. A. C. BELAS-ARTES. Ligeira impressão colhida ontem na XXXIII Exposição Geral. O Jornal, Rio de Janeiro, 14 ago. 1926, p. 3. - Egba

A. C. BELAS-ARTES. Ligeira impressão colhida ontem na XXXIII Exposição Geral. O Jornal, Rio de Janeiro, 14 ago. 1926, p. 3.

De Egba

Sem preocupação dogmática de fazer crítica, de que resultam muitas vezes opiniões nascidas do afeto ou geradas do ódio, continuamos, displicentes, o nosso passeio de ontem, em torno das obras catalogadas no salão de Belas Artes.

Os nossos pintores ali comparecem, como dissemos de relance, pintando vários gêneros e motivos. Não se vêm somente paisagens, como há pouco acontecia, quebrada esta nota apenas pelos estudos de inspiração clássica, com que a velha mentalidade da Escola empanturrava os rapazes, influindo sobre o espírito dos artistas feitos e ainda não libertos das tendências erradas trazidas do curso acadêmico.

Não que neguemos valor às telas já feitas e inspiradas nessa velha e respeitável inspiração; ou que, com a referência feita ao gênero paisagem, mostremos desamor por essa difícil pintura. Absolutamente, não. Pela paisagem sentimos todo o entusiasmo de quem as possuindo, lindíssimas, lamenta apenas não saber pintar para reproduzi-las.

Mas é que a paisagem só tem sido tentada, com raras exceções, na pintura brasileira, com pouca felicidade. E é evidente que essa orientação resultava de um falso conceito que hoje não prevalece, mas que predominou por algum tempo, julgando a paisagem motivo decorativo, parte componente de tela, fundo de quadro, em suma. A paisagem tem, entretanto, como a figura humana, a sua vibração e vida íntima. Sente-se a paisagem com a mesma palpitação, a mesma elevação espiritual da figura; Para ser perfeita, a paisagem precisa ter uma alma e esta só se depara quando, por exemplo, a paisagem nos evoca alguma coisa que conhecemos, que amamos, que sentimos e compreendemos, mesmo sem tê-la visto.

Na paisagem brasileira esta feição especial encontra-se maravilhosamente tratada, como ninguém antes ou depois dele tratou, por Antonio Parreiras. Baptista da Costa, que foi também fortíssimo paisagista, não se igualou a Parreiras, pelo impressionismo europeu que revelou na maioria dos seus quadros. Grande como era, maior teria ainda sido se houvesse nascido em França e pintado a Normandia, as planícies adustas da Crau, a encosta amena dos Alpes, na Côte d'Azur. Parreiras, não. Pintou com cores e com sentimento a paisagem brasileira, deixando bons quadros, como expressão exata e perfeita, da nossa terra e da nossa luz.

Mas voltemos ao salão deste ano, que tão boa impressão vai deixando.

Vejamos os expositores que se nos afigura mais fortes.

Seja o Sr. Minhard Jacoby [sic]. Este grande pintor apresenta trabalhos de rigorosa técnica e perfeição. O seu colorido continua a revelar a mesma clareza dos seus quadros já conhecidos. Perfeição de processos pictóricos absoluta coloca esse artista no primeiro plano dos nossos pintores de figura. O Sr. Meinhard Jacoby expõe quatro telas, todas muito felizes, culminando as suas qualidades na de n. 204. “Branco em branco”, retrato de senhorita.

Reportemo-nos, agora, aos envios do Sr. [Augusto Bracet]. São quatro quadros, predominando na qualidade e no número, o retrato. O Sr. Bracet apresenta com muita felicidade o Sr. Armando Braga, trabalhando no "atelier", dando impressão de movimento, naturalidade, à figura, tanto na cabeça, como nos detalhes, que a interessam.

O Sr. Bracet está se firmando um forte retratista, opinião que nos fornecem os seus envios e outros trabalhos recentes.

Paremos agora junto dos bonitos quadros, de técnica difícil, enviados pelo Sr. Annibal Mattos. São três marinhas e uma casa velha, todas tratadas com segurança, conhecimento de planos, jogo feliz de luzes. Esse artista é do grupo que mais aproveitamento revela, por isso que se distancia infinitamente dos seus envios anteriores.

Helios Selhinger [sic] traz ao salão o concurso de uma das suas interessantes composições. É um quadro de proporções regulares, intitulado “Pedro Malazarte”, onde se vê famoso personagem, tocando frauta [sic] rude, enquanto em roda a bicharada da fauna brasileira ouve-o contrita, na perspectiva de acontecimento, que só o observador não atenta. O quadro tem colorido, a feição pessoal do autor e não é possível escurecer, pelo envio, o merecimento do seu autor.

Vejamos, finalmente, um dos mais recentes premiados com a viagem à Europa. É o Sr. J. B. Paula Fonseca. Apresenta dois quadros, ambos muito seguros, com as qualidades de paisagista que vem revelando desde o curso, recebidas de Baptista da Costa. O Sr. Paula Fonseca acentua qualidades que se vão definindo em sua técnica, pintando com muita segurança. Dos dois quadros expostos o mais forte é “Mercado de Veneza”, onde há perspectiva, ciência exata dos planos, colorido bem combinado e, sobretudo, movimento nas figurinhas de mercadores que emprestam vida à tela.

É um belo e forte trabalho, com o qual julgamos oportuno encerrar as notas de hoje. - A. C.


Imagens

"Retrato", de Eyseu Visconti

"Mãe", de Pedro Bruno

"Armando Braga", de Augusto Bracet


Digitalização de Mirian Nogueira Seraphim

Transcrição de Vinícius Moraes de Aguiar

A. C. BELAS-ARTES. Ligeira impressão colhida ontem na XXXIII Exposição Geral. O Jornal, Rio de Janeiro, 14 ago. 1926, p. 3.

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