 como disciplina complementar sob a denominação de Comunicação visual e se propõe ao estudo da linguagem e mensagem visual.

            95.        A disciplina de Metodologia visual oferecida no currículo de 1986 a 1998 era coerente com a própria denominação do departamento, o Departamento de Análise e Representação da Forma (DARF), em que estava alocada. Isto porque o nome do departamento, como explica Pássaro (2003), baseou-se nos conceitos adotados nas disciplinas de análise e de forma.[69]

            96.        Em 1995, na EAU-UFF, o prof. Jorge Baptista Azevedo sugere que as discussões sobre a representação gráfica do projeto sejam ampliadas para além das preocupações com as técnicas. Para o autor, o desenho arquitetônico deve promover e garantir a comunicação, mas principalmente o diálogo, de modo a não se constituir um obstáculo à compreensão do projeto. Azevedo (1995) expôs sua preocupação com os rumos do ensino[70] e seus reflexos na aprendizagem de desenho na formação de arquitetos e urbanistas defendendo a ideia de que o desenho deve ser coerente com as necessidades da profissão, ou seja, com a necessidade de se garantirem o acesso e a participação de qualquer tipo de público.

            97.        Para Azevedo (1995), o desenho deve: a) permitir a participação dos usuários comuns (não arquitetos); b) ser capaz de expressar e apresentar os “impulsos criativos;” e c) ser “criativo”, “não hermético”, “impessoal” e “uniformizado”. Com base nestes atributos, Azevedo (1995) apontou para a necessidade de se “refundir” o desenho técnico e livre, tendo em vista que as ciências não podem mais se esquivar do paradigma da complexidade. Deste modo, entende-se que não devemos considerar que o desenho técnico seja o único capaz de expressar, descrever a solução projetual, mas que outros tipos de desenhos como as ilustrações e os croquis devem fazer parte do conjunto da expressão gráfica utilizada para comunicar.

            98.        A necessidade de se repensarem os fundamentos e práticas pedagógicas no ensino de desenho para a formação de arquitetos derivam também: a) da dificuldade de encarar a avaliação dos Trabalhos Finais de Graduação como um instrumento capaz de dar subsídios para melhorar o ensino na formação de profissionais conscientes, éticos e responsável socialmente; b) da necessidade de se valorizar e estimular a autorreflexão tanto por parte dos alunos, como por parte dos professores; e c) da falta de formação pedagógica do corpo docente (AZEVEDO, 1995).[71]

            99.        O estímulo à autorreflexão por parte de alunos e professores era importante no ensino de desenho porque, segundo Azevedo (1995) a supervalorização do desenho de alguns mestres e arquitetos “pode ser ocultadora proposital, do continuísmo de práticas sacramentadas academicamente.” Não havendo um posicionamento crítico reflexivo por parte de professores e alunos, prevaleceria um sistema de cópia sem se pensar sobre a qualidade. Sua crítica fundamentava-se no fato de que nenhuma escola de arquitetura adotava tal postura:

          100.                                  Não consegui saber de nenhuma experiência brasileira onde o desenho seja sistematicamente ensinado, desde o início do curso, para a articulação entre processos de desenvolvimento e estimulação da criatividade com o território da crítica e da reflexão sobre aquilo que se pretende construir ou inovar, por que, para que, como e para quem. (AZEVEDO, 1995, p.256) (grifo nosso)

          101.         Em 1996, o currículo do Curso de Arquitetura da UFRJ passou por uma nova reestruturação, que buscou se adequar às determinações do currículo mínimo estabelecido em 1994.[72] O currículo mínimo foi fruto das discussões e recomendações elaboradas a partir dos Seminários Regionais e Nacional realizados pela ABEA em conjunto com a CEAU. As Diretrizes Curriculares de 1994 passaram a ser referência para que as instituições de ensino de arquitetura e urbanismo definissem os campos de conhecimento de seus currículos. A aquisição de habilidades e competências estabelecida nas Diretrizes Curriculares de 1994 foi ratificada pelas decisões tomadas pela Unesco/UIA em 1996.[73]

          102.         A partir das Diretrizes Curriculares estabelecidas em 1994, o ensino de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ incluiu, em 1996, as ferramentas de informática aplicadas à arquitetura e ao urbanismo como matéria pertencente à formação profissional. No princípio, as preocupações estavam centradas na implantação do ensino do ferramental de informática. Num segundo momento (reforma curricular de 2006), a conscientização de que a estrutura curricular fragmentava os saberes e práticas levou a Coordenação do curso da FAU-UFRJ a buscar a integração entre projeto, desenho e informática aplicada.

          103.         O I Seminário de Ensino de Arquitetura da FAU-UFRJ se propôs avaliar e rever a estrutura de formação do arquiteto. Duas questões abordadas devem ser destacadas porque trazem consequências diretas no ensino de desenho e de projeto. A primeira diz respeito à necessidade de criar condições para que professores e alunos assumam um posicionamento crítico perante suas próprias produções.[74] A segunda diz respeito à interdisciplinaridade (vertical e horizontal) necessária para a formação de arquitetos capazes de terem uma visão integralizadora do mundo.[75]

          104.         Não foi possível observar textos que tratassem especificamente do ensino de desenho, expressão e representação gráfica para o projeto.[76] Mas a disciplina de Gráfica digital (incluída pela reforma curricular de 2006) pretendeu reunir diferentes demandas de inclusão dos meios de comunicação contemporâneos no processo de projeto.

          105.         Segundo Vilas Boas e Pinheiro (2007), a integração da disciplina gráfica digital com o projeto, se dá no Trabalho Integrado, já que tem “como objetivo a capacitação[77] do aluno com reflexões teóricas e experiências práticas, instrumentalizando-o para a proposta de trabalho.” Neste sentido, Vilas Boas e Pinheiro (2007) relatou que até mesmo a definição da nomenclatura da disciplina, gráfica digital, objetivou ampliar os termos “computação gráfica,” “diseño digital” e “informática gráfica” conjugando ferramentas digitais às formas de representação gráfica manual.

