Luciana Dilascio Neves*
Como citar: NEVES, Luciana Dilascio. Montagem e Fotomontagem na Revista Ilustrada dos Trabalhadores (Arbeiter Illustrierte Zeitung – AIZ): John Heartfield e o Dadaísmo de Berlim. 19&20, Rio de Janeiro, v. XIX, 2024. DOI: 10.52913/19e20.xix.08. Disponível em: http://www.dezenovevinte.net/19_20/artigo/montagem-e-fotomontagem-na-revista-ilustrada-dos-trabalhadores/
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1. Os exemplos de montagem utilizados para análise nesse artigo foram selecionados sobretudo da produção de fotomontagem que o artista gráfico alemão Jonh Heartfield (1891-1968) elaborou para a Revista Ilustrada dos Trabalhadores (Arbeiter Illustrierte Zeitung – AIZ), uma revista de viés esquerdista vinculada ao comunismo. Além disso, discutimos um exemplo do pintor, gravador e desenhista George Grosz (1893-1959), também alemão. As relações que envolvem Heatfield e Grosz em questões sobre a colagem e a montagem datam, possivelmente, de antes do fim da Primeira Guerra, em torno de 1915-1916. Segundo Annateresa Fabris (2003, p. 15-16), Grosz relata que ele e Heartfield teriam realizado experiências de fotomontagem neste período, a partir de recortes e colagens feitas a partir de anúncios publicitários, rótulos de garrafas e fotografias de revistas, como maneira de trocas de cartões postais, pelas quais, as “imagens justapostas” poderiam dizer “aquilo que as palavras não podiam afirmar por razões de censura.”
2. Já que “nenhum desses cartões chegou até nós” (FABRIS, ibid.), não se pode constatar a hipótese. Mas interessa observar que Grosz mencionava aquela prática exercida por ele e Heartfield já como um exercício de fotomontagem, que seria plenamente desenvolvida posteriormente. A nosso ver, o que seria pouco usual na atividade da fotomontagem naquele período não era propriamente a junção de imagens, ou mesmo a montagem – práticas que, como defendemos, menos ou mais conscientizadas, já eram próprias aos repertórios de criação artística. Ainda que artistas do Cubismo em suas variantes antes da guerra realizassem, em seus trabalhos, a colagem de fragmentos de materiais retirados diretamente do real (pedaços de madeira, metal, vidro, ou números, letras e palavras gráficas etc.), o que era menos usual e se vinculava à prática da fotomontagem, possivelmente, refere-se ao fato de “montar” a partir de representações preexistentes na realidade, nas articulações semânticas que ocorriam entre estas coisas, referidas também à realidade política e sócio cultural tangente. No caso da fotomontagem, esta vinculação se dava, em especial, pelo uso das fotografias, as quais se atrelavam representações marcadas por sua identidade e verossimilhança com o real e com os acontecimentos atuais.
3. Todavia, ainda segundo Fabris (2003, p. 14), a fotomontagem tinha também raízes populares que podiam ser encontradas nas colagens fotográficas populares, apresentando “combinações bizarras de objetos” e, não raro, uma visualidade e um imaginário de surrealidade, que antecedem a estética surrealista.
4. A montagem e, em especial, a fotomontagem viriam a ter uma importante função como meios de criação no grupo dadaísta de Berlim, que foi se constituindo entre 1916 e 1917, com adesões de Heartfield e Grosz, além de Hannah Höch, Otto Dix, Raoul Hausmann, entre outros. A utilização da fotomontagem se enfatiza após a Primeira Guerra, propagando-se no decorrer das décadas de 1920 e 1930.
5. Como afirma Fabris (2003, p. 19), não se pode dissociar estas produções da militância dos dadaístas no Partido Comunista, que mantinham relações com órgãos de oposição aos governos, tal como foi o caso de Heartfied e Grosz. Esses dois artistas trabalharam juntos em várias publicações e parcerias, como, por exemplo, na revista Nova Juventude (Neue Jugend), entre 1916-1917, orientada contra a guerra, A Bancarrota (Die Pleite), entre 1919-1920, e O Porrete (Der Knüppel), entre 1923-1927, relacionada à sátira política, além de trabalhos para a editora Malik-Verlag, dedicada à publicação de literatura socialista. As parcerias e afinidades envolvem as disposições antiliberal e antimilitarista, a revolta contra a sociedade burguesa – especialmente em face da exploração e condições miseráveis orientadas pela guerra -, assim como a “simpatia pela linha revolucionária da Liga Spartacus, na qual militavam Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht” (FABRIS, ibid.).
6. Heartfield fez parceria também com Bertold Brecht e Erwin Piscator, diretores teatrais com os quais partilhava o interesse pela montagem, interesse esse que era nutrido por outras referências, como a recíproca influência de experimentações relativas aos cineastas soviéticos.
7. O contexto de tais produções se apresenta como o das transformações políticas, sociais e culturais na Alemanha, expondo a influência econômica e ideológica “que criou as condições para a formação de um Estado de direita e conservador” após a Primeira Guerra (1914-1918), levando ao mergulho na “brutalidade nazista” a partir de 1933, e tornando o país palco do conflito na Segunda Guerra Mundial (1939-1945) (FELDEN, 2018, p. 14). Heartfield passou parte da infância em dificuldades econômicas, refugiando-se com a família devido ao posicionamento socialista e de tendência anarquista do pai. Junto ao irmão, Helmut Herzfeld, foi enviado novamente à Alemanha. Com o início da Primeira Guerra, em 1914, foi convocado para lutar no regimento de Berlim, afastando-se depois de um ano devido à debilidade na saúde. Com outros artistas e intelectuais, iniciou um movimento de protesto e oposição à guerra. Conforme lembra David Evans (2013, p. 116), Heartfield, Herzfelde e Grosz desempenharam “papéis-chave na fundação da ala berlinense do movimento Dadá,” iniciado por Tristan Tzara e Jean Arp em Zurique, 1915. O Dadaísmo de Berlim utilizava-se do sarcasmo e da ironia para confrontar a opinião pública e a civilização capitalista considerada responsável pela guerra. Influenciados pela Revolução de Outubro de 1917, Heartfield e Grosz se filiaram ao Partido Comunista Alemão em 1918. Como relata Evans (ibid., p. 116-117), Heartfield lembra, em uma entrevista de 1944, da transição do Dadaísmo para o comunismo como “uma mudança do ‘protesto contra tudo’ para ‘uma propaganda artística sistemática e conscientemente guiada para o serviço do movimento da classe trabalhadora’.”
8. Como argumenta Pollyana Ferreira Rosa (2018, p. 75), a partir dos anos 1920 as inovações técnicas dão impulso ao “fotojornalismo moderno,” revolucionando a prática fotográfica e sua utilização na imprensa. No início de 1930,[1] o fotojornalismo valoriza as “reportagens” com grupos ou sequências fotográficas associadas com textos, “nos quais se contava uma ‘história’, sempre com a prerrogativa de estar apresentando a ‘verdade’.” As fotografias apareciam para confirmar e fornecer legitimidade ao texto. Desta maneira, o fotojornalismo moderno foi consolidando um modo de perceber e “conhecer o mundo” a partir dos mecanismos e meios de reproduzir a realidade, próprios do capitalismo e dos modos de usar os meios técnicos emergentes, pautados na verossimilhança e na normatização da linguagem.
9. Estes procedimentos para falsear e manipular a realidade começaram a ser ostensivamente criticados por artistas e pensadores de esquerda, em especial por aqueles que, assim como Brecht e Walter Benjamin, “eram entusiastas das novas mídias e tecnologias” (ROSA, ibid.), entendendo-as como meios revolucionários para atuar junto às massas. Logo perceberam que a utilização da fotografia, apropriada pelo capitalismo, tornava-se meio reacionário, confundindo e tornando irreconhecíveis as relações entre a realidade e as representações.
10. Conforme John Berger (2017, p. 47), o mascaramento foi se tornando cada vez mais endêmico na burguesia e no capitalismo avançado, ainda que não fosse exclusivo destes. Trata-se de um “fenômeno histórico e político específico,” que precisou “esperar pelo princípio da democracia moderna” para o pleno exercício da “manipulação cínica desse princípio” (BERGER, ibid.). A repulsa ao mascaramento é ainda mais forte porque ela “nasce da autoconfiança do manipulador, de sua indiferença à contradição flagrante que ele mesmo exibe entre palavras e ação, entre sentimentos nobres e uma prática cotidiana” (BERGER, ibid.). Todo o exercício político de Heartfield nasce desta repulsa ao mascaramento. É em função disto que ele faz do seu trabalho um instrumento de luta, mas também, como observa Berger (ibid.), de “educação política.”
11. A Revista Ilustrada do Trabalhador – AIZ,[2] foi o veículo de imprensa que mais repercutiu as fotomontagens de Heartfield, e onde ele obteve maior alcance combativo. A partir de 1930, o artista torna-se responsável pelas capas e pela montagem das páginas da AIZ (ROSA, 2018, p. 77). Conforme Fabris (2003, p. 34), a AIZ não competia numericamente com as revistas mais populares do capitalismo, mas “alcançava um público significativo, integrado por operários, funcionários, donas de casa, profissionais liberais, autônomos e jovens, entre outros.”[3] A revista caracterizava-se por um projeto gráfico inovador, com:
12. Artigos sobre política nacional e internacional; temas de ‘interesse humano’; romances publicados em capítulos; poesia; uma página dedicada à mulher ou à criança; uma página de piadas e palavras cruzadas; uma página dedicada a uma produção artística, geralmente a cargo de Heartfield, mas podendo contar com a colaboração de outros artistas, como a fotógrafa italiana Tina Modotti e a gravadora Käthe Kollwitz. AIZ chega a organizar um concurso de fotomontagens entre os leitores e divulga notícias sobre cursos práticos que Heartfield ministrava em associações operárias para propagar a técnica. (FABRIS, ibid.)
13. A atuação de Heartfield na AIZ e o uso da fotomontagem representam uma “acirrada luta ideológica em plena crise econômica” (ROSA, 2018, p. 81). Neste percurso, a revista de esquerda investe na batalha relativa às narrativas sobre a realidade, confrontando-se com as revistas da imprensa burguesa, e com a que produziu as narrativas do nazismo, antes mesmo de sua ascensão ao poder, em 1933.
14. Principalmente em relação à fotomontagem de Heartfield, as imagens montadas tinham um apelo direto e imediato com relação ao que procuravam dizer e atacar, numa dinâmica que, muitas vezes, as faziam oscilar entre arte e propaganda política. Como disse Piscator, as fotomontagens de Heartfield precisavam de “um conteúdo que rumava diretamente para um determinado alvo” (PISCATOR apud FABRIS, 2003, p. 19). Este alvo, grosso modo, foi a imprensa burguesa, a social-democracia e o nazismo.
15. Mas, se muitas vezes, o trabalho de Heartfield pode ser visto como propaganda política, é preciso considerar que sua atuação artística se insere em uma perspectiva marxista de diálogo com as massas e, como indicou John Berger (2017, p. 47), visava a uma “educação política” vinculada ao marxismo. A fotomontagem possibilitava a junção da fotografia e da montagem. A fotografia era possivelmente vista por seu potencial de falar para as massas, pois como observou Siegfried Kracauer (apud FABRIS, 2003, p. 21), ela havia se tornado “um meio de expressão universalmente compreensível do mesmo modo que a linguagem.” Se esta característica lhe conferia um potencial para ser usada para a dominação, de certo lhe conferia simultaneamente um aspecto revolucionário, por seu apelo à compreensão pelas imagens. Como indica Berger (ibid.), se aquilo que Heartfield queria expressar poderia ser, a princípio, “conseguido com um desenho ou mesmo com uma frase mordaz,” o que o artista percebe é justamente o maior apelo que tinha a fotografia em relação às coisas e acontecimentos do real, possibilitando tornar evidente “na consciência das pessoas essa relação com os poderosos meios de sugestão e persuasão dos testemunhos fotográficos” (RENAU apud FABRIS, 2013, p. 10). É deste modo que Heartfield compreendeu o uso da fotomontagem como modo de combater a maneira manipuladora e falseadora que a imprensa moderna lhe destinava o uso, em função do efeito mimético que comportava. Se um desenho era com certeza algo que havia sido construído e elaborado por alguém, tendendo a ser percebido mais em termos de subjetividade e não como realidade, a fotografia tendia a ser, no imaginário popular, um fragmento da própria realidade, flagrado praticamente de modo impessoal. Como menciona Fabris (ibid.), “a fotomontagem política é uma clara resposta à revolução trazida pela reprodutibilidade técnica.”
16. Exercer a montagem fotográfica era, assim, um meio que Heartfield encontrava para educar contra as ilusões da aparência e o absoluto das verdades. Ele procurava elucidar e expor, sobretudo, “o mecanismo pelo qual se pode dirigir a leitura de uma fotografia de modo a alternar sua relação com os fatos” (ROSA, 2018, p. 81). Ele buscava demonstrar que a fotografia, assim como um desenho, joga com elementos de subjetividade e objetividade. Possuindo um aspecto lacunar, a própria seleção do que se fotografa, ou o ângulo do que se mostra, já pressupõe elementos de subjetivação, de modo que não se pode compreender a fotografia como elemento da pura objetividade. A força didática de Heartfield se constrói no esforço para fazer compreender que a fotografia, como meio de expressão, permite construir a partir de aspectos do real, oferecendo um posicionamento sobre este, mas que não é, de modo algum, um equivalente do real. A coerência com que atua em relação a isto é a maneira como não permite, no trabalho que desenvolve, que ele seja percebido como um discurso da verdade, em vez de uma construção em que está explicitado seu próprio ponto de vista.
17. Neste sentido, a maneira como realiza seu autorretrato, em 1929 [ Figura 1 ], é indicativa desta postura e do modo como ele insiste que seu trabalho seja compreendido. Como aborda Adriana Felden (2018, p. 18), Heartfield se mantém firme no seu propósito crítico e revelador, desnudando o próprio fazer e se colocando “como um trabalhador no ato da sua realização, usando a própria linguagem” que desenvolve. Como menciona Felden (ibid., p. 18-19), Heartfield:
18. Elege a tesoura como “arma” de trabalho, cortando a cabeça do Comissário de Polícia Zörgiebel (1926-1930). O ato remete à guilhotina uma metáfora declarada contra o inimigo, Friedrich Karl Zörgiebel, responsável pelo massacre dos berlinenses em 1929, o Blutmai (Maio Sangrento). Episódio no qual a polícia repreendeu com brutalidade os manifestantes no 1º de maio, resultando na morte de dezenas de trabalhadores.