          106.         Com a abrangência que a nomenclatura pretendeu proporcionar, esta disciplina focalizou na instrumentação para a elaboração de modelos digitais tridimensionais. Contudo, o foco do ensino não está condicionado à aprendizagem de ferramentas tendo em vista que, segundo Vilas Boas e Pinheiro (2007), os alunos possuem uma “certa intimidade” com as ferramentas digitais. Deste modo, a disciplina também busca estimular associações com o desenho livre (croqui), este como ferramenta do “pensamento gráfico.”[78]

          107.         Num segundo momento desta disciplina, foram incorporadas outras ferramentas gráficas de suporte à expressão do projeto. A ferramenta CAD foi justificada por auxiliar na representação descritiva do projeto e estimular o aluno à crítica de seu projeto. Como explicou Vilas Boas e Pinheiro (2007), a crítica é possibilitada por meio da exercitação do domínio matemático e escalar do ambiente digital.

          108.         No momento de síntese do projeto realizado na disciplina de Trabalho integrado II, os alunos foram motivados a explorar outras ferramentas gráficas a fim de que pudessem articular as informações apresentadas, conjugando os croquis e as imagens digitais produzidas ao longo do processo de projeto. Para auxiliar a organizar os desenhos do projeto, a disciplina também incorporou algumas ferramentas para auxiliar na diagramação, como a exploração de “linguagens gráficas contemporâneas” (VILAS BOAS, 2008).

          109.         A disciplina de Técnicas de apresentação de projeto, por sua vez, sendo oferecida no penúltimo ano, formalizava a tendência já observada por Oliveira e Pedroza no ano 2000.[79] Ela objetiva auxiliar a elaboração das apresentações gráficas do projeto e assim como a disciplina de Gráfica digital, tem o objetivo de “capacitar” o aluno a apresentar o projeto arquitetônico de maneira adequada à máxima visualização e compreensão de seus elementos. Para atingir este objetivo, foi programado para as turmas de 2008 um conjunto de aulas que abordavam os princípios visuais de composição e linguagens gráficas da arquitetura que deveriam ser executadas com o auxílio de ferramentas gráficas digitais de criação e edição de imagens (por exemplo: Autocad, Sketchup, Corel Draw, In Design e Photoshop).

          110.         Esta disciplina apresentou no Programa para o segundo semestre de 2008 um perfil de bibliografia de referência que auxilia o “planejamento visual para a apresentação do projeto.” Este perfil incluiu, principalmente, livros indicados para a área do design gráfico e aborda temas como tipografia, layout da prancha, sintaxe da linguagem visual, uso da cor e diagramas.

          111.         Segundo o plano de curso da disciplina, conceitos como hierarquia e grupamento dos elementos, que devem fazer parte da prancha de apresentação do projeto, foram programados para serem avaliados no primeiro trabalho segundo os critérios de entendimento, quantidade de informações e apresentação. No Programa da disciplina, porém, estes critérios não foram detalhados a fim de se compreender o que significam.

          112.         No segundo exercício, o Programa abordou o estudo das diferentes linguagens gráficas do século XX, objetivando trabalhar com as relações entre linguagem gráfica e projeto. Neste exercício também foram utilizados os mesmos critérios de avaliação. Segundo o Programa, na última etapa da disciplina os alunos deveriam aplicar os conceitos apreendidos na elaboração da apresentação gráfica do projeto realizado na disciplina de Trabalho Integrado II.

          113.         É importante destacar que, na oferta de disciplinas complementares há uma gama de disciplinas relacionadas com o desenho e a representação gráfica que pretendem complementar e aprofundar os estudos realizados nas disciplinas obrigatórias. Dentre as que estão cadastradas no sistema acadêmico destaco quatorze disciplinas relacionadas ao desenho, expressão e representação - como, por exemplo, Informática aplicada à arquitetura e urbanismo, Informática aplicada ao urbanismo, Arquitetura e mídia digital I, Sistemas de representação do urbanismo - que se propõem a utilizar ferramentas digitais gráficas de suporte ao pensamento projetual, de análise de informações e representação da solução projetual.

          114.         Observando as mudanças curriculares de 1996 e de 2006, parece ter ocorrido uma reestruturação dos mesmos conteúdos em disciplinas equivalentes, que continuaram a ser lecionadas pelos mesmos conjuntos de professores. Os conteúdos de desenho continuaram a ser lecionados nos primeiros períodos do curso, suprimindo-se uma das disciplinas de Geometria descritiva. O Desenho de arquitetura passou a ser chamado de Expressão gráfica II e a disciplina de Metodologia visual foi extinta em 1996. Em 2006, a Geometria descritiva permanece inalterada em termos de oferta de disciplina e carga horária. O Desenho de arquitetura retorna com a antiga denominação de 1986, neste momento com apenas uma disciplina.

          115.         As disciplinas de Expressão gráfica I, II e III (1996) passaram a mencionar em seus programas a representação gráfica como expressão e comunicação do arquiteto, assim como estava descrito na ementa da extinta disciplina de Metodologia visual. Estas três disciplinas reuniram os conhecimentos e práticas da representação gráfica da arquitetura, o desenvolvimento da percepção visual, a sensibilidade na solução de problemas de expressão gráfica na concepção do espaço arquitetônico e as normas e padrões usuais de leitura e representação da arquitetura. No currículo atual (2006), passaram a ser denominadas como Desenho de observação I e II.

          116.         No ciclo profissional foi incluída a disciplina de Informática aplicada à arquitetura e urbanismo em 1996, conforme a Portaria 1770 de 1994, para o treinamento de sistemas gráficos de desenho assistido por computador para o desenho bi-dimensional, os sistemas do tipo CAD.[80] Estes já vinham sendo utilizados por profissionais de arquitetura na década de 1980.

          117.         Com a ampliação da oferta de ferramentas gráficas digitais, estudantes e profissionais passam a incorporar um número maior de ferramentas nas diversas etapas de projeto. (NARDELLI, 2009). Os sistemas CAD continuaram a fazer parte do ensino de graduação no currículo de 2006, pois significam uma possibilidade de transição que substitui os instrumentos analógicos, mas não alteram o modo de produção do projeto.

          118.         Para a superação da transição para a era digital, seria necessário um esforço de todo o sistema produtivo para passar para o nível seguinte, o da utilização de sistemas BIM (Building Information Modeling). Com o uso da tecnologia BIM, no processo de projeto seria possível a integração das tarefas e dos agentes em um único processo que pode envolver a geração e composição em termos de performance.[81]

          119.         Como as ferramentas de desenho vetorial (que incluem os sistemas CAD) já faziam parte do dia a dia da maioria dos arquitetos e alunos de arquitetura, apenas alguns alunos e profissionais buscaram se manter atualizados com as ferramentas mais novas do mercado.[82] As ferramentas de desenho assistido por computador de início não substituíram os croquis feitos à mão e, sim, serviam principalmente para a confecção de desenhos técnicos.

          120.         A criação das disciplinas Gráfica digital[83] e Técnicas de apresentação de projeto em 2006 significou a ampliação do treinamento de ferramentas digitais para o auxílio à modelagem tridimensional e animação,[84] bem como a manipulação de imagens com ferramentas de ilustração e edição. Deste modo, estas últimas passaram a auxiliar na elaboração de desenhos humanizados, fotomontagens e nas apresentações de projeto.

          121.         Ressalto que a representação de projetos arquitetônicos com técnicas de colagem e fotomontagem não podem ser consideradas inovadoras uma vez que já eram utilizadas por arquitetos de vanguarda desde 1957-1958, como, por exemplo, pelo grupo Archigram [Figura 10 e Figura 11].

Leitura da trajetória

          122.         Em primeiro lugar, destacamos que a retrospectiva histórica possibilitou identificar que a influência do modelo de ensino Beaux-arts permaneceu, em sua essência, até a reforma curricular de 1968. Essa influência significou, para a expressão do desenho arquitetônico, a perpetuação de modelos importados tendo em vista o ensino baseado na reprodução.

          123.         Podemos dizer ainda que: (a) Em termos de conteúdos (informações representadas) que expressam o projeto identificamos: a representação por um conjunto de desenhos típicos (plantas, corte, fachada e perspectiva); e a complementação acompanhada por detalhes, orçamento, memoriais descritivo e justificativo; (b) Em termos de qualidades gráficas dos elementos que expressam o projeto identificamos: a precisão proporcionada pelo uso do desenho geométrico e da geometria descritiva; o desenho de perspectivas com figura humana que expressam “cenas da vida;” a utilização das cores e tons na representação de sombras que valorizam os planos e volumes da construção. Os dois últimos itens são utilizados como efeito pictórico e não como componentes projetuais.

          124.         Os atributos do desenho de arquitetura, “precisão” e representação como “imagem real” abordados por Silva (1949), interferem na qualidade comunicativa da expressão gráfica do projeto. Deste modo, foram objeto de reflexão no capítulo 2 de nossa tese, juntamente com os atributos do projeto propostos por Elvan Silva (1998) e com as imagens com acabamento não fotorrealísticas respectivamente.

          125.         Silva (1949) também levanta a questão do “destaque” e da “valorização” da arquitetura no desenho quando aponta para a seleção de um “bom ponto de vista” para a valorização da fachada principal. Assim sendo, podemos dizer que Silva (1949) refere-se diretamente ao destaque do conteúdo necessário ao sucesso da retórica visual do projeto definida por Tostrup (1999).

          126.         A preocupação com o ponto de vista era fundamental, pois normalmente não se produzia mais de uma perspectiva para apresentar um projeto. Isto porque sua confecção demandava tempo e habilidade manual. Além de realizada exclusivamente à mão, sua qualidade era dependente da habilidade de desenhar. Sua arte significava um aprimoramento da sensibilidade artística[85] do desenhista com relação à arquitetura.

          127.         Complementarmente à abordagem de Silva (1949), Morales de los Rios Filho (1955) reforça a questão da informação necessária à expressão do projeto que, atualmente podemos utilizar como referência às normas técnicas.[86]

          128.         Lúcio Costa (1940), ao identificar e caracterizar os objetivos do ensino de desenho, apresenta uma categorização para a expressão gráfica arquitetônica. Sua proposta está relacionada a de autores mais recentes como Durand (2003), Farrelly (2008) e Veloso (2008). Sugerimos, deste modo, uma classificação que seja coerente com a expressão gráfica dos TFGs, mas que, sobretudo, seja capaz de evidenciar as atitudes do aluno perante seu projeto.

          129.         Com a criação das disciplinas de gráfica digital e técnicas de apresentação do projeto em 2006, sinaliza-se que há um retorno (ABEA, 1991; AZEVEDO, 1995; SAMPAIO, 1999) à questão da linguagem utilizada para comunicação do arquiteto. Deste modo, entendemos que a diversificação das ferramentas gráficas e a inclusão de teorias e técnicas do Design Gráfico por estas disciplinas apontam caminhos para a pesquisa sobre a expressão gráfica da solução projetual como instrumento de comunicação.

          130.         Havendo múltiplas ferramentas e técnicas e diferentes possibilidades de se expressar graficamente as informações da solução projetual, estabelecemos, em nossa tese, a observação e análise do objeto de estudo sob três aspectos: a) o conteúdo expresso; b) as características gráficas dos desenhos e a utilização das ferramentas gráficas digitais; c) as características dos elementos textuais e da organização dos elementos (informações) no suporte. Deste modo, evitamos o risco de enfatizar somente o aspecto operacional (nas técnicas e ferramentas gráficas digitais de auxílio à representação), mas sim, como as diversas características gráficas expressam as informações sobre a solução projetual, ou seja, como a expressão gráfica demonstra a atitude comunicativa do aluno sobre seu projeto.

Referências

Acta da Sessão do Conselho Escolar em 3 de 1899. Livro 6154. Museu D. João VI / EBA-UFRJ, p.88

Actas do Conselho da Escola Nacional de Belas-Artes (ENBA). Livro 6155: 1901-1912. Museu D. João VI/EBA/UFRJ, p.7

ABEA. Avaliação. Caderno 3. Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura. Niterói, 1991.

ANDRADE. Luciana; BRONSTEIN, Laís; SILLOS, Jacques (orgs). Arquitetura e Ensino: Reflexões para uma reforma curricular. Rio de Janeiro: FAU-UFRJ, 2003. 204p

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[8] Nesta época, além da França, poucos países possuíam escolas para a formação regular de engenheiros. A criação da Real Academia de Artilharia, Fortificação e Desenho, que sucedeu à Aula de Fortificação do Rio de Janeiro (criada em 1699), foi um marco. A Real Academia era um instituto de ensino superior, com organização comparável aos demais de sua época. Esta seria a base do ensino de engenharia no Brasil se tornando a Escola Polytechnica do Rio de Janeiro, a atual Escola Politécnica da UFRJ. Disponível em: http://www.poli.ufrj.br/politecnica_historia.php Acesso em: 3 jul. 2009.