19. De certo que a imagem corresponde a posição crítica de Heartfield frente aos atos cometidos pelo Estado contra os trabalhadores. Mas é também uma maneira de dizer que a sua violência se inscreve na forma de seus meios de trabalho e lhe confere toda a responsabilidade pelas próprias ações que afirma. De modo irônico, ao se mostrar (ele próprio) executando o pretenso “crime” contra Zörgiebel, possivelmente sua montagem provoca e insinua que a mesma atitude de responsabilidade pelos atos não se pode esperar do estado policial. Ainda que aparente ter um significado direto, as fotomontagens de Heartfield apresentam um nível de sutileza que abarca instâncias de significado para além da mais imediata.
20. Conforme Berger (2017, p. 47), “com sua tesoura, ele recorta acontecimentos e objetos das cenas às quais eles pertenciam originalmente. Depois, dispõe esses elementos numa nova cena, inesperada e descontínua, para ressaltar uma ideia política.” Mas qual o sentido deste artifício? Pode realmente um artifício romper com uma falsa ideia que se apresente consolidada em uma percepção aparentemente tão natural? Como indaga Berger (ibid., p. 48), por que romper com “as continuidades naturais em que elas normalmente existem” nas fotografias tais como foram realizadas? Talvez possamos responder a isto refletindo sobre a relatividade. Na concepção do pintor Paul Klee (2001), o visível é apenas uma instância da realidade múltipla, de sorte que a arte não se preocupa em reproduzir o visível, mas “tornar visível.” Isto se aplica a Heartfield, que não está preocupado em reproduzir a realidade, mas em tornar visível, ainda que seja um aspecto da realidade política que se encontra subtendida na aparência deste visível. Neste sentido, ele não hesita em “violentar a realidade produzida pela fotografia” para “tornar visível os fios complexos que ordenam o real” (ALFREDO DE PAZ apud FABRIS, 2013, p. 11), problematizando a questão da objetividade da imagem fotográfica, para demonstrar que “esta é um instrumento sujeito a inúmeras manipulações” (FABRIS, ibid.). É tornando consciente as possibilidades que há de se alterar as relações de sentido e significado, na medida em que se modifica o ponto de vista e a predisposição entre os fragmentos aludidos à realidade, que conforme Berger (2017, p. 48), “tomamos consciência da arbitrariedade” de uma mensagem compreendida em sua aparente naturalidade. A natureza ideológica das aparências é “abruptamente revelada naquilo que é. As próprias aparências nos revelam como elas nos iludiam” (ibid.). Para Berger (ibid.), a genialidade do uso da fotomontagem em Heartfield reside na percepção dessa possibilidade: a utilização didática da fotomontagem no intuito de “desmistificar” as aparências.
21. A partir de um arquivo de imagens preexistentes e/ou de fotografias registradas com determinada intenção, valendo-se de outros recursos e de interferência manual sobre as referências, as montagens de Heartfield se apropriavam de imagens de personagens e situações reais, retiradas de contextos diversos, fosse das revistas ilustradas, jornais ou outras fontes, justapostas a legendas e textos de origens também distintas, e outros elementos gráficos.
22. Segundo Fabris (2003, p. 23), sua produção procurava fazer frente à “velocidade com a qual a imprensa burguesa espalhava notícias falsas,” construindo suas narrativas e ideologias. Entre suas estratégias, além de fornecer elementos para detectar “o processo ideológico de construção da notícia” (FABRIS, ibid., p. 36), buscava também, pela montagem, criar a “contranotícia,” oferecendo um enredo distinto daquele que estava sendo difundido pela classe dominante. Na edição de fevereiro de 1930 da AIZ, a imagem de uma cabeça em forma de repolho aparece embrulhada pelos jornais Tempo e Vorwärts, do Partido Social-Democrata. Se lê na legenda da fotomontagem: “Quem lê os jornais burgueses tornar-se-á cego e surdo. Abaixo as vendas que aturdem” [ Figura 2 ].
23. À direita, a fotomontagem disponibiliza também um texto que visa a esclarecer o episódio que pontua a coligação da social-democracia com os partidos e imprensa burguesa, quando juntos atuaram para a marginalização dos comunistas (FABRIS, ibid., p. 35-36). No caso, a fotomontagem procurava também não deixar esquecer os acontecimentos, com a dissimulação dos fatos de acordo com os interesses de cada momento.
24. A partir de 1930, as articulações entre fotografias “associadas a textos que dirigiam sua leitura” (ROSA, 2018, p. 81) eram realizadas por inúmeras publicações, fossem de entretenimento, jornalística ou de propaganda nazista. “As fotos supostamente confirmavam, davam credibilidade às narrativas construídas” ajudando a “legitimar a interpretação da realidade que a revista trazia” (ROSA, ibid.). Mas observamos que a despeito da enorme utilização das imagens fotográficas, a leitura acrítica destas imagens faz com que esta leitura permaneça orientada e condicionada pela discursividade da linguagem instrumental: é a leitura racional, predeterminada pelo texto, que confere os significados das imagens. Isto nos leva a refletir que a quantidade de imagens que circula numa sociedade não torna necessariamente seus indivíduos “leitores” de imagens. Eles podem continuar a compreender as imagens a partir dos dispositivos racionais pré-fixados pela linguagem verbal.
25. Além da condução persuasiva da leitura das imagens pela contiguidade e racionalidade do discurso instrumental, Pollyana Rosa (ibid.) menciona alguns outros procedimentos utilizados pela linguagem jornalística para falsear a realidade histórica. Estes vão desde o fato de se utilizar a fotografia de um acontecimento para falar de um outro acontecimento –, segundo ela, “recorrente em inúmeros meios” –, até outros mais sutis, como a “própria captação da imagem,” ou a própria seleção dos temas das reportagens fotográficas que, muitas vezes, eram retirados do mercado do entretenimento ou assuntos secundários, obstruindo “qualquer notícia ao grande público sobre a realidade da crise econômica ou da ascensão fascista.” Se estabelecemos uma relação com nossa contemporaneidade, percebemos que tais procedimentos permanecem atuais. O uso de uma imagem por outra se escancara nas fake news. É mais difícil comprovar esta utilização na grande imprensa, mas as outras exemplificações são procedimentos facilmente observáveis. Uma outra menção feita por Rosa (ibid.), no período em questão, refere-se à falsa percepção dos leitores-espectadores de que a “prática fotojornalística da época,” com suas várias fotos relativas a um acontecimento, oferecia “todos os ângulos” de um assunto, sendo capaz de “mostrar ‘toda a realidade’” dos acontecimentos. Esta percepção, ainda hoje, é bastante consolidada. Para muitos que mantêm a credibilidade na grande imprensa, se um jornal, por exemplo, oferece dez depoimentos de pessoas “credenciadas” para falar a respeito de uma dada situação, e se, nove destes “especialistas” são favoráveis a um dado ponto de vista, e um é neutro, então, muitos tendem a compreender que isto expressa proporcionalmente uma totalidade de opiniões sobre o fato, sem colocar em dúvida a questão de que os próprios selecionados expressem o ponto de vista do jornal. Da mesma maneira, as fotos selecionadas podem mostrar o que se quer que se veja dos acontecimentos dando a falsa ideia de uma totalidade, ou induzindo à compreensão do que está acontecendo em um dado momento histórico. Mas retornando ao problema no período que observamos, estes procedimentos serão confrontados pela esquerda alemã. Contra estes falseamentos da fotografia em relação à realidade, para Benjamin (1994, p. 106), “sua contrapartida legítima é o desmascaramento ou a construção.”