[9] Cf. Alberto Sousa (2001, p. 71,74), o ensino de arquitetura na escola de engenharia imperial era de qualidade porque tinha bons professores e utilizava livros de referência como Précis des leçons d’architecture de J. N. L. Durand e Traité d’architecture de Leonce Reynaud, ambos professores da Escola Politécnica de Paris. Dentre os professores destaco a participação de Manoel de Araújo Pôrto-Alegre e Bethencourt da Silva, dois arquitetos que também lecionavam na Academia de Belas-Artes.

[10] A Missão Francesa chefiada por Joachim Lebreton instalou no Brasil o ensino artístico-acadêmico, incluindo o de arquitetura.

[11] A École, dando continuidade às antigas Academias, disseminava a erudição estilística clássica baseada em Giacomo Barozzi da Vignola (1507-1573). Pintor e arquiteto, Vignola, em Regola delli cinque ordini d’architettura, descreve um método para proporcionar corretamente as ordens clássicas.

[12] Que num primeiro momento tinham como referência o ensino português, e num segundo momento o politécnico francês. Ambas - Academia Militar, posteriormente Escolas de Engenharia, e Academias de Belas-Artes - utilizavam os mesmos métodos de ensino: leitura comentada pelo professor de livros conceituados e cópias de desenhos relevantes para as lições. O diferencial estava no conteúdo lecionado: de cunho técnico-científico e aspectos estéticos respectivamente (SOUSA, 2001, p. 39, 47, 57).

[13] Em termos de prática pedagógica, ambas, a Academia Militar (posteriormente Escolas de Engenharia) e Academias de Belas-Artes, utilizavam os mesmos métodos de ensino: leitura comentada pelo professor de livros conceituados e cópias de desenhos relevantes às lições (SOUSA, 2001). Segundo Cipiniuk (In PEREIRA, 2001-2002, p. 47-52), a pedagogia de Joachim Lebreton refere-se a um processo racional de ensino, no qual a cópia sistematizada de desenhos tinha o intuito de impedir que o aluno desenvolvesse a imaginação, ao mesmo tempo em que permitiria a formação de um sentimento próprio. Para além das práticas em sala de aula, ainda se conservava a aprendizagem autodidata. Isto porque, apesar da crescente organização do ensino em escolas, como a difusão do modelo Beaux-Arts na Europa a partir do século XVIII, chegando no Brasil somente no século XIX, a maioria dos arquitetos eram autodidatas em 1850.

[14] As Academias eram controladas pelo Estado e tinham como finalidade “controlar os edifícios públicos para que tivessem uma unidade estilística que refletisse a unidade política, a riqueza e o bom gosto da nação” (MONEDERO, 2003, p. 149).

[15] DEBRET, 1827.

[16] Arquiteto francês que participou da Missão Artística Francesa e que veio ao Brasil com o intuito de promover a ciência e a indústria através das Artes e Ofícios na América. Desta maneira, com a vinda da Família Real para o Rio de Janeiro, eram necessárias mudanças no então perfil agrário e extrativista da Colônia. (DEBRET 1827, p.2)

[17] DEBRET, 1827.

[18] “O desenho é ainda o centro em torno do qual gravita a formação do artista, seja qual for a sua especialidade. Saber desenhar é o objetivo central das escolas de belas-artes e de artes industriais que se espalham pelas diversas regiões da França, ao longo dos séculos XVIII e XIX. A Escola Nacional Superior de Belas-Artes, que conhece novo regulamento a partir de 1816, não se afasta desse ideal. Dirigida por um conselho e dividida em dois setores, pintura/ escultura e arquitetura, a escola oferece aulas diárias de desenho, que são corrigidos regularmente pelos professores. O desenho da figura humana, o nu, constitui o núcleo do ideal artístico acadêmico, alimentado pela escola. Nas palavras de Jean- Auguste Dominique Ingres (1790 - 1867), professor da instituição, ´o desenho é tudo; é a arte em sua inteireza´. […] A coesão de critérios de julgamento e a orientação do gosto, por sua vez, inibem as possibilidades de inovação e de criação original.” Enciclopédia Itaú Cultural. Disponível em: http://www.itaucultural.org.br Acesso em: 27 jan. 2010.

[19] Ex-aluno e discípulo de Jacques-François Blondel, um dos premiados no Grand Prix de Roma em 1752 e professor da École des Beaux-Arts na seção de Arquitetura em 1795.

[20] O teatro Odéon que abriu pela primeira vez em 1782 para abrigar o teatro nacional da França, a Comédia Francesa, é um excelente exemplo da arquitetura do século XVIII, localizada perto dos jardins de Luxemburgo. É um dos cinco teatros nacionais da França financiado pelo Ministério da Cultura. Disponível em: http://www.theatre-odeon.fr/en/the_theatre/know_more/accueil-f-8.htm Acesso em: 25 fev. 2009.

[21] “No Brasil, esta geometria foi ensinada pela primeira vez na Real Academia Militar, criada por D. João VI. Esta academia começou seu funcionamento em 1º de abril de 1812. O primeiro professor de geometria descritiva, no Brasil, foi o 2o tenente Jose Vitorino dos Santos e Souza. O livro Elementos de geometria descritiva publicado por Jose Victorino dos Santos e Souza, foi escrito com base na primeira edição da obra de Monge” em 1822. (MORAIS, 2003; CAMARGO, 1993). O colégio Pedro II, criado em 1837, aceitava alunos livres para cursar disciplinas preparatórias nas instituições de ensino superior, como é o caso da disciplina de geometria descritiva para ingresso na Academia de Belas-Artes.

[22] Decreto no 1603 de 14 de maio de 1855. Dá novos estatutos a Academiadas Bellas-Artes. Coleção Leis do Império. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/doimperio Acesso em: 06 fev. 2009.

[23] Gaspard Monge, criador da geometria descritiva no século XVII, foi um dos fundadores da Escola Politécnica francesa. Foi professor da antiga Escola Militar de Mézières que deu origem à Escola Politécnica. Gaspar Monge aprimorou uma técnica de representação gráfica já iniciada pelos egípcios que representavam apenas a planta, a elevação e o perfil. Esse interesse em estudar essa técnica resultou de impulsos patrióticos que visavam tirar a França da dependência da indústria estrangeira.

[24] Notação no. 711, 1890. Museu D. João VI / EBA/UFRJ.