26. Contra estes desvios, Benjamin (1994, p. 129) sugere colocar nas imagens fotográficas “legendas explicativas que a liberem da moda e lhes confiram um valor de uso revolucionário.” Benjamin contesta o uso da fotografia tanto como modo de ilusão da realidade, tal como fazia a mídia jornalística e a de entretenimento e consumo,[4] como o uso enquanto “objeto de prazer contemplativo” que lhe confira uma interpretação meramente subjetiva, que permita reforçar a desconexão contínua entre o real e as implicações do real a que se referem. Como ele exemplifica, a fotografia poderia “transformar a própria miséria em objeto de fruição” (BENJAMIN, ibid.), sem, no entanto, colocar em questão as implicações e causas da miséria, desviando as imagens das razões existenciais que lhe são próprias. Seriam, assim, imagens destituídas de causas, tornadas assimiláveis dentro do aparelho produtivo capitalista. Contudo, ainda que Benjamin use a expressão “legendas explicativas,” entendemos que ele não pensa nesta ação explicativa do mesmo modo que faz a linguagem verbal em sua tendência conclusiva, com a imagem se explicando pela legenda e vice-versa.[5] O método eleito por Benjamin é a montagem, “o desmascaramento ou a construção” como ele mesmo indica, “algo de artificial, de fabricado” (ibid., p. 106). Tal estratégia deveria possibilitar que as imagens explicitassem o que não está dito ou expor as contradições que ocultam.
27. Para não abastecer o aparelho produtivo capitalista e propor sua modificação, Benjamin (ibid., p. 129) indica a necessidade de superar a “barreira entre escrita e imagem,” e é neste sentido que ele propõe a utilização das “legendas explicativas.” Entendemos que ele dirigia esta proposta ao trabalho produtivo de esquerda que estivesse interessado em modificar o funcionamento do aparelho capitalista, pois ainda que muitas vezes a intenção fosse ir contra este funcionamento, para ele, acabava-se por abastecê-lo. Sobre estas proposições, refletidas no ensaio O autor como produtor, de 1934, compreendemos que: enquanto se colocar uma barreira entre estes mecanismos – palavras e imagens – de atribuição/apreensão de sentidos e significados, mais facilmente o sistema produtor capitalista consegue se apropriar das imagens e das palavras segundo seus próprios interesses, atribuindo sentidos e explicando umas pelas outras. É observável que Benjamin atribuía um papel fundamental à palavra, mesmo em seu aspecto instrumental, justamente por sua relação direta e de compreensibilidade. Em nossa maneira de ver, as palavras conjugadas às imagens podem ser pensadas não por seu valor explicativo, mas como modo de contribuir com uma apreensão mais dinâmica sobre a realidade, bem como sobre as imagens e palavras da realidade. Esta dinâmica palavra-imagem (cuja montagem e dialética constituem-se como eficazes estratégias) poderia contribuir com uma experiência criadora (tanto receptiva quanto produtiva) das massas a respeito das imagens e das palavras – distinta de uma lógica de consumo preestabelecida e condicionada pelo aparelho capitalista. Há, nesta proposição de Benjamin, uma certa concepção pedagógica, refletida, em especial, em relação às classes populares. Particularmente, entendemos que esta dinâmica entre palavra-imagem, muitas vezes relacionada à dialética e a uma posição socialista, compreende determinadas possibilidades da produção estética.
28. O uso de texto conjugado às imagens era uma prática usual das montagens em Heartfield, e de fato, a conjugação entre texto e imagem seria típica de muitos processos de montagem no período. Contudo, a montagem entre textos e imagens tal como aparece no artista gráfico não é utilizada no intuito de conduzir a uma dada leitura, explicando e concluindo pela aparente contiguidade. Ela é utilizada de maneira descontínua e fragmentada, e, ao invés de concluir, a conjugação entre texto-imagem estabelece-se pela dialética, procurando abrir uma interrogação umas sobre as outras, muitas vezes, pela própria contradição existente, ou pela ironia estabelecida A montagem neste sentido, ao invés de determinar a leitura, procura instaurar um espaço de questionamento do observador frente à imagem, solicitando um “pensar a imagem” a partir da própria experiência do observador, pois uma vez que não há um conteúdo previamente fixado, ele precisa ser encontrado. Ou seja, ainda que a imagem não seja isenta das próprias concepções de Heartfield, ao invés de determinar o significado, ela procura instigar um processo de investigação frente aos significados da imagem e da realidade por ela aludida. Conforme David Evans (2013, p. 127), em quase todos os trabalhos de Heartfield, encontra-se esta “mistura inseparável de palavra e imagem”. Evans (ibid.) conta que quando ele publicou “uma imagem sem texto,” “uma imagem de uma pomba da paz sendo atacada por uma ave de rapina”, ele teria convidado “os leitores a enviar um título, poema ou fábula para completar a montagem inacabada.” Esse fato nos indica como Heartfield considerava no seu trabalho o espaço da experiência do observador, nas relações entre os espaços que se davam na montagem de palavras e imagens. As imagens não eram explicadas pelas palavras (ao contrário, em geral produziam um choque ou estranhamento), nem serviam para garantir a veracidade dos conteúdos dos discursos textuais. Palavras e imagens deveriam se reconstruir na experiência do leitor, preservando cada uma delas seu âmbito de significação.
29. Georg Grosz também fez uso de processos de montagem/colagem e da relação texto e imagem. No entanto, ainda que Grosz tivesse contribuído com o desenvolvimento da fotomontagem, para as publicações políticas que realizava seu meio era mais expresso pelo desenho e pela gravura, e não pela fotografia. Nascido em Berlim, também lutou na guerra entre 1914-1917. Seus desenhos figuram a estupidez da guerra e da civilização europeia, violenta e militarizada, que em nada teria melhorado com o fim do conflito. Uma prática satírica e irônica a respeito de uma burguesia insensível que lucrava com o caos, esbanjando e explorando o trabalho e a prostituição, em um cenário em que muitos passavam fome e mendigavam trabalho. Grosz (2001) em sua autobiografia, menciona sobre sua aversão à cronologia e análise minuciosa de fatos e documentos, esclarecendo que sua atenção ao “real” se volta para o insólito em que se revela a face da história e da natureza humana no ato cotidiano naturalizado.
30. Para a revista dadá Der Blutge Ernst fez várias charges políticas, tal como a capa para o seu quarto número, em 1919 [ Figura 3 ]. A imagem concentra no fundo um acúmulo de propagandas e anúncios de bares, hotéis e locais de diversão. Sobreposta à colagem destas propagandas aparece o desenho de um burguês alemão inclinado, sendo acariciado por uma mulher seminua que se presume ser uma prostituta, e abaixo, a legenda: “Trabalhe e não se desespere” (BATCHELOR, 1998, p. 42).
31. A relação imagem-texto se realiza pelo choque entre as proposições divergentes que estão na oposição entre os significados da imagem visual e da textual, pois enquanto a ambiguidade da frase permite que ela seja dirigida às condições de vida de um trabalhador, a imagem visual diz respeito à realidade da vida do burguês. É a montagem texto-imagem que permite fazer pensar as discrepantes relações existenciais entre as duas classes. Nas relações entre estas classes, poderíamos observar, que a frase deixa sugerida a consciência do burguês, em que o trabalhador deve continuar a trabalhar – no modo irônico e jocoso do burguês, “sem desespero” – para a manutenção da sua vida (burguesa). Claramente, neste caso, a frase não justifica a imagem, mas ao contrário, elas se contrapõem. Seus significados só podem ser reconstruídos na experiência do “leitor.” Conforme Batchelor (ibid., p. 299), em 1928, Grosz ainda escreveria: “despertar [o trabalhador] para a luta de classes – este é o objetivo da arte, e eu sirvo a este propósito.” Mas podemos observar que, tanto em Grosz, como em Heartfield, a ironia e a sátira são elementos fundamentais contidos no propósito de suas produções.
32. De acordo com Antônio Souza Ribeiro (2018, p. 9-11) a respeito da obra satírica do escritor austríaco Karl Krauss (1874-1936) em período correspondente, a ironia e a sátira instituem-se “como crítica da normalidade.” Uma forma de “incredulidade e horror perante o que vai acontecendo e vai sendo trazido para o interior do discurso da sátira sob a figura fundamental da indignação” (ibid., p. 10). Como diz Ribeiro (ibid., p. 11):
33. Existe sátira onde existe legítima suspeita sobre a normalidade social, sobre o senso comum aceito, com seus valores e os seus rituais. O olhar do artista é forçado a tornar-se satírico pela percepção exacerbada de que o universo da comunicação e das práticas sociais em geral se apresenta na forma de um mundo às avessas. É assim que arrancar máscaras, derrubar fachadas, são motivos recorrentes de toda sátira. O real como pura ilusão, ou simples embuste, o mundo como palco, a cidade como representação vazia, tudo isto são signos da essencial e inaceitável imoralidade do estado de coisas vigente.
34. Mas, ainda conforme Ribeiro (ibid.), um programa de “confrontação crítica e satírica” a este universo de convenções e formas correntes na sociedade está inseparável de um “programa de crítica da linguagem […] na intenção combativa de ‘drenar o vasto pântano dos lugares-comuns”.’ Para Karl Krauss, esta “crítica da linguagem” significava, sobretudo, uma crítica à imprensa austríaca, “enquanto lugar por excelência de mercantilização do discurso” (ibid.). No discurso kraussiano, a imprensa:
35. É o significante para o conjunto dos mecanismos que na sociedade moderna induzem a um uso puramente instrumental da linguagem, um uso que, redundando na destruição da capacidade de experiência, torna o ser humano disponível para a negação da sua própria humanidade. (RIBEIRO, 2018, p. 12)
36. Walter Benjamin (apud RIBEIRO, ibid.) diz que este estereótipo, que aparece como figura estruturante do discurso jornalístico, é “a expressão linguística da arbitrariedade com que a actualidade no jornalismo se arroga o domínio sobre as coisas.” Para Ribeiro (ibid.), a crítica pioneira de Krauss à imprensa, constitui “uma das dimensões de mais flagrante actualidade da sua obra”:
37. Uma fundamental crítica do discurso jornalístico como dispositivo retórico assente em usos irresponsáveis da linguagem (os mesmos aos quais, no jargão dos nossos dias, se aplicaria a designação de “pós-verdade”) e como forma de poder capaz de produzir um efeito de invisibilização do real, cujas consequências se irão tornar cruelmente patentes no âmbito da cultura de violência que dominará a esfera pública austríaca e europeia em 1914. (RIBEIRO, 2018, p. 12)
38. Para Benjamin (1989, p. 106-107), os jornais constituem este indício da separação ou redução da experiência em relação à informação:
39. Se fosse intenção da imprensa fazer com que o leitor incorporasse a própria experiência as informações que lhe fornece, não alcançaria seu objetivo. Seu propósito, no entanto, é o oposto, e ela o atinge. Consiste em isolar os acontecimentos do âmbito onde pudessem afetar a experiência do leitor. Os princípios da informação jornalística (novidade, concisão, inteligibilidade e, sobretudo, falta de conexão entre uma notícia e outra) contribuem para esse resultado, do mesmo modo que a paginação e o estilo linguístico. (Karl Krauss não se cansou de demonstrar a que ponto o estilo jornalístico tolhe a imaginação dos leitores.)
40. Entendemos que neste tipo de linguagem informativa e instrumental se predispõe o conhecimento da realidade como modo para a manipulação e persuasão. Tal crítica estética incide aí seu combate, objetivando, tal como nas palavras de Ribeiro, “um programa de crítica da linguagem,” para a recuperação da experiência. Como maneira de relacionar a realidade à própria experiência inteligível, sensível e imaginativa que se têm do mundo.
41. Como mostra Rosa (2018, p. 83), as imagens conjugadas a textos de modo a construir argumentos por meio de sequências não eram utilizadas apenas pelas mais populares revistas ilustradas da imprensa burguesa, mas também pelas “brochuras de campanhas eleitorais de Hitler,” assim como a revista ilustrada Observador Ilustrado (Illustrierte Beobachter), lançada em 1926 (um ano depois da AIZ), quando Joseph Goebbels (1897-1945) se deu conta do “potencial de influência sobre as massas que ofereciam as revistas ilustradas.” Neste sentido, é impressionante como o Partido Nacional-Socialista de Hitler passa a se apropriar do discurso socialista, colocando ao lado dos “valores imperiais e patrióticos” a “preocupação com as classes trabalhadoras.” Como constatou o historiador Arthur Rosemberg (apud ROSA, ibid., p. 78), em 1934, a respeito da tática de propaganda dos nazistas, estes, “apoiando-se em sua propaganda socialista, fizeram um progresso muito mais rápido nos setores depauperados e miseráveis da população.”
42. Para o falseamento do Partido Nacional-Socialista a respeito de sua preocupação com os mais pobres, contribuía o “fato de o partido fascista se caracterizar por um excêntrico relacionamento com a sociedade burguesa [ataque público a ela, apoio privado dela]” (ALFRED SOHN-RETHEL apud ROSA, ibid., p. 93). Procurando ser visto como os “verdadeiros socialistas,” o partido fascista vai apropriando-se da crítica de esquerda, tal como pode ser observada na publicação do partido em 1932, que se iniciava pelo título “Derrubem o sistema!”, atacando as elites burguesas como “beneficiários do sistema,” o Partido Social-Democrata e o governo burguês do chanceler Heirich Brüning (1930-1932). Defendiam-se das críticas comunistas, acusando-os de “falsos socialistas,” e de traidores, judeus e comunistas (ROSA, 2018, p. 83-84). A respeito desta apropriação do partido fascista, Heartfield, já refugiado em Praga desde 1933, depois que Hitler se tornou chanceler, elaborou uma fotomontagem cômica para a AIZ de abril de 1934, que levou, entre outras, a legenda “Mimetismo.” Nela, Goebbels aparece colocando uma barba no Führer a estilo de Karl Marx [ Figura 4 ]. Numa legenda irônica, informa tratar-se da última ideia desesperada de Goebbels para transmitir as ideias do Nacional-Socialismo à classe trabalhadora, propondo que Hitler passasse a se dirigir assim aos trabalhadores. Uma outra legenda mostra uma reportagem de 8 de abril de 1934 que dizia que a medalha do Primeiro de Maio da Frente Nacional do Trabalho daquele ano incorporava os símbolos do martelo e da foice como esforço para conquistar os trabalhadores que ainda se opunham ao regime. A reportagem informava também que “os nazistas tentaram se apropriar do Primeiro de Maio dos socialistas, fazendo dele um feriado oficial chamado Dia Nacional do Trabalho” (HEARTFIELD, 2013, p. 70-71).