[25] Decreto no. 983 de 08/11/1890. Aprova os Estatutos para a Escola Nacional de Bellas-Artes. Coleção Leis da República Federativa. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/republica Acesso em 08 fev. 2009.

[26] Actas do Conselho da Escola Nacional de Belas-Artes (ENBA). Livro 6155: 1901-1912. Museu D. João VI/EBA/UFRJ, p.7.

[27] Sob a regência do professor Ernesto da Cunha Araújo Vianna. Acta da Sessão do Conselho Escolar em 3 de 1899. Livro 6154. Museu D. João VI / EBA-UFRJ, p.88.

[28] O professor Morales de los Rios, em seu programa, apenas especificou a necessidade de apresentação das plantas de cada pavimento, fachada principal e seção transversal em escala específica, isto é, eximiu a apresentação de perspectiva. Atas da Sessão em março de 1888. Livro 6154: Atas da Sessão do Conselho Escolar: 1891-1901. Museu D. João VI – EBA-UFRJ, p. 88.

[29] Decreto no. 3.897 de 13/04/1901. Approva o Regulamento para a Escola Nacional de Belas-Artes. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/republica Acesso em 08 fev. 2009.

[30] Cadeira de Composição e desenho de Architectura, trabalhos práticos correspondentes, a cargo do professor Ludovico Maria Berna entre os anos de 1897 a 1911. Programa de aula de desenho de arquitetura de João Ludovico Berna, enviado em 18/06/1897. Notação 296. Museu D. João VI/EBA-UFRJ.

[31] Decreto no. 8.659 de 5 de abril de 1911. Approva a lei orgânica do Ensino Superior e do Fundamental na República. Disponível em: Disponível em: https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/republica Acesso em 08 fev. 2009.

[32] No primeiro período das 14 disciplinas, oito se relacionavam ao desenho e ao projeto e preenchiam 69% da carga horária do curso. No período seguinte (1911 a 1914), a carga horária aumentou em 50%.

[33] Em 23 de dezembro de 1920 é aprovado o primeiro Regimento da Universidade através do Decreto nº 14.572, que dispõe, em seu art. 1º, ser objetivo da Universidade do Rio de Janeiro: “estimular a cultura da ciência, estreitar entre os professores os laços de solidariedade individual e moral e aperfeiçoar os métodos de ensino”.

[34] “Estabeleceu a organização, composição, competência e funcionamento da administração universitária (reitoria, conselho universitário, assembleia geral universitária, institutos, conselho técnico-administrativo, congregação etc.) e previu a representação estudantil.” (FRAUCHES, 2004, p. 01-18)

[35] Não foi possível localizar, no acervo do NPD, memoriais e planilhas referentes a estes projetos, apesar de também serem exigidos.

[36] Mesmo com a exposição positiva da profissão, os arquitetos diplomados sentiam-se alijados do mercado profissional. Isto porque, o mercado era dominado por construtores, engenheiros e mestres de obra. Além disso, a regulamentação do exercício profissional em 1933 não foi capaz de separar as atribuições do arquiteto e do engenheiro, contribuindo para o acirramento entre estas profissões. O Decreto 23.569 de 11/12/1933 é criado e os artigos 28 e 30 conferem, tanto ao engenheiro civil como ao arquiteto, a competência para o estudo, projeto, direção, fiscalização e construção de edifícios e obras complementares e de serviços de urbanismo.

[37] A Escola de Arquitetura foi criada em 05 de agosto de 1930 e federalizada em 1949 (Lei nº 971). Foi a primeira escola da América do Sul a nascer desvinculada das Escolas Politécnicas de Belas-Artes e Filosofia. Esta autonomia merece destaque, uma vez que suas congêneres, obedecendo aos preceitos academizantes trazidos em 1816 pela Missão Artística Francesa, tinham seus currículos baseados no ensino preconizado pela Academia de Belas-Artes da França. Disponível em: http://www.arquitetura.ufmg.br/ Acesso em: 13 jan. 2010.

[38] Em 1916, o arquiteto Christiano Stockler das Neves resolveu apresentar ao então Mackenzie College, suas ideias para a criação de um Curso de Arquitetura calcado nos moldes do curso que havia frequentado na Universidade da Pennsylvania. Passou a organizar o referido curso, que foi oferecido aos alunos, pela primeira vez, em 1917, com atividades vinculadas à Escola de Engenharia da Instituição. Em 1947, deu-se a separação, instalando-se a primeira Faculdade de Arquitetura do Estado de São Paulo no Instituto Mackenzie. Disponível em: https://www.mackenzie.br/fileadmin/ARQUIVOS/Public/5-graduacao/upm-higienopolis/arquitetura-e-urbanismo/PROJETO_PEDAGOGICO_ARQUITETURA_E_URBANISMO_2017.pdf Acesso em: 13 jan. 2010.

[39] A Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo FAU foi fundada em 1948, tendo se originado do antigo curso de engenheiro-arquiteto da Escola Politécnica da mesma Universidade. Em seus primeiros anos, o curso da FAU combinava as disciplinas técnicas originais do antigo modelo, praticamente inalteradas, com elementos do currículo padrão da Escola Nacional de Belas-Artes. Disponível em: http://www.fau.usp.br/a-fau/ Acesso em: 13 jan. 2010.

[40] Em 1949, Gama e Silva defendeu tese sobre a importância da prática do desenho para a composição de arquitetura. Sua tese é importante por apresentar a crítica ao ensino de desenho da época. O autor foi ex-aluno do curso de Arquitetura da Escola Nacional de Belas-Artes nos anos de 1938 e 1939.

[41] Elali (2009) reafirma a importância da humanização na representação gráfica (layout, figura humana e vegetação) do projeto, mas sob um novo enfoque. Não apenas para facilitar a visualização e impressionar o cliente, a inserção de elementos gráficos humanizantes deve ter a capacidade de demonstrar que o projeto teve o homem, o seu bem-estar, como foco.

[42] A “estilização significava o máximo de aproveitamento da forma dos corpos na obtenção de novas formas, sem que, contudo, a forma do motivo inicial perca sua característica; o desenho dos arquitetos modernistas requer esta preocupação, a fim de evitar certos exageros na interpretação da forma dos corpos”. Somente após o desenho da cópia o aluno era capaz de dar “temperamento artístico” (SILVA, 1949, p. 36).