43. Antes da ascensão de Hitler ao poder, e mesmo depois, as fotomontagens de Heartfield atacariam um ponto crucial para os nazistas, que era “o mascaramento de suas relações com as classes dominantes e a ilusão de que o movimento possuía um caráter socialista” (ROSA, 2018, p. 77). Ainda que negassem enfaticamente, identificando Hitler aos mais pobres, conforme Arthur Rosenberg (apud ROSA, ibid.), “a elite dos grandes industriais e banqueiros proveram as crescentes necessidades financeiras da Casa Marrom (o quartel general nazista).” Segundo Felden (2018, p. 71), o procedimento dos industriais do aço, por exemplo, “já era conhecido dos alemães desde a Primeira Guerra Mundial,” como informa Isabel Loureiro (apud FELDEN, ibid.): “De um lado a miséria, de outro lucros fabulosos das indústrias de material bélico (Krupp, Thyssen e Stinnes) […].”
44. Mesmo depois da ascensão de Hitler, Heartfield continuaria denunciando as relações do nazismo com o grande capital, em especial, com a indústria alemã. Na AIZ de agosto de 1933, ele “estampa o rosto de Fritz Thyssen, industrial filiado ao partido nazista” (FELDEN, ibid.), que segura e manipula uma diminuta imagem de Hitler em forma de marionete. Na montagem do texto com a imagem, ele parodia utilizando as próprias declarações nazistas de que o Führer “‘no cumprimento de seus deveres’ seria um ‘instrumento nas mãos de Deus”’ (ibid.). Como observa Gisèle Freund (apud FELDEN, ibid.), há um efeito de simplicidade na montagem que visa a sugerir “ideias compreensíveis para todos.” Isto estaria em acordo com o propósito do artista e da revista em estabelecer um contato direto com as massas. Porém, é observável também que, ainda que regidas por uma simplicidade expositiva, as montagens de Heartfield possuem sempre o elemento da sátira e da ironia, produzem-se a partir da conjugação com a perspectiva dialética, havendo algo que não está dito e requisitando a montagem no observador. A declaração nazista que liga Hitler a Deus se choca com a imagem que relaciona o mesmo Hitler ao capital, abrindo ao menos um espaço de interrogação e de perscrutação da experiência na vivência sobre a realidade.
45. Contudo, na visão de Rosa (2018, p. 91), a revista AIZ, Heartfield e o comunismo, de modo geral, teriam percebido tardiamente o risco de uma hegemonia nazista. É somente em 1932, “bem depois das primeiras vitórias eleitorais relevantes do partido nacional-socialista […] para o Reichstag (1930),” que há uma intensificação do ataque ao nazismo pela AIZ.
46. Em julho de 1932, no crescimento do nazismo entre as massas populares, a revista AIZ publicou outro número com uma capa de Heartfield [ Figura 5 ],[6] em que o artista gráfico buscava evidenciar as contradições e as farsas do partido fascista, um pouco antes da tomada de poder.
47. A montagem coloca lado a lado a imagem do príncipe da Prússia August Wilhelm, uniforme militar e braçadeira com a suástica, que tem a mão erguida em saudação nazista, e a imagem de um trabalhador de muletas, que não tem uma das pernas, a mão estendida para pedir esmola. Acima das imagens, a legenda: “Príncipe e trabalhador em um mesmo partido?” A montagem disponibiliza também pequenos textos em que se tem acesso a outras informações a respeito das imagens (ROSA, 2018, p. 72-73).
48. A primeira contradição que surge entre as imagens é o que permeia um confronto entre classes (aristocracia versus trabalhador; rico versus pobre); porém, os atributos das figuras selecionadas pelo artista e os textos permitem pensar outras oposições. A escolha pela utilização da imagem do príncipe da Prússia, filiado ao partido nazista, relaciona-se como símbolo do império e do militarismo, assim como a escolha pela imagem de um trabalhador sem uma das pernas, fazem remeter, ambas as fotos, para a memória da guerra, com as relações entre causa e consequência que o confronto das imagens sugere.
49. Como lembra Rosa (2018, p. 73), a traumática experiência coletiva da Primeira Guerra, com milhares de mutilados, ainda era latente no imaginário dos alemães, tanto nas sequelas deixadas nos sobreviventes, como no tema dos “mutilados” recorrente em desenhos, gravuras e pinturas do pós-guerra, tal como aparece nos trabalhos do George Grosz e Otto Dix. Em suas memórias, Grosz (2001, p. 135) relata sua experiência como combatente da guerra, no hospital de campanha aonde chegou com a saúde física e mental destroçada: “A cada um de nós faltava algo. A alguns, uma perna, a outro, um olho ou mesmo os dois. A um terceiro, um estômago; a outro, a canela; a outro mais, a memória.”
50. Contudo, ao se ler os pequenos textos na montagem de Heartfield, fica-se sabendo que não se trata de um combatente de guerra, e sim de um trabalhador que perdera sua perna em acidente, antes da guerra, em 1910, e que teve, recentemente, seu auxílio previdenciário reduzido, “graças a uma lei proposta pelos nazistas no Reichstag (o Parlamento Nacional)” (ROSA, 2018, p. 74). Tal como faz em suas várias publicações, Heartfield procura ir apontando as contradições entre o discurso nazista e as ações que levam a cabo.
51. A mais evidente oposição, no confronto entre as imagens, seria a que se expressa pelo conflito de classes, mas também se pode intuir uma contraposição entre comando (militarismo) e combatente (população civil), relacionada à Primeira Guerra com as relações de causa e consequência vinculadas a cada uma das figuras. É interessante observar como o artista utiliza o texto para informar que, na verdade, a mutilação da perna se refere a um acidente anterior, e não à guerra. É evidente que ele poderia utilizar a imagem de um mutilado pela guerra, se assim quisesse. Entendemos que, ao invés de dizer o fato, ele prefere mostrar que foi evocado pela própria experiência e memória do observador. Ao invés de dizer, ele prefere afirmar a importância da experiência e da memória para a leitura da realidade. É como se Heartfield quisesse indagar seus interlocutores: Por que o confronto entre tais imagens faz pensar na guerra já que nada foi dito a este respeito? Qual a relação entre estas figuras e de que modo elas estão conectadas à própria experiência que se tem do real? Por que esta experiência do real está apartada da leitura dos fatos? A escolha de Heartfield pela imagem de um trabalhador sem perna, que não é um mutilado da guerra, e cujo pequeno texto ao lado da figura vem esclarecer, está no intuito de demostrar que as relações e conexões que implicam na guerra estão presentificadas na memória e na experiência. Elas precisam emergir frente aos fatos e conexões da realidade que se mostra.
52. Esta estratégia de contradizer o que a imagem visual sugere com o que o texto vem a afirmar, na visão de Rosa (2018, p. 74), tem também um aspecto didático, ao criar um distanciamento crítico que leve a pensar para além das primeiras impressões, fazendo do espectador “um observador distanciado, que é levado a analisar as situações colocadas e tomar decisões sobre elas” (ibid., p. 89).
53. Os pequenos textos utilizados na montagem, de certo, expressam mais uma contraposição de interesses entre as duas figuras, mas nas justaposições opositivas elaboradas na fotomontagem, não há uma prática que visa a concluir. Elas se voltam para a vivência e conexões do observador na pergunta: príncipe e trabalhador em um mesmo partido? A AIZ, como uma revista vinculada ao Partido Comunista, tem, no desenvolvimento de suas páginas, momentos de uma propaganda mais direta relacionada ao partido. Mas é, especialmente, naquelas fotomontagens em que uma pedagogia da montagem se expressa mais fortemente que se pode compreender a concepção pedagógica e marxista a qual se vincula Heartfield. É no desenvolvimento da montagem com seus espaços semânticos que ele expressa sua concepção socialista, na necessidade da dialética, em vez da persuasão; na crença na potência do leitor, ao contrário da subestimação que se explicita na persuasão.
54. As publicações nazistas, em suas tentativas de apropriação do discurso socialista, chegam a falsear até mesmo esta prática que se relaciona à dialética marxista de apresentar o conflito a partir de seus antagonismos. Em uma das páginas da publicação “Derrubem o sistema!” [ Figura 6 ] de 1932,[7] aparece, como exemplo, a título de “beneficiários do sistema,” as fotos de um farto jantar burguês em que aparece o presidente da polícia e políticos da Social-Democracia contrastada com a foto de um veterano de guerra, na calçada, a pedir esmola. Segundo a legenda: “[…] O presidente da polícia Grezesinsky (à esquerda) aprecia uma boa refeição. Mas veteranos de guerra têm de passar fome” (ROSA, 2018, p. 85). Não há, contudo, um exercício dialético, as imagens são usadas, como de costume, para confirmar a frase e vice-versa. Elas apenas conduzem a leitura do observador para onde se direcionou. O efeito é puramente persuasivo na medida em que visa a fazer acreditar que o Partido Nacional-Socialista de Hitler, ao ostentar estar denunciando os ricos e burgueses, estaria do lado dos mais pobres e desprovidos.
55. A forma dialética precisa constituir um distanciamento crítico em relação às questões e implicações dos termos justapostos. Ela precisa conseguir inserir a participação e a vivência do observador no centro deste diálogo.
56. A narrativa do Partido Nacional-Socialista visava à persuasão e ao falseamento histórico, utilizando-se também da racionalidade instrumental da linguagem. Um discurso fechado nele mesmo, repleto de recursos emocionais e imersivos.
57. Em 1932, a AIZ concentrou seu ataque ao nazismo. Sua principal estratégia era evidenciar a relação do nazismo com a alta finança do capitalismo alemão. Citamos aqui duas fotomontagens que, possivelmente, estão entre as mais conhecidas de Heartfield: Adolf, o Super- homem: traga ouro e fala disparates [ Figura 7 ], e O sentido da saudação hitleriana: o pequeno homem pede grandes donativos [ Figura 8 ].
58. Na primeira destas fotomontagens, uma imagem de Hitler, com a boca aberta e a suástica estampada no peito, aparece sobreimpressa a uma espécie de radiografia que revela traqueia e pulmões compostos por moedas.
59. A montagem se revela no elemento cômico e absurdo que está na tentativa de mostrar o funcionamento do interior de Hitler – como aparece assinado no campo superior direito, “raio-X por John Heartfield.” A imagem da face do tirano de boca aberta, possivelmente retirada em um momento de discurso, colada a um tronco com coluna metálica feita por moedas, sugere também a mecanicidade da ação reprodutora sugerida pela legenda: tragar ouro e falar disparates. A montagem é semântica, e, a nosso ver, aparece nesta junção entre a imagem de Hitler e a sugestão de um funcionamento interno maquínico e alienado, movido a dinheiro. De certo, a imagem afirma-se mais diretamente nesta ridicularização da forma reversa de Hitler. Mas, neste caso, a realidade política em questão já se deslocou para afirmar-se no âmbito do absurdo e da imaginação como meio de contrapor-se à falácia de um super-homem nutrido por um imaginário fabricado pelo capital.
60. Na segunda fotomontagem, Heartfield se apropria de uma imagem de Hitler numa manifestação política, em gesto da saudação, e faz a montagem desta imagem com a de um magnata capitalista que, em tamanho ampliado, em escala muito maior e disposta atrás da figura do Führer, coloca cédulas de dinheiro sobre a mão que faz a saudação. Como legenda, utiliza o próprio lema do Nazismo “Milhões estão atrás de mim,” fazendo uma modificação semântica e convertendo a ideia dos milhões de alemães para os “milhões que o capitalismo monopolista alemão dá a Hitler para a manutenção de sua política” (FABRIS, 2013, p. 40). As fotomontagens na AIZ se complementam e mostram a ação de Heartfield como pautada num processo insistente de contradizer a construção narrativa e ideológica do poder.
61. Como comenta Felden (2018, p. 69), Heartfield tinha um cuidado especial com a autoria de seu trabalho, sempre assinando suas montagens. Essa preocupação se relaciona, a nosso ver, com a necessidade de assumir a responsabilidade pelas proposições estabelecidas, sem torná-las de modo algum impessoais. Mais que isto, ele insistia em afirmar o caráter construído das suas fotomontagens e das proposições estabelecidas a partir delas. Conforme María Luisa Bellido (2007, p. 259), “autores como Heartfield, cuando exponían sus fotomontages originales, solían presentar com ellos las páginas de periódicos y revistas em los que se habían reproducido” [ Figura 9 e Figura 10 ], tal como aparece na fotografia utilizada para a fotomontagem que tem a legenda “Um Pangermânico.” Como observa Berger (2017, p. 44), a respeito desta fotomontagem:
62. [Ela] mostra Streicher[8] de pé numa calçada ao lado do corpo inerte de um judeu espancado. […] Streicher está de uniforme nazista, mãos atrás das costas, olhos mirando diretamente à frente, com uma expressão que não nega nem confirma o que aconteceu a seus pés. Isso está, literal e metaforicamente, abaixo de sua atenção. Em sua jaqueta há uns poucos e leves traços de sujeira ou de sangue. […]
63. Alguém poderia compreender a fotomontagem em questão como uma imagem “realista” devido às suturas nos pontos de corte, o que obscurece a ideia de montagem como junção de partes heterogêneas. Contudo, a intenção de Heartfield com imagens deste tipo não é enganar quanto à natureza “realística” da fotografia. Ele procurava apresentar tais fotomontagens juntamente com as fontes originais, mostrando de onde foram retiradas as fotos para a montagem estabelecida, assim como as interferências manuais feitas sobre as imagens. A ideia de iludir e mascarar o real seria contra todo o empenho pelo qual ele orientava seu trabalho. Mas a intenção de uma fotomontagem como a de “Um Pangermânico” está, como as demais, orientada para uma proposição sobre o real, por meio do caráter explícito e afirmativo da construção. Heartfield sutura os cortes na medida em que isto se relaciona com a intenção sobre os aspectos da “realidade” que ele quer fazer pensar.
64. Tal como indica a citação de Berger acima, a montagem de Heartfield procura estabelecer uma proposição sobre o aspecto psicológico do nazista, na figura impassível de Julius Streicher diante do crime a seus pés. Em nossa percepção, a junção das imagens permite pressentir que o mascaramento da psicologia nazista está justamente naquilo que não é negado: está no seu completo distanciamento da realidade. Talvez, no cálculo de uma ideologia que não tem qualquer interesse pela realidade que vai fenecendo a seus pés. Por isso, o nazista nem nega nem afirma seus crimes. Sua atitude está acima da vida e da realidade, à qual não lhe cabe prestar contas.