[43] Apesar de o ensino do desenho já incluir convenções, somente em 1940 é criada a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) com o intuito de padronizar os procedimentos e critérios técnicos utilizados pelos setores produtivos nacionais. O desenho passou a ser alvo de normatização a partir de 1947, com a criação da NB 8. A NB-8, Norma Geral do Desenho Técnico, foi publicada em 1947, com revisão em 1958, 1965 e 1970. Foi a primeira norma de desenho técnico. Com seu cancelamento em janeiro de 1990, passou a ser substituída pelas: ABNT NBR-8196, ABNT NBR-8402, ABNT NBR-8403, ABNT NBR-8404, ABNT NBR-8993, ABNT NBR-10067, ABNT NBR-10068, ABNT NBR-10126, ABNT NBR-10582, ABNT NBR ISO-10209-2.

[44] Engenheiro-arquiteto formado em 1917 pela Escola Nacional de Belas-Artes. Foi professor de Desenho da Escola Normal, do Instituto de Educação e do Colégio Pedro II, e das escolas técnicas Manoel Buarque, Comandante Midosi e da Escola Técnica Nacional. Foi professor de História da Arquitetura e Teoria e Filosofia da Arquitetura do curso de arquitetura da Escola Nacional de Belas-Artes da Universidade do Brasil e de História do Urbanismo do curso de Urbanismo do Instituto de Artes da Universidade do Distrito Federal criada em 1935 por Anísio Teixeira. Idealizador do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia CONFEA, criado em 1934, assume o cargo de diretor de 1936 a 1960. Faleceu em 1973.

[45] As plantas devem ter os maciços (paredes, pilares) preenchidos por meio de hachuras, tracejado ou aguada uniforme (MORALES DE LOS RIOS FILHO, 1955, p. 395).

[46] A planta de situação deveria conter: o perímetro e as dimensões do terreno; acidentes topográficos, propriedades vizinhas, o contorno geral do edifício, a posição destes em relação à via pública numa extensão determinada, o traçado das vias públicas (com dimensões e detalhes: leito, calçadas, meios-fios, árvores, postes de iluminação etc.; o alinhamento urbano oficial, o afastamento do edifício em relação ao alinhamento e as divisas; os níveis da calçada, da soleira da porta ou portão de entrada e a orientação para o norte verdadeiro, curvas de nível de metro em metro, dois perfis, um transversal e outro longitudinal traçados em posição média com as seções esquemáticas das edificações (contornos). Geralmente eram feitas na escala de 1/200 (MORALES DE LOS RIOS FILHO, 1955, p. 395).

[47] São seções horizontais que indicam a distribuição interna, posição das aberturas e fechamentos. Deviam ser representados, na escala de 1/100, os móveis, balcões, máquinas e aparelhos, ladrilhamento (áreas molhadas), e a indicação do destino de cada compartimento. Deviam estar discriminadas as cotas (largura e comprimento e área) de todos os elementos e compartimentos e as indicações da posição das seções e cortes. As plantas, segundo Morales de los Rios Filho, são as mais importantes do projeto e não a fachada, porque o edifício é feito de dentro para fora, ou seja, segundo a lógica de começar a projetar pela planta e terminar com a elevação. A planta é resultado do programa funcional, com as dimensões, proporções e organização determinadas no programa (MORALES DE LOS RIOS FILHO, 1955, p. 395-396).

[48] Devem conter a disposição das estruturas dos alicerces, pavimentos e cobertura devidamente cotados (MORALES DE LOS RIOS FILHO, 1955, p.395-397).

[49] O corte ou seção define o tipo de construção adotado e torna evidente a disposição vertical do edifício, abrangendo toda a altura. São de duas espécies: longitudinal (percorrendo a maior dimensão horizontal) e transversal (no sentido da menor dimensão). Devem aparecer obrigatoriamente: os compartimentos e as dependências que foram secionadas, as dimensões de altura e pé-direito, espessuras de pisos, forros, paredes, madeiramento, etc., e dos vãos (portas, janelas). Pode haver seções auxiliares que se fizerem necessárias. Os maciços recebem a mesma representação gráfica adotada nas plantas, porém em escala de 1/50 (MORALES DE LOS RIOS FILHO, 1955, p. 395-397).

[50] As fachadas devem apresentar o projeto com o aspecto depois de concluída a obra. Para realçar as saliências, indicam-se as sombras por meio de aguadas ou tracejados de acordo com a incidência solar convencional a 45 graus da esquerda para a direita. Os elementos devem estar cotados. A elevação se subdivide em principal, anterior, ou frontispício, quase sempre correspondente à entrada e secundárias (lateral e posterior). A fachada(s) voltada(s) para a via pública deverá ser desenhada em folha separada, conforme exigência das Prefeituras municipais na escala de 1/50. Quando a fachada estiver contígua aos edifícios vizinhos, estes devem estar representados (MORALES DE LOS RIOS FILHO, 1955, p. 398).

[51] Finalidade, requisitos, sistema de fundações, estruturas, organização e distribuição interna, menção dos diferentes serviços, aspecto externo (MORALES DE LOS RIOS FILHO, 1955, p. 401).

[52] Justificação de cada uma das soluções e providências anteriormente descritas (MORALES DE LOS RIOS FILHO, 1955, p. 401).

[53] Avaliação em metros quadrados, da área total do terreno, da área da edificação projetada, da área disponível para jardins, parques, terraços e do preço do terreno (MORALES DE LOS RIOS FILHO, 1955, p. 401).

[54] Discriminação das disposições dos códigos civil, municipal, sanitário, comercial, de ética, de regulamentação profissional, aplicáveis à obra (MORALES DE LOS RIOS FILHO, 1955, p. 401).

[55] Lei no. 4.024, de 20 de dezembro de 1961.

[56] Lei no. 4.831 de 5/11/1965.

[57] Decreto no. 60.455-A/1967 (plano de reestruturação) e Leis 5.539 de 27/11/1968 e 5.540 de 28/11/1968.

[58] Anísio Teixeira foi figura central da educação brasileira na década de 1950 e inícios dos anos 1960. Participante do movimento renovador da educação, o escolanovismo tinha como um dos princípios a ênfase no desenvolvimento do intelecto e na capacidade de julgamento, em detrimento da memorização. Sua teoria teve influências do pensamento progressista em educação, em especial, das ideias do pedagogo norte-americano John Dewey, um dos fundadores da escola pragmatista. As ideias pedagógicas escolanovistas suscitaram o desenvolvimento de múltiplas técnicas e meios para se educar. Consequentemente, tornou-se cada vez mais necessário analisar a prática pedagógica a fim de que sua multiplicidade não fosse aplicada sem a devida pertinência e adequação.

[59] A criação de comissões de alto nível ou de especialistas objetivava conduzir as universidades segundo critérios científicos e à lógica da eficiência. Suas existências e atuações baseavam-se no pressuposto de que os princípios democráticos e liberais devessem ser desqualificados, o que traduzia a cultura política autoritária, positivista e orgânica.

[60] A Comissão de Especialistas do Ensino de Arquitetura e Urbanismo foi criada em 1968 pelo Decreto no 63.338/68. Constituída por profissionais do ensino e da área profissional tinha o papel de representar o pensamento da comunidade e transformá-lo em ações através do Ministério da Educação. A Comissão foi suspensa a partir de 1981 e, em 1985, apesar da reformulação estabelecida pelo MEC através do Decreto 91.607 de 03/09/85 e da Portaria 706/85 de 05/09/85, não se constituíram novas comissões até fevereiro de 1993 pela Portaria 14/93. Se as primeiras comissões destinavam-se a ampliar a capacidade técnico-executiva do MEC através da realização de estudos, planos, supervisões e assistência às instituições, as seguintes passaram a realizar visitas periódicas, ampliando o campo de atuação das comissões de 1993. Em suas novas atribuições, a CEAU também passou a prestar consultoria técnica nas áreas de avaliação, fomento, apoio, acompanhamento e supervisão das instituições de ensino, visando melhorar os padrões do ensino. Passou, então, a identificar os fatores relevantes que afetam a eficiência e eficácia, bem como estabelecer padrões mínimos. A avaliação do ensino passa a ser um dos eixos das políticas para a educação superior da década de 1990, visto que o ensino superior vinha sendo ampliado significativamente desde a década de 1970.

[61] Resolução 218 de 29/06/1973 do Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia, complementar à regulamentação do exercício profissional de arquiteto de 1966 (Lei 5.194).

[62] De modo detalhado são: (1) se as informações do desenho expressam ou não o conteúdo proposto; (2) se os métodos de expressão complementares - audiovisuais, exposição oral, filme, fundo musical - suprem ou não a linguagem gráfica tradicional do arquiteto, o desenho; (3) se a sofisticação gráfica, que na época era reconhecida através do uso de Letraset e cores, contém apenas uma mensagem estética ou esclarece a proposta.

[63] Comissão de Especialistas de Ensino de Arquitetura e Urbanismo (CEAU) da Secretaria de Educação Superior-Sesu do Ministério da Educação-MEC do Brasil.

[64] MEC/CNE/CES. Resolução 6 de 02/02/2006. A Resolução 2 de 17/06/2010, que alterou a Resolução 6 manteve a necessidade de os cursos definirem em seus Projetos Pedagógicos formas de avaliação do ensino e da aprendizagem e garantirem aos graduandos as habilidades de desenho e o domínio da geometria, de suas aplicações e de outros meios de expressão e representação, tais como perspectiva, modelagem, maquetes, modelos e imagens virtuais e o conhecimento dos instrumentais de informática para tratamento de informações e representação aplicada à arquitetura, ao urbanismo, ao paisagismo e ao planejamento urbano e regional.

[65] Parecer no.336 de 1962.

[66] O Governo estabeleceu o currículo mínimo baseado nos Encontros Nacionais de Arquitetos, Estudantes e Professores de Arquitetura ocorridos em 1958, 1959 e 1962.

[67] Salvatori concorda dizendo que o currículo mínimo de 1962, apesar de estabelecido pelo governo, foi capaz de conferir autonomia universitária: “La formación de arquitectos dejaba de basarse en Planes de Estudios modélicos, reconociéndose finalmente la plena autonomía universitária” (SALVATORI, 2005, p. 41).

[68] As dificuldades para formular as recomendações relatadas pelo grupo de discussão se deram principalmente em decorrência da diversidade de experiências encontradas nas escolas brasileiras. Além disso, esta comissão constatou uma precariedade de experiências em decorrência da falta de cursos de formação de docentes e da falta de produção, por parte dos cursos de pós-graduação, de conhecimentos voltados à realidade brasileira.

[69] Diz respeito à análise da forma segundo as teorias perceptivas da Gestalt, que fundamentava os projetos a partir do ponto de vista perceptivo. A forma estava relacionada à “forma pura” abstrata, não figurativa, não representacional. Deste modo, o conjunto de disciplinas, seguindo estes princípios, deveria abordar a teoria da percepção, a metodologia visual e a plástica (PÁSSARO, 2003).

[70] Azevedo (1995) tendo dito que existia um imobilismo nas estruturas acadêmicas, apontou para a necessidade de revisão das práticas de ensino, principalmente de desenho. Isto porque o ensino da EAU-UFF, por ter tido uma aproximação direta com o ensino da Escola de Engenharia, se revelou com forte herança tecnicista (herança de 1964). A crítica de Azevedo (1995) quanto ao tecnicismo se deve-se ao seu caráter limitador de um ensino que deveria ser capaz de estimular reflexões e análises, tanto nas disciplinas de caráter teórico como nas práticas. Pois é no encantamento pela técnica que está o perigo de não se pensar e “se contentar com um muito pouco perigoso” (AZEVEDO, s/data, p. 8).

[71] Em 1977, a ABEA organizou um grupo que tratou da questão do ensino de projeto e planejamento e trouxe contribuições em torno das avaliações da aprendizagem. Este propôs que os alunos auto avaliassem seus projetos, reforçando a participação do aluno no aperfeiçoamento dos processos didáticos. Este aspecto significaria um avanço no processo de aprendizagem, uma vez que auxiliaria o aluno na construção de sua autonomia e espírito crítico.

[72] MEC, Portaria no 1.770 de 21/12 de 1994 (currículo mínimo), da Lei nº 9.131, de 25 de novembro de 1995 (implantado em 1996) e da Lei de Diretrizes e Bases de 23/12/1996.