65. Compreendemos que a motivação que impele à realidade política, manifesta em Heartfield, se realiza por meio da arte, na medida em que se expressa não pela necessidade de reproduzir o real, mas de fazer ver o real, compreendido enquanto possibilidades de ver, pensar, imaginar. Estabelecemos aqui uma relação com a atitude de Karl Krauss, quando, tal como ele mesmo assume, faz uma “viragem estética” mudando o rumo de sua escrita crítica e jornalística – “em que assentara o sucesso dos primeiros anos da revista” (sua própria revista, O Archote) –, para o estilo literário, experimental e satírico (RIBEIRO, 2018, p. 13). Entendemos que, no caso de Krauss, a linguagem jornalística apresentou uma limitação ao teor crítico com que ele percebia um estado de coisas na sociedade austríaca que deveria ser “arrancado à invisibilidade” (id., ibid., p. 9). A “viragem estética” corresponderia à compreensão de que alguns aspectos da realidade não são propícios à descrição, ou pelo menos não se deixam apresentar facilmente por uma linguagem que, antes, normatizou as aparências, naturalizou a superfície do que é (ou pode ser) visível. Este arrancar as coisas da sua invisibilidade é arrancar também da invisibilidade que a própria linguagem instrumentalizada tende a produzir sobre a superfície das coisas. Destituir, reconstruir, ultrapassar a linguagem são pretensões que permeiam a experiência estética. Foi o que Krauss parece ter percebido quando afirmou sua crítica no campo da literatura satírica. Conforme Didi-Huberman (2017, p. 21), Roseph Roth, em 1929, criticando uma realidade filtrada e falsificada dos jornais, radicaliza seu posicionamento e afirma: “Afinal, não há outra objetividade senão uma objetividade artística. Apenas ela pode representar um estado de coisas conforme a verdade.”
66. Após a Segunda Guerra, tendo retornado à República Democrática Alemã vinculada ao regime da União Soviética, Heartfield precisou contar ainda com o prestígio de Brecht e defesa veemente do dramaturgo – “para ter direito de usar a estrutura de Estado, como pensão e tratamento hospitalar” – em face da política cultural imposta por Josef Stalin que, desde a década de 1930, refutava a arte vanguardista. Somente depois da morte de Stalin, em 1953, ele recuperou seu prestígio (FELDEN, 2018, p. 18).
67. Os exemplos relacionados às produções de Heartfield e, também, às de Grosz, assim como as relações que estabelecem com os processos de montagem, não podem ser pensados fora de um posicionamento marxista e dialético, que atendem, no entanto, a concepções próprias e não partidárias. Nenhum dos dois aderiram às posições stalinistas. Ao ser demandado a realizar uma produção mais otimista em relação à imagem do proletariado, Grosz (apud BATCHELOR, 1998, p. 318) recusou-se a fornecê-la: “Vejo [o proletariado] ainda oprimido, ainda embaixo na escala social, pobremente vestido, pobremente pago… e frequentemente sustentado por um desejo burguês de ascender.” Conforme Batchelor (ibid.), como resultado, Grosz foi estereotipado e acusado de falhar ao não se atualizar – ou seja, por não ter se adaptado (ou se submetido) às demandas do stalinismo.
Referências
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BENJAMIN, Walter. Charles Baudelaire. Um Lírico no auge do Capitalismo. São Paulo: Brasiliense, 1989.
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FABRIS, Annateresa. A fotomontagem como função política. História, v. 22, n. 1, p. 11-58, 2003. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-90742003000100002&lng=en&nrm=iso Acesso em: 29 jun. 2020.
FABRIS, Annateresa. Por um Realismo Crítico. John Heartfield e a História da Arte. In: HEARTFIELD, John. Fotomontagem. John Heartfield: Fotomontagens. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo; Museu Lasar Segall, 2013.
FELDEN, Adriana. A Fotomontagem de Heartfield e Tina Modotti: produções artísticas na imprensa. Dissertação (Mestrado em História da Arte) – UFSP, Escola de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Programa de Pós-Graduação em História da Arte, Guarulhos, 2018.
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ROSA, Pollyana Ferreira. A Montagem de Heartfield na guerra ideológica às vésperas da ascensão nazista na Alemanha. Fronteiras: Revista de História, Dourados, MG, v. 20, p. 71-97, jul./dez. 2018.
* Professora do Curso de Licenciatura Belas Artes da UFRRJ. Mestrado em Ciências da Arte (UFF). Doutorado em Educação (UFRRJ), com foco na inter-relação entre produção estética, política e educação.
[1] Conforme Fabris (apud ROSA, 2018, p. 77), “Berlim era […] a ‘cidade jornal’. […] em 1927, contava com 147 jornais, em 1928 já eram 2.633, entre diários e revistas semanais.”
[2] A AIZ foi fundada em 1925 pelo organizador e político comunista alemão Willi Münzenberg” (EVANS, 2013, p. 117). Conforme Evans (ibid.), Münzenberg pretendia que a AIZ fosse uma alternativa às revistas ilustradas mais populares da imprensa capitalista, tais como a Münchner Illustrierte Presse (Imprensa Ilustrada de Munique) e a Berliner Illustrierte Zeitung (Revista Ilustrada de Berlim). Segundo Evans (ibid.), esta questão não teria passado despercebida pelo Partido Nazista, que em 1926, “criou a própria versão, o Illustrierte Beobachter (Observador Ilustrado)”.
[3] A revista, em 1931, alcançava uma tiragem de 500 mil exemplares semanais, enquanto uma revista como a Berliner Illustrierte Zeitung chegava a “mais de dois milhões de exemplares no começo da década de 30” (FABRIS, 2003, p. 31).
[4] Como menciona Benjamin (1994, p. 106), se a fotografia se libera de certos contextos, ela “se afirma como fetiche, cujos traços só devem a vida à alternância das modas. […]. Mas se a verdadeira face dessa ‘criatividade’ fotográfica é o reclame ou a associação, sua contrapartida legítima é o desmascaramento ou a construção.”
[5] Criticando o modo da “reportagem,” Benjamin (1994, p. 107) diz que os “clichês somente produzem o efeito de provocar no espectador associações linguísticas.” Essas “associações” ele não as considera como efeito explicativo, mas persuasivo.
[6] LAVIN, Maud. Heartfield in Context. Art in America, New York, v. 73, n. 2, p. 85-93, fev. 1985. Disponível em: https://monoskop.org/images/0/0a/Lavin_Maud_1985_Heartfield_in_Context.pdf Acesso em: nov. 2020.
[7] German Propaganda Arquive – Calvin University. Disponível em: https://research.calvin.edu/german-propaganda-archive/stuerzt-das-system.htm Acesso em: nov. 2020.
[8] “Julius Streicher (1885-1946). Militar alemão nazista. Publicou o jornal Der Stümer (1923-45), que se tornaria parte da máquina nazista, utilizado para incrementar o profundo ódio ao judeu pelos leitores. Streicher chegou a publicar livros infantis antissemitas, tal como Der Giftpilz (O cogumelo venenoso). Foi um dos principais responsáveis pelo ambiente racista, xenófobo e antissemita na Alemanha, que culminaria no Holocausto.” Texto disponível em: https://segundaguerramundial.fandom.com/pt-br/wiki/Julius_streicher Acesso em: 29 out. 2020.