[73] A International Union of Architets (UIA), criada em 1948, é uma organização não governamental que tem o objetivo de reunir representantes da profissão em todo o mundo para o debate sobre o ensino e a profissão. Dentre os principais objetivos, destaco a promoção da educação para arquitetos. Junto com a United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (UNESCO), a UIA elaborou em 1996 a Carta de Ensino de Arquitetura, que continha os conhecimentos e habilidades necessários para a formação do arquiteto frente às expectativas das sociedades do século XXI. Dentre as aptidões recomendadas, destaco a “habilidade para atuar e comunicar ideias através da colaboração, do diálogo, do cálculo, da escrita, do desenho, da maquete e a avaliação e a habilidade para utilizar a técnica manual, eletrônica, gráfica e da maquete para explorar, desenvolver, definir e comunicar uma proposta de concepção” (grifo nosso).

[74] Dentre os trabalhos apresentados no I Seminário, destacamos na fala do professor Barki (2002, 110) a necessidade de os professores assumirem o papel de críticos. Para tal, o prof. Barki apontou para a necessidade do estabelecimento de critérios de análise para que os alunos tenham um maior distanciamento crítico em seus próprios trabalhos.

[75] Kós (In: ANDRADE et al. 2003, p. 120-125), Gomes (In: ANDRADE et al. 2003, p. 132-140) e Rheingantz (In: ANDRADE et al, 2003, p. 141-153) discutiram a necessidade da associação dos conteúdos teóricos nas disciplinas práticas, transpassando a barreira imposta pela estrutura departamental. Isto indica a intenção de que haja uma maior interação entre os conhecimentos, o que inclui o ensino de representação e projeto. Deseja-se, portanto, que o ensino seja orientado por uma visão totalizadora do mundo ao invés da fragmentação e especialização do saber.

[76] Em 1990, as discussões acerca da reforma curricular da EAU-UFF já apontavam para a necessidade de se reformular o ensino considerando a necessidade de “pensar o próprio pensamento,” a insuficiência didática dos professores pela falta de formação pedagógica, a necessidade de se reformularem os procedimentos pedagógicos tendo em vista uma formação crítica dos alunos (PINTO, 1991).

[77] O termo correto deveria ser construção, entendendo que os novos princípios pedagógicos da proposta curricular de 2006 estariam alinhados com a corrente crítica e não tecnicista.

[78] O croqui serve de instrumento para o registro do pensamento gráfico. Um pensamento centrado, como salienta Piñon (2006), numa visão distante que é própria do artista por ser sintética e totalizadora. Deste modo, dificulta uma visão aproximada e crítica da constituição específica do objeto projetado, sua “corporealidade.” Sua utilidade é pouca quando não se preocupa em representar o sistema construtivo concreto e a estrutura organizativa.

[79] Na pesquisa realizada por Oliveira e Pedroza, em 2000, das dezoito instituições da amostra todas trabalhavam “amplamente” os programas de modelagem vetorial, predominando o sistema CAD. Já os programas de tratamento de imagem, modelagem de sólidos e superfícies e de animação eram menos trabalhados pelas escolas brasileiras.

[80] CAD (Computer Aided Design) é o nome genérico dos sistemas computacionais que auxiliam o desenho. Um dos programas gráficos pioneiros em desenho assistido por computador foi o AutoCAD. Em 1982, da Autodesk© lança a primeira versão do programa, mas aproximadamente dez anos depois, iniciam-se os estudos na FAU-UFRJ em disciplina complementar. Com a popularização dos computadores portáteis, este tipo de programa passa a ser utilizado em firmas de arquitetura e engenharia, principalmente para auxiliar a confecção dos desenhos dos projetos.

[81] Os modelos paradigmáticos propostos por Oxman (2006) são separados em quatro categorias, definidos de acordo com a técnica e/ou processo digital utilizado na concepção do produto arquitetônico: Sistemas CAD: um primeiro passo para o rompimento com desenho convencional sobre papel, porém com pouco efeito inicial sobre o processo de projeto; Formation ou Composição: conceito estabelecido a partir da teoria emergente de projeto que transformou o conceito de forma em conceito de composição associado à topologia (que explora conceitos formais topológicos e a geometria não euclidiana), parametrização e animação (transformações morfológicas e de outra natureza, que se multiplicam descontinuamente num contínuo dinâmico); Geração: caracterizado pela provisão de mecanismos computacionais por processos gerativos, onde as formas se definem a partir de fórmulas gerativas pré-definidas, podendo aqui ser dividido em dois subgrupos: shape grammar (gramática formal) e modelos evolutivos; Performance: determinado pelo desempenho e potencialidade integrados com processos de composição e de geração a partir de determinantes externas, como questões ambientais, características do sítio, programa etc. (OXMAN, 2006)

[82] Oliveira e Pedroza (2000), num diagnóstico do estado da arte do ensino de desenho nos cursos de arquitetura brasileiros, constataram que os softwares vetorizados prevaleciam e havia média disseminação dos softwares de tratamento de imagens e de animação.

[83] Esta passou a ter como objetivo a introdução dos aplicativos gráficos e das ferramentas digitais direcionadas ao tratamento gráfico e à apresentação de projetos. Esta disciplina também passa a incluir princípios de composição e edição de documentos digitais interativos e introdução a web design. Segundo Vilas Boas et al. (2007), esta disciplina se insere interdisciplinarmente na nova estrutura curricular implementada em 2006, tendo o desafio de atender às demandas da inserção da representação gráfica digital no processo criativo.

[84] Segundo Piñon (2006), a grande contribuição das ferramentas gráficas digitais está na possibilidade de projetar construindo, isto porque se passa a projetar com elementos construtivos (paredes, lajes, tubos, janelas etc.) em vez de elementos gráficos (linha, arco etc.). Além disso, a modelagem tridimensional virtual no processo de concepção permite o trabalho simultâneo em diferentes escalas e em múltiplos pontos de vista. O autor salienta ainda que a maior descrição visual do objeto projetado exige do projetista maior capacidade de juízo para reconhecer o momento do processo e o estabelecimento de critérios para a tomada de decisões: “A construção de imagens em três dimensões culmina as possibilidades de verificação do projeto, porquanto permite realizar as comprovações definitivas, de natureza construtiva e visual, respectivamente” (PIÑON, 2006, p. 146).

[85] A arte nos desenhos de “apresentação” (fachadas, perspectivas, interiores) consistia da representação de pessoas, animais, vegetais e objetos que figuram o ambiente natural.

[86] ABNT NBR-6492/1994